“Hoodoo Gurus completa invasão australiana”. Há quase 30 anos, a manchete da capa do caderno de Cultura do Estadão, em sua edição do dia 14 de julho de 1995, uma sexta-feira, destacava a onda que “invadia a nossa praia”, parafraseando a famosa canção do Ultraje a Rigor, ao anunciar a chegada de mais uma banda que atravessava o mundo para “descobrir” o Brasil. Era a vez do Hoodoo Gurus.
Formado no início dos anos 80, na mesma esteira de outros grupos australianos de sucesso, como Men At Work e Midnight Oil, só para citar alguns, o Hoodoo Gurus estava longe de ser um novato do circuito naqueles idos dos anos 90. Afinal, a banda já tinha quase 15 anos de estrada, com seis álbuns de estúdio lançados, além de alta rodagem pelos Estados Unidos e pela Europa. Mas ainda faltava deixar a marca nos palcos brasileiros.
“Entre o final dos anos 80 e início dos 90, fizemos muitos shows nos Estados Unidos e, com frequência, encontrávamos fãs brasileiros que sempre nos diziam que devíamos ir ao Brasil porque todo mundo nos amava lá. Levamos alguns anos para que isso acontecesse, mas quando finalmente chegamos, ficamos maravilhados ao ver milhares de pessoas cantando nossas músicas aonde quer que tocássemos”, relembrou o vocalista do Hoodoo Gurus, Dave Faulkner, em entrevista exclusiva concedida ao Hora Campinas.
“Adoramos tudo sobre o Brasil: as belas paisagens, a boa comida e as pessoas incrivelmente amigáveis. Mal podemos esperar para experimentar tudo isso novamente”, anseia Dave Faulkner, sobre o retorno do Hoodoo Gurus aos palcos brasileiros após 26 anos.
Durante o mês de julho de 1995, o Hoodoo Gurus percorreu o Brasil pela primeira vez numa turnê que passou por São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba, Florianópolis e Porto Alegre, entre outras cidades. Apenas dois anos depois, quase sem dar tempo de deixar saudades, a banda retornou ao país para mais uma série de shows em março de 1997, antes de uma pausa de seis anos nos trabalhos, retomados somente em 2003.
Aquela excursão do Hoodoo Gurus pelo Brasil era apenas parte das atrações do projeto “Australian Connection”, idealizado pelo empresário brasileiro Ricardo Chantilly, figura conhecida da comunidade do surfe e entusiasta do rock australiano, responsável por trazer várias bandas da terra dos cangurus para território tupiniquim.
Naquela época, para se ter uma ideia, até mesmo a região de Campinas chegou a ser invadida pelos “cangurus”, quando os australianos do Men At Work tocaram na então recém-inaugurada casa de shows Adler, em Vinhedo, em setembro de 1997. Um ano antes, a banda havia voltado à ativa após hiato de uma década para colocar em pé a sua primeira turnê pelo Brasil, em 1996.
Ao todo, durante os anos 90, pelo menos uma dúzia de grupos australianos aportaram no Brasil, desde os mais expressivos e conhecidos pela maioria, como INXS, Midnight Oil e Men At Work, sem falar, é claro, do AC/DC, que habita o olimpo do rock, até os mais alternativos, com público mais restrito, como Spy vs Spy e Gang Gajang, além do próprio Hoodoo Gurus, cujos sons receberam o rótulo de “surf music”.
Agora, depois de 26 anos de espera, celebrando quatro décadas de história, o Hoodoo Gurus enfim retorna ao Brasil para tirar o atraso, novamente pelas mãos do empresário Ricardo Chantilly. “O Hoodoo Gurus tem um carinho especial pelo Brasil e, desde o ano passado, quando lançou o seu décimo álbum, começamos a pensar na possibilidade de voltar ao país”, explica o executivo.
Com shows programados em cinco capitais, a terceira turnê brasileira da história do Hoodoo Gurus, a primeira deste século, começa oficialmente nesta próxima quarta-feira (12), data da primeira apresentação da banda, no espaço Vibra São Paulo, na capital paulista. Depois disso, praticamente em sequência, o grupo australiano toca no dia 13 (quinta-feira), em Porto Alegre, no dia 14 (sexta-feira), no Rio de Janeiro, no dia 15 (sábado), em Curitiba, e no dia 19 (quarta-feira), em Florianópolis, antes de partir para os Estados Unidos para cumprir agenda cheia. Desde que retomou as atividades depois do período de isolamento devido à pandemia de Covid-19, esta é a primeira vez que o Hoodoo Gurus viaja para tocar fora da Oceania.
“Austrália e Brasil são países bem parecidos em termos de hospitalidade, clima agradável na maior parte do ano, belas paisagens naturais (natureza, em geral, e muitas praias lindas) e interesse por esportes, principalmente surfe”, comparou Dave Faulkner, vocalista do Hoodoo Gurus, em entrevista exclusiva ao Hora Campinas.
Uma novidade para a nova temporada brasileira dos roqueiros australianos do Hoodoo Gurus é a ação “Surfista Solidário”, que concede 50% de desconto no ato da compra do ingresso (somente meia-entrada) para quem doar qualquer acessório de surfe. “Pode ser um estrepe (ou cordinha), uma roupa que não sirva mais ou até uma prancha. Queremos presentear os surfistas e fãs do Hoodoo Gurus com a oportunidade de estarem novamente com seus ídolos”, explica Ricardo Chantilly, sobre a iniciativa em parceria com a Confederação Brasileira de Surf (CBSurf), dirigida por Teco Padaratz, referência no surfe brasileiro. Os equipamentos arrecadados serão entregues à Associação de Surfe da Grande São Paulo e à Rocinha Surfe Escola.
Quem marcar presença nas apresentações do Hoodoo Gurus também poderá sentir a emoção de surfar as ondas gigantes de Nazaré, em Portugal, cujas imagens serão exibidas nos telões antes da banda subir ao palco. “Eventos de música costumam trazer boas memórias e a ideia é que o público vivencie mais este espetáculo em uma experiência única e ao seu alcance”, ressalta Ricardo Chantilly.
Os ingressos para os shows do Hoodoo Gurus no Brasil ainda estão à venda e podem ser adquiridos através deste link ou então pelos sites de cada local onde serão realizadas as apresentações: Vibra São Paulo (São Paulo), Auditório Araújo Vianna (Porto Alegre), Qualistage (Rio de Janeiro), White Hall Jockey Eventos (Curitiba) e John Bull Floripa (Florianópolis).
Sobre o novo álbum
Grandes hits do passado como “What’s My Scene”, “1000 Miles Away”, “Come Anytime” e “Bittersweet” estarão presentes nos setlists dos shows do Hoodoo Gurus em solo brasileiro, junto ao repertório do décimo e mais recente disco “Chariot of the Gods”, lançado em março do ano passado, com 14 faixas inéditas, após um longo período de 12 anos sem nenhum álbum de estúdio gravado. Produzido para streaming, “Chariot of the Gods” também ganhou uma versão em vinil, com três faixas adicionais – a edição deluxe em vinil duplo contempla 17 canções.
“Todas as canções de ‘Chariot of the Gods’ são completamente novas, exceto ‘Settle Down’, que escrevi na época de ‘Mach Schau’ [álbum de 2004]. Muitas surgiram de riffs ou melodias que acumulei ao longo de vários anos, às vezes décadas. Ideias musicais aleatórias surgem em minha cabeça em momentos estranhos durante o dia, como quando estou fazendo minha caminhada matinal ou indo às compras. Costumo gravar no meu celular para não esquecer e, quando finalmente decido colocar mãos à obra para fazer um álbum, volto àqueles pequenos esboços e escrevo canções completas”, descreve Dave Faulkner, sobre o seu processo de composição.
“Algumas músicas podem ter sido criadas pela metade e gestadas por anos, enquanto outras vieram muito rapidamente. Por exemplo, pensei no riff de guitarra principal de ‘Answered Prayers’ quando voltava do ensaio para casa. Imediatamente parei o carro no acostamento e cantei a melodia no meu celular. No ensaio do dia seguinte, começamos a desenvolver o arranjo rítmico e, na outra manhã, as letras surgiram em uma explosão criativa. Essa música saiu tão rápido que quase me senti como um espectador no processo”, relatou o frontman do Hoodoo Gurus.
“Os últimos anos foram frustrantes e estressantes para todos, mas para o Hoodoo Gurus, essa nuvem escura teve um forro de prata. Forçado a confiar em nós mesmos em vez do mundo exterior para validação, houve um renascimento criativo dentro da banda que resultou em uma série de singles e um novo álbum. O mais importante de tudo é que os laços musicais entre nós quatro nunca foram tão fortes. Quando as discussões são todas sobre quais músicas estamos tristes por ter que deixar de fora do disco, isso é um ótimo sinal”, concluiu Dave Faulkner.
Esta é uma nova fase da história do Hoodoo Gurus, marcada pela entrada do baterista Nik Reith, substituindo Mark Kingsmill, que estava na banda desde o segundo disco, “Mars Needs Guitars” (1985), mas resolveu aposentar as baquetas. Os outros integrantes, além do vocalista Dave Faulkner, membro original e fundador do grupo, são o guitarrista Brad Shepherd, presente desde o álbum de estreia, “Stoneage Romeos” (1984), e o baixista Richard Grossman, que entrou na época do quarto disco, “Magnum Cum Louder” (1989), o primeiro com o quarteto clássico. Depois disso, vieram “Kinky” (1991), “Crank (1994), “Blue Cave” (1996), “Mach Schau” (2004) e “Purity of Essence” (2010), todos com a formação mais tradicional.
De cinema, os Gurus também entendem
Na mesma entrevista exclusiva concedida ao Hora Campinas, o vocalista do Hoodoo Gurus também comentou sobre a sua relação com o cinema, paixão em comum entre os integrantes da banda, além, é claro, da música. “Todos nós do Hoodoo Gurus somos cinéfilos. Quando Rick Grossman [baixista] fez a audição para se juntar ao grupo, um dos maiores testes que ele teve que passar foi nos dizer seu filme favorito. Quando respondeu que era a obra-prima de Stanley Kubrick, ‘Dr. Fantástico’ [1964], soubemos imediatamente que era a pessoa certa”, revela Dave Faulkner.
Na primeira metade dos anos 90, o líder do Hoodoo Gurus compôs trilhas sonoras para dois filmes australianos, entre eles “Um Caso de Amor” (1994), estrelado pelo astro neozelandês Russell Crowe, ainda em início de carreira. Logo na sequência, Russell Crowe protagonizou o faroeste “Rápida e Mortal” (1995), sua porta de entrada em Hollywood, contracenando ao lado de grandes nomes do cinema americano como a musa Sharon Stone, o ainda jovem Leonardo DiCaprio e o já veterano Gene Hackman, este último homenageado pelo Hoodoo Gurus com uma canção que leva o seu nome, presente na coletânea “Electric Chair” (1997).
“Sou um grande fã de trilhas sonoras, então fiquei muito empolgado por ter a chance de fazer a trilha sonora de ‘Um Caso de Amor’, um dos primeiros longas-metragens de Russell Crowe. Infelizmente, tive que sair em turnê enquanto a música estava sendo gravada, então alguns dos arranjos não saíram como eu imaginava e, no geral, aquela trilha sonora em particular não foi muito boa. Antes, eu já havia feito a trilha sonora de outro longa-metragem australiano, chamado ‘Broken Highway’ [1993], e a música desse ficou muito melhor. O problema é que o filme em si não foi um sucesso e está quase esquecido agora, então ninguém conhece a música que escrevi”, lamenta Dave.
“Sempre amei cinema, inclusive cheguei a fazer um curso de curta-metragem na época de escola. Costumava usar a câmera Super-8 de minha família para produzir filmes caseiros com meus amigos”, relembra Dave Faulkner, sobre o início de sua paixão pela sétima arte durante os tempos de juventude.
Nascido no dia 2 de outubro de 1957, atualmente com 65 anos de idade, Dave Faulkner é natural de Perth, uma cidade metropolitana isolada na costa oeste da Austrália, mesma terra natal do lendário ator Heath Ledger, apenas um dentre vários astros e estrelas que o cinema australiano produziu ao longo do tempo.
Conterrâneo do vocalista do Hoodoo Gurus, Heath Ledger notabilizou-se principalmente pela sua brilhante interpretação do personagem Coringa no filme “Batman: O Cavaleiro das Trevas” (2008), trabalho que lhe rendeu o Oscar póstumo de melhor ator coadjuvante, um ano após a sua trágica e precoce morte, aos 28 anos, vítima de uma overdose acidental, no dia 22 de janeiro de 2008.
Além de Heath Ledger, a Austrália também é berço de outras importantes figuras de diferentes gerações da indústria do cinema, como os atores Geoffrey Rush, Hugh Jackman e Chris Hemsworth, as atrizes Cate Blanchett, Nicole Kidman e Margot Robbie, além dos diretores George Miller, Peter Weir e Baz Luhrmann. E a extensa lista não para por aí. Parece até que estamos falando da riqueza do rock australiano.
Confira abaixo a agenda completa de shows do Hoodoo Gurus no Brasil, em abril de 2023:
12/04 (quarta-feira): Vibra São Paulo – São Paulo (SP).
13/04 (quinta-feira): Auditório Araújo Vianna – Porto Alegre (RS).
14/04 (sexta-feira): Qualistage – Rio de Janeiro (RJ).
15/04 (sábado): White Hall Jockey Eventos – Curitiba (PR).
19/04 (quarta-feira): John Bull Floripa – Florianópolis (SC).