Por Kátia Camargo, Especial para o Hora Campinas
O Teatro Oficina do Estudante recebeu pais, educadores, gestores, adolescentes e jovens para uma conversa inspiradora idealizada pela Fundação Educar, durante a 18ª edição do Educação e Protagonismo, ocorrida na última quarta-feira (14), com o tema Violência nas escolas: caminhos possíveis para futuros mais saudáveis e seguros.
O assunto se tornou ainda mais evidente e, extremamente preocupante, desde fevereiro do ano passado, quando começou uma série de ataques em escolas de todo o Brasil.
O evento trouxe para a conversa duas pesquisadoras – Telma Vinha e Juliana Hampshire – que são referências no assunto.
Telma Vinha é doutora em educação e professora da faculdade de educação da Unicamp, além de coordenadora do grupo de estudos “Ética, Diversidade e Democracia na Escola Pública”, do Instituto de Estudos Avançados da Unicamp. Vinha é também coordenadora associada do “Grupo de Estudos e Pesquisa em Educação Moral”, o GEPEM, da Unesp/Unicamp.
Juliana Hampshire, psicóloga, é mestre em teoria psicanalítica pelo programa de pós-graduação em teoria psicanalítica da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ e especialista em clínica psicanalítica pelo IPUB/UFRJ.
A jornalista Carolina Rodrigues, mediadora da conversa, destacou a responsabilidade da imprensa em como divulgar esse tipo de informação para a população, considerando que, às vezes, esse é o propósito dos executores dos ataques.
Na abertura do evento, Isabela Pascoal Becker, diretora executiva da Fundação Educar, destacou que o objetivo do encontro é buscar entender o que pode motivar os ataques nas escolas e possíveis caminhos para que isso não ocorra.
“Sabemos que não existe uma única resposta para isso, mas esse evento é um convite para encontrarmos a nossa responsabilidade enquanto pais, educadores, gestores e como agir diante disso. Não é um problema só da escola, não é um programa só do aluno. É um problema de todos nós e de toda a sociedade”, disse Isabela.
Explosão de ataques nas escolas a partir de 2022
Em sua fala Telma trouxe dados, estudos recentes e destacou que, se antes os ataques planejados eram isolados, hoje se tornaram um fenômeno. “O Brasil tem 180 mil escolas. O primeiro ataque no Brasil ocorreu na Bahia, em 2002 e, até maio de 2023, foram totalizados 30 ataques cometidos por estudantes e ex-estudantes com 36 vítimas fatais. A partir de 2022 ocorreu uma explosão desses ataques, sendo 18 entre fevereiro de 2022 e maio de 2023. Isso deixa bem claro que precisamos acender o sinal de alerta, pois pode ocorrer de novo, a qualquer momento, só não sabemos onde e nem como”, explicou.
A especialista destacou que o tema é muito complexo. Mas apontou algumas características dos jovens que cometeram parte desses crimes, de um modo geral e mais recentemente, eles têm acesso a algumas plataformas da internet em que são estimulados a cultivar o ódio e ensinados sobre como agir para praticar esses ataques.
“Se antes tinha que entrar em deep web para ter acesso, hoje é muito mais fácil, está no Twitter, WhatsApp, TikTok, Discord”, pontuou.
Telma destacou ainda que esses jovens podem ser cooptados em jogos on-line a fazerem parte das chamadas TCC, que significa true crime communities (comunidades de crime real), subculturas on-line, com células fascistas.
Ela também trouxe a questão da flexibilização das armas, que favorece muito a letalidade. E disse que as plataformas da internet precisam ser responsabilizadas, e ainda reconheceu que o caminho não é simples e que não adianta só pedir para os familiares acompanharem o filho na internet.
Por fim, Telma disse acreditar que deve existir um conjunto de ações possíveis a serem feitas. Para ela a escola precisa se fortalecer para ensinar cada vez mais tudo que humaniza.
“É preciso melhorar a qualidade da convivência na escola e criar espaço de escuta e diálogo, fatores fundamentais. Além disso, é preciso criar políticas públicas na área de convivência democrática e cidadã, pois a escola precisa ser um espaço de cuidado, proteção e fortalecimento de valores democráticos”.
A escola é lugar de encontro com o outro
A psicóloga Juliana Hampshire destacou que a pandemia também tirou das crianças e jovens a questão da convivência por um longo período. “A escola é o lugar da infância e adolescência onde os encontros acontecem. É nesse espaço que aprendemos a conviver com pessoas que vão além da nossa família e dos vizinhos mais próximos. A escola ajuda a transmitir os valores humanos e é um microcosmo da nossa sociedade”.
“Precisamos entender que na escola é possível falar de qualquer assunto. Criar espaços para ter projetos de empatia, bullying e diversidade. Precisa existir espaços de escoamento de lugares de não pertencimento e exclusão. Isso tem que começar desde a infância”, continuou Juliana.
A integração entre família e escola é muito importante também. Em casa, por exemplo, ela apontou que até em hábitos simples, como fazer as refeições juntos, estão se perdendo.
“É importante resgatar esse hábito na família”, ponderou. “Penso que esses valores só podem ser transmitidos por meio do re-encantamento com a vida, com a própria narrativa e com experiência de mundo. A escola é esse lugar de fazer vínculo e ligação com o outro, e de poder impulsionar a pessoa para a vida”, finalizou.
Quem quiser conferir tudo que foi dito no evento basta acessar: