A bilionária licitação do transporte coletivo em Campinas, que vive processo conturbado e judicializado, teve mais um capítulo na manhã desta quarta-feira (20). Aguardada desde 2016, a licitação poderia finalmente ter um desfecho, acabando com a “novela”. A Prefeitura realizou no Salão Azul, quarto andar do Paço Municipal, a sessão pública de abertura dos envelopes do processo. O evento teve transmissão ao vivo pelo YouTube . Porém, nenhum empresário, representante ou consórcio apresentou proposta.
Os responsáveis pela licitação estranharam o fato de nenhuma proposta ter sido feita. O Hora Campinas apurou junto a fontes do primeiro e segundo escalões do governo Dário Saadi (Repub) que o entendimento é que houve “boicote” das empresas. Estaria em jogo uma queda de braço com a Administração por divergências de pontos do edital.
Os representantes dos atuais concessionários do transporte público não se manifestaram. O Hora Campinas procurou o sindicato e a associação que representam o setor, mas não houve posicionamento.
Outro lado
O Hora conversou, sob condição de anonimato, com um empresário com décadas de atuação na prestação de serviço do transporte coletivo campineiro. Ele afirmou que, da forma que está a licitação, ela é “impagável”, ou seja, a remuneração indicada pela Prefeitura não cobriria os gastos dos investidores, segundo a sua análise.
“Quem sabe fazer conta, sabe que esse modelo é impagável. Não dá para entrar numa aventura”, definiu. “O valor do capital social exigido é altíssimo. Seria um contrato de 15 anos, dos quais 11 anos você teria que investir”, acrescentou.
“Teríamos que começar a ter lucro somente no 12º ano de contrato, se tudo der certo. Ninguém seria louco de botar milhões. A conta não fecha. Por isso que ninguém se interessou”, afirmou a fonte.
A licitação
A licitação tem valor de R$ 8,2 bilhões, com prazo de concessão para um período de 15 anos, prorrogável por mais cinco. A operação será dividida em dois lotes: Lote 1 (Regiões Norte, Oeste, Noroeste) e Lote 2 (Regiões Leste, Sul, Sudoeste). Cada lote tem três áreas operacionais.
A licitação também abrange a operação e manutenção do BRT (Bus Rapid Transit – Ônibus de Trânsito Rápido), com previsão de uma frota mais moderna.
Ao longo da concessão, segundo o edital, todos os veículos terão ar-condicionado, Wi-fi, tomadas USB, GPS e terminal de computador de bordo.
O novo edital da licitação do transporte coletivo, com os anexos, foi publicado no último dia 14 de julho, com todas as sugestões apontadas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE/SP). As alterações foram feitas por uma comissão formada por membros da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec) e das secretarias de Transportes, Administração e Justiça, com o apoio da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE).
“Licitação deserta”
Apesar da presença de vários representantes do setor, nenhuma proposta foi apresentada. Por conta disso, a licitação foi declarada “deserta”. O edital de licitação foi alvo de 20 ações na Justiça, questionamentos no Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE-SP) e na própria Prefeitura. O objetivo era suspender o processo licitatório.
Segundo a Prefeitura de Campinas, “todos foram respondidos e elucidados”. Em nota enviada à imprensa, o governo Dário diz que “na última semana, foram várias tentativas de suspensão do certame”. Todas também foram negadas pela Justiça.
A sessão pública desta quarta foi conduzida pelo presidente da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec), Vinicius Riverete. Ele coordenou os trabalhos ao lado de outros representantes da comissão licitatória. O secretário municipal de Transportes é Fernando de Caires Barbosa.
Diante da falta de propostas, a Administração avalia quais serão os próximos passos a serem tomados. O governo Dário afirma “seguir firme no objetivo de licitar a concessão da operação do sistema de transporte público de Campinas”. E conclui que a “intenção é modernizar o sistema e atender a população com mais qualidade e dignidade”.
Longa história
A licitação do transporte público coletivo de Campinas é aguardada desde 2016. A penúltima tentativa de encaminhar o processo ocorreu em 20 de dezembro do ano passado, quando foi lançado o edital de abertura do processo. Em maio deste ano, porém, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) suspendeu o processo licitatório, após 50 questionamentos de empresas interessadas no certame.
Novo edital
O novo edital da licitação do transporte coletivo, com os anexos, foi publicado no último dia 14 de julho, com todas as sugestões apontadas pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCE/SP).
As alterações foram feitas por uma comissão formada por membros da Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec) e das secretarias de Transportes, Administração e Justiça, com o apoio da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE).
Entre elas ocorreram a atualização do valor da concessão, que passou de R$ 7,6 bilhões para R$ 8,2 bilhões; e a atualização da base de dados, de novembro de 2022 para maio de 2023, envolvendo investimentos e insumos.
Também foi solicitada uma nova tecnologia de veículos movidos a diesel, de Euro V para Euro VI, que são menos poluentes. Ocorreu um detalhamento dos custos de operação e manutenção do BRT e, também, detalhamento da composição dos custos da garagem.
O Serviço Seletivo de transporte foi retirado da licitação. As garantias contratuais passaram de 10% para 5% do valor do investimento, seguindo a determinação do TCE/SP.
Sistema
Atualmente, o sistema de transporte coletivo de Campinas possui 216 linhas, incluindo o serviço “Corujão”, e 896 ônibus em operação. No mês de agosto de 2023 foram transportados em torno de 444 mil passageiros por dia útil.