Um casarão centenário – que está em processo de tombamento pelo Condepacc (Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Campinas) – é o mais novo exemplo da crescente e contínua deterioração por que passa o centro de Campinas.
Localizado na Rua Sacramento, 259 – na esquina com a Marechal Deodoro – o casarão apresenta claros sinais de abandono.
Com grande parte da fachada pichada, a propriedade teve um dos portões de entrada arrombado. Uma porta lateral teve a fechadura rompida e não há qualquer obstáculo de acesso ao interior da casa. Há janelas com vidraças quebradas e calhas tomadas por cupins, com alto risco de se desprenderem do telhado.
Segundo relatos de vizinhos, que pediram para não serem identificados por temerem represálias, o casarão vem sendo saqueado com frequência nos últimos meses.
Vídeos gravados por eles, mostram que pessoas tentam retirar do imóvel, peças que tenham algum valor para reciclagem, como ferro, por exemplo, ou para outros fins.
Moradores de rua já ocupam o imóvel durante as noites e, de acordo com os testemunhos, é cada vez mais frequente o consumo de drogas no local.
“Tem um monte de moradores de rua que fica embaixo da marquise do prédio do lado do Casarão. Como o portãozinho do lado foi arrombado tem entrado muita gente e roubado tudo o que pode”, diz um vizinho, que pediu anonimato.
“Eles ficam brigando e falando alto até de madrugada. Nosso medo é que isso aqui acabe virando uma cracolândia”, acrescentou ele.
“Eles ficam embaixo da marquise e fazem muita sujeira e quando você passa está o maior fedor”, afirma outro morador.
“O casarão virou uma espécie de ponto de encontro de morador de rua e nóias (viciados em drogas). Depois das 10/11 da noite, eles se encontram ali pra fumar (crack/maconha)”, relata o fotojornalista, Rodrigo Vilalba, que também mora na vizinhança.
“Uns dias atrás, umas pessoas invadiram o casarão e tiraram quase tudo o que tinha de algum valor de lá de dentro: calhas, aquecedor, levaram uns tambores de aquecedor solar, essas coisas”, acrescenta.
Segundo ele, a degradação do Casarão é consequência da deterioração crescente de todo o Centro da cidade.
“A gente vê o tempo todo; pessoas remexendo lixeiras, ruas escuras, problemas de assaltos”, conta ele. “O Centro de Campinas se degradou de maneira absurda”, conclui.
GM
Procurada pela reportagem, a Guarda Municipal (GM) disse ter recebido apenas duas denúncias de “movimentação suspeita” no número 259 da Rua Sacramento nos últimos três meses.
A corporação informou que respondeu aos chamados e se deslocou para o local; que encontrou pessoas dormindo na rua e que elas foram orientadas a sair e se retiraram, sem resistência. Diz ainda que foi acionada para outras ocorrências desse tipo na Rua Sacramento, mas não no número 259. A GM, porém, não informou quantas queixas foram feitas.
Depois do pronunciamento da GM, os moradores foram novamente procurados pela reportagem do Hora Campinas e reafirmaram a existência de problemas frequentes no Casarão.
“Nós temos vídeos e fotos provando a invasão. Contra fatos não há argumentos”, disse um morador. Segundo ele, problemas deste tipo são diários na região.
A secretaria de Urbanismo informou em nota que, por se tratar de um imóvel particular, a responsabilidade pela manutenção é do proprietário. O órgão diz que sempre que é constatado o abandono, o setor de fiscalização da Prefeitura verifica e notifica o proprietário.
A secretaria diz que já constatou que o imóvel se encontra em condição “insalubre” e tentou notificar o proprietário. Só que ainda não conseguiu localizá-lo.
“No caso do imóvel da Rua Sacramento, nº 259, fiscal da Secretaria de Planejamento e Urbanismo (Seplurb) já esteve no local e constatou que a situação de enquadra em condição insalubre, segundo o Código de Obras do Município, passível de notificação para adequação e de multa, se não houver intervenção para resolver problema”, informou o órgão na nota.
“O proprietário foi procurado no endereço do cadastro do imóvel para entrega da notificação, mas houve a informação de que não reside no local. A fiscalização, agora, busca localizar o proprietário. Se não for localizado, será notificado por edital publicado no Diário Oficial do Município (DOM)”, finaliza a nota.
O tombamento
O processo de tombamento do casarão da Rua Sacramento começou há pouco tempo. Em dezembro do ano passado. E até por conta disso, a Prefeitura alega que sabe pouco sobre a construção.
Técnicos da secretaria de Cultura que vão se debruçar sobre o tombamento, estimam apenas que tenha sido construído entre os anos de 1920 e 1930.
Explicam que o imóvel entrou na lista dos que podem ser considerados patrimônio histórico – e por isso devem ser preservados – principalmente por estar no entorno do Solar do Barão de Itapura – um palacete em estilo renascentista italiano, de 227 cômodos, construído no século 19 e que pertence à PUC-Campinas.
O Solar foi tombado pelo órgão estadual de preservação – o Conselho de Defesa do Patrimôno Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo – em 1983. Cinco anos depois, foi tombado pelo órgão municipal – o Condepacc (Conselho de Defesa do Patrimônio Cultura de Campinas).
Restauro
Anunciado há quase seis anos, o restauro do Solar do Barão de Itapura ainda não saiu do papel. O projeto prevê a restauração das varandas, das janelas e portas-balcão e a recuperação de pinturas do século 19.
Mas, além disso, pretende também, transformar o espaço num centro cultural e comercial, com centro de convenção, hotel e salas comerciais.
Esta semana a assessoria de imprensa da PUC-Campinas informou que o projeto de restauro não foi iniciado e que não há data para início.
Veja fotos do projeto de restauro do Solar do Barão, retirados do site da PUC-Campinas
O Solar do Barão
O Solar foi construído por Joaquim Policarpo Aranha – um próspero cafeicultor e donos de várias fazendas, que era Comendador da Imperial Ordem da Rosa e Capitão da Guarda Nacional. Recebeu o título de Barão de Itapura, em 1883, dado por D. Pedro II.
A ideia é que o palacete servisse de residência para a família.
Em estilo renascentista italiano, era um arrojado projeto para a época já que os 227 cômodos foram construídos em alvenaria de tijolos, substituindo a taipa de pilão, técnica empregada nesse período. A obra foi realizada em três anos e inaugurada em 1883.
A partir de 1935, a família aluga o edifício para a Arquidiocese de Campinas. Em 1941, o prédio é transferido para a Sociedade Campineira de Educação e Instrução, até os dias de hoje mantenedora da PUC-Campinas.
A transferência oficial de propriedade aconteceu em 1952, quando o prédio foi vendido para a Arquidiocese.