O Brasil ainda não tinha sido campeão do mundo quando conheci o Mercadão. Meu avô Guilherme me levou para passear e entrou no mercado para comprar um saco de coco e outro de amendoim cru. E voltamos para casa de carroça. Meu avô tinha construído um forno de barro no quintal e para não ficar bestando, resolveu fazer amendoim torrado, paçoca e cocada – que vendia pelas ruas do Taquaral e Cambuí. Às tardes, eu sempre estava por perto para o que der e vier. E ele sempre me pedia para pegar um meio saco de amendoim no ranchinho. Eu abraçava o saco e ele agradecia com um carinho na minha cabeça.
E hoje bem sei que ele estava me ensinando a abraçar os bons prazeres da vida.
E foi no Mercadão que provei a minha primeira cachaça, no Bar do Pachola. Eu já estava crescido e trabalhava como aprendiz de relojoeiro na Relojoaria Palácio, do saudoso José Calvi, meu primeiro patrão. E o meu mestre relojoeiro era o também saudoso Pedro Gallo. Ele queria fazer umas compras no Mercadão e me pediu para acompanhá-lo e ajudar a carregar as frutas, legumes e outras iguarias. E parou no Pachola.
Até então eu conhecia os aromas do lugar, mas não o sabor.
Quase trinta e cinco anos depois, levei o músico Paulo Moura para comer um picadinho no Bar do Pachola. E ele virou freguês. Na ocasião, Paulo Moura estava ensaiando com a Orquestra Sinfônica de Campinas e por quase um mês esteve hospedado em casa. Certa feita, depois de saborear o picadinho e degustar várias cachaças, Paulo Moura pediu a conta e o Pachola disse que no bar dele Deus não pagava nada. E, ao invés de assinar o cheque, apenas pediu que ele assinasse na parede do boteco.
Pachola foi embora e o seu sobrinho Wilson tocou o lugar com muita competência, mas o bar acabou sendo vendido para quem não conhecia o ramo.
Quando entro no Mercadão evito passar em frente onde existia o Bar do Pachola. Apenas ando pelos corredores atrás de velhos aromas, queijos, histórias e ervas. Mas mesmo assim não resisto em dar uma espiadinha para ver o velho Pachola com o seu encardido avental de fantásticas histórias de picadinho, amizade e paixão.
Bom dia.
Zeza Amaral é jornalista, escritor e músico