Desamparados diante da falta de uma política nacional de combate à pandemia da Covid-19, prefeitos se viram obrigados a abrir novos caminhos em busca da vacina – única ferramenta existente hoje, segundo eles, capaz de conter a disseminação do vírus e garantir a retomada segura da atividade econômica.
Liderados pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP) – nada menos que 2,5 mil municípios de todas as regiões do País se uniram em um consórcio público para viabilizar a compra de imunizantes, de forma independente do Ministério da Saúde.
A medida foi uma reação à inanição do governo federal que, primeiro, resistiu à ideia da vacina; depois demorou para celebrar contratos de compra junto aos laboratórios e fabricantes.
O ex-prefeito de Campinas, Jonas Donizette, que é presidente da FNP, lembrou ao Hora Campinas que a aquisição de vacinas, medicamentos e insumos como agulhas e seringas, é responsabilidade do governo federal, mas diante dos inúmeros problemas para a formulação de um programa nacional, os prefeitos decidiram agir.
A Frente criou o consórcio; montou um organismo jurídico e passou a prospectar fornecedores.
“Nossa ideia foi a de facilitar as negociações, porque este governo tinha problemas. Nós conseguimos desempenhar um papel diplomático”, contou Jonas.
Instalado formalmente no final de março, o Consórcio foi chamado de Conectar (Consórcio Nacional de Vacinas das Cidades Brasileiras). Os recursos para compra de vacinas poderão ser disponibilizados de três formas: por meio dos municípios consorciados, de aporte de recursos federais e de eventuais doações nacionais e internacionais, como fundações, instituições ou empresas.
“Se o recurso for federal, internacional e de doação, vamos distribuir com equidade por número de habitantes de cada município, isso se não for recurso do caixa da prefeitura. Se for, o município vai receber o correspondente ao que pagou, de acordo com o recurso que colocou no consórcio”, explicou Jonas Donizette.
Organismos
Além disso, o consórcio recorreu a organismos internacionais como a Organização Pan-Americana da Saúde e o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento). Assim, conseguiu abrir canais de negociações com governos.
Jonas conta que a FNP está em contato com os governos dos EUA e Canadá para que eles façam uma espécie de empréstimo de 30 milhões de doses da AstraZeneca de que já dispõem. Futuramente, essas doses serão repostas pelo governo brasileiro. “Na verdade, eles compraram bem mais vacina do que precisam”, disse Jonas.
O presidente da Frente lembrou a incapacidade do governo federal em colocar um plano nacional de imunização de pé.
“O então ministro (Eduardo) Pazuello até chegou a montar um calendário (de vacinação), mas que sofreu seguidas mudanças, desde o início. Além disso, a previsão de aquisição de doses foi sendo reduzida ao longo do tempo”, argumentou Jonas.
Novo ministro
Jonas Donizette vê com grandes reservas a indicação do médico cardiologista Marcelo Queiroga para o lugar de Eduardo Pazuello. “Pelo que pudemos ver até agora, vai ser tutelado pelo presidente Bolsonaro”, disse Jonas. “Se for assim, a única mudança em relação ao anterior, é que este é do ramo (medicina). Nada além disso”, acrescentou.
Jonas diz que o fato de o governo ter anunciado a compra de 138 milhões de doses junto à Pfizer e à Jansen não altera em nada os planos do consórcio. “Para nós vai ser ótimo. Teremos mais vacinas à disposição da população”, afirmou.
Segundo Jonas Donizette, existem ao menos 10 marcas de vacinas prestes a serem colocadas no mercado e que poderão ser compradas.
Na última sexta-feira (26), a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) mandou um duro recado ao presidente Jair Bolsonaro, lembrando que grande parte das dificuldades que o Brasil vem tendo hoje para conseguir fechar contratos para a aquisição de vacinas, é decorrente da má condução da política externa.
Em nota oficial, a FNP afirma que o cenário de enfrentamento à pandemia de Covid-19 tomou contornos catastróficos no País. Segundo a entidade, “o Ministro das Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, já apresentou um leque diverso de trapalhadas e atitudes destrutivas”.
Na nota, a Frente diz que esse contexto causa apreensão e preocupação e “clama para que o governo federal assuma sua responsabilidade; substitua o Ministro e reverta a política externa desastrosa que vem adotando.”
Outras medidas
A Frente Nacional voltou a recomendar aos prefeitos que, além de adotarem regras severas de restrição, avaliem a decretação de lockdown nas cidades. A entidade afirma, também em nota oficial, que declarações do presidente Jair Bolsonaro contra as restrições, “evidenciam a ineficaz coordenação nacional no enfrentamento à pandemia e ratificam a desconexão com a realidade, falta de compromisso com a Constituição Federal e com a vida”.
Diante da escassez de vacinas, a concorrência com a velocidade da propagação do vírus só pode ser feita com medidas que impõem o isolamento social, finaliza a nota.