Sempre tive uma conexão muito forte com a minha mãe. No dicionário, conexão diz respeito a ligação, união e vínculo. Éramos tudo isso e muito mais. Mas, além da conexão, tenho passagens nas quais a intuição também se fez presente em nossas vidas. Intuição, no dicionário, diz respeito a pressentir coisas, independentemente de raciocínio ou de análise.
Um desses momentos que chamo de intuição acabou nos presenteando com a presença dela por mais 10 anos em nossa vida. Foi numa sexta-feira, eu voltava do trabalho e estava disposta a visitar uma amiga antes de ir para casa. Quando parei na frente da casa dela, me veio um pensamento: “Preciso ir embora. Minha mãe precisa de mim”. Nem desci do carro e fui para casa. Logo que entre, ela infartou. Se eu não tivesse chegado a tempo, talvez ela não tivesse sobrevivido. Lembro também que além de estar vivendo esse drama pessoal estavam ocorrendo outras tragédias naquela semana de setembro de 2001, como o assassinato de Toninho, prefeito de Campinas, e o ataque às Torres Gêmeas nos Estados Unidos.
Já passei por outros momentos em que a intuição me fez recalcular a rota. Outro fato ocorrido também com a minha mãe foi um dia que saí atrasada para trabalhar, e, no ponto de ônibus, senti novamente que minha mãe estava precisando de mim. Ao chegar no portão, escutei os gritos dela. Ela estava no telefone com um golpista que insistia que eu havia sido sequestrada no ponto de ônibus e estava toda machucada.
Mas nem sempre a intuição chegou em um momento ruim. Num tempo que nem havia celular, cheguei em casa e, como não tinha ninguém, resolvi ir ao cinema assistir a Ghost, do outro lado da vida. Atrasada, entrei com o cinema já escuro, e, ao me sentar, comecei a ouvir as risadas da minha mãe e minha irmã com as cenas que traziam a atriz Whoopi Goldberd não sabendo lidar com a presença de um espírito em sua vida. Talvez aqui eu incluiria a palavra serendipidade, quando coincidências felizes promovem bons encontros. O ano era 1990, e não tínhamos nem celular e muito menos WhatsApp.
Lembrei de tudo isso por aqui só para falar de uma orquídea que é muito especial para mim e está aberta no meu pequeno quintal há mais de um mês. Como após a cirurgia cardíaca, ocorrida em 2001, minha mãe teve um AVC e ficou com todo lado esquerdo comprometido ela parou de costurar, que era algo que amava, e para alegrar seus dias começou a ser presenteada com muitas orquídeas, das quais cuidava com bastante carinho. E tem uma delas que sinto que é fruto da nossa conexão, que não usa Wi-Fi.
No dia seguinte ao da sua partida, olhei para o muro da sua casa e uma das suas flores preferidas havia achado uma brecha e se destacava pelo tom lilás em meio às heras verdes que a cercavam. Naquele momento, ao me deparar com a beleza daquela flor, tive a certeza de que a morte não separa nunca conexões do amor. Trouxe a planta para minha casa e todos os anos, próximo ao dia 10 de fevereiro, a orquídea me manda um recado sobre os laços de amor que nos unem.
Quando criança assisti a um filme muito mais antigo que eu, se chamava O Pássaro Azul. Nele, as crianças ao visitar o cemitério reviam os bons momentos vividos com seus avós. Penso que essa orquídea traz isso, pois me lembra que enquanto eu e a orquídea vivermos por aqui estaremos conectadas ao amor da minha mãe.
E você já sentiu a conexão ou intuição bater à sua porta? Talvez nunca terei respostas exatas para isso, mas gosto de saber que elas fazem parte da minha história.
Kátia Camargo é jornalista e por aqui se sente à vontade para contar histórias que guarda no coração.
Lembrou de uma linda canção de Marisa Monte para ilustrar este texto: