As crianças não sabem, até brincam, mas por desconhecerem o futuro que as espera.
Os jovens não sonham , nem se resignam. Hoje inocentes, amanhã podem se tornar assassinos ao matar um soldado inimigo.
Os velhos mostram pelo olhar as marcas de um passado que já se foi e um futuro que não virá.
O desconforto de viver um tempo que é pior do que sua juventude. Sempre aquelas memórias doces, mas de um passado não tão adoçado assim. Desolação.
Os tempos da esperança foram arrancados com força do imaginário coletivo. Substituídos por ausência de perspectivas, por incógnitas e desalento. Nada pode trazer de volta o tempo que passou.
A vó e a neta são separadas não por anos ou décadas, mas por séculos. Uma não reconhece a outra.
Era isso o que eu, o autor deste texto, vivenciava em uma das inúmeras viagens de trem na Rússia neste ano (2023) de guerra. Vi um povo marcado pela desesperança do futuro. Dias inglórios, sem a luz do sol, nem o reflexo das estrelas. Dias que pareciam noite, marcados pelo eclipse dos sonhos.
No mesmo ano uma outra guerra assolava o planeta, e uma jovem escritora palestina de 32 anos escrevia sob os bombardeios: “A noite da cidade é escura, exceto pelo brilho dos mísseis, silenciosa, exceto pelo som dos bombardeios, assustadora, exceto pela garantia das súplicas, negra, exceto pela luz dos mártires”. Dias depois a autora do romance “Oxygen is not for the dead” (Oxigênio não é para os mortos) morreu após um ataque de mísseis em sua cidade, Khan Yunis, na Faixa de Gaza.
Na Síria, no Iêmen, no Haiti, em Myanmar, em Burkina Faso, Somália, Sudão, Mali, Nigéria, os gritos de desespero são sufocados pelo som das metralhadoras.
Guerras que só trazem morte e desolação, que interrompem planos, desejos e os mais inocentes sonhos.
Lutas desiguais, injustas, cretinas que trazem à tona o mais brutal pensamento humano.
Explodem bombas, descarregam-se metralhadoras, recém-nascidos morrem nas incubadoras por falta de eletricidade.
É esse o mundo com o qual concordamos?
Gustavo Gumiero é sociólogo e escritor – @gustavogumiero – gustavogumiero.com.br