Quase dois séculos após o Grito do Ipiranga e quase doze décadas depois da Proclamação da República, o Brasil continua enfrentando desafios na construção de uma nação madura e justa, uma “mãe gentil” para todos os seus filhos. Em nossa vida política, por exemplo, ainda estamos distantes de uma democracia autêntica, plena e participativa, sem a qual os sistemas econômico, social e cultural não podem se desenvolver satisfatoriamente para atender com equidade às necessidades da população.
Os sintomas da imaturidade do nosso sistema político são evidentes, destacando-se quatro grandes crises: a crise ética, a crise das instituições do Estado, a crise do sistema eleitoral e a crise da cultura política em geral, todas interligadas e interdependentes.
Para superarmos essas crises, precisamos de uma grande mobilização da vontade nacional. Quem olha apenas a superfície do cenário político brasileiro pode achar que essa mobilização é impossível ou, pelo menos, altamente improvável. Contudo, nas correntes profundas da alma nacional, acumula-se uma força capaz de realizá-la.
Os observadores que percebem apenas a superfície da vida dos povos às vezes são surpreendidos com um “BASTA”! Infelizmente, uma parte significativa da cidadania é influenciada por profissionais da política que envergonham o povo com sua desmedida ambição de poder pelo poder, sua falta de ética, sua demagogia e seu descompromisso com os verdadeiros interesses da população.
Como observador da realidade brasileira, vislumbro no horizonte das possibilidades nacionais uma mobilização sinérgica de vontades e ações – que podemos chamar de ‘Revolição Brasileira”, uma mobilização que parte da vontade de cada pessoa em melhorar o Brasil –, baseada na transparência, na intercomunicação e na participação ativa de um grande contingente de líderes e pessoas bem definidas, prontas para se articular com aquelas que, de algum modo, já atuam nessa direção. Aprendi muito sobre esse tema com o Professor Antonio Carlos Gomes da Costa, e tenho certeza que isso mudou a minha vida e a de milhares de jovens.
Vejo como finalidade maior dessa ‘Revolição’ da cidadania um aperfeiçoamento do nosso sistema político, tornando-o capaz de ajudar o Brasil a finalmente vencer os determinismos de nossa formação histórica, até hoje presentes de algum modo na gigantesca enfermidade civilizacional que o paradigma político vigente e muitos políticos profissionais representam e perpetuam.
Fascinados pelo poder, muitos dos nossos políticos não conseguem ver além dos seus umbigos, dos seus interesses patrimonialistas, dos seus projetos de carreira política. Buscam cargos, não encargos; servir-se do poder, não servir aos cidadãos. Seus apetites estão sempre exacerbados pelo horizonte eleitoral: mal saem de uma eleição, vitoriosos ou não, e já tudo fazem, malfazem ou não fazem em função do próximo pleito. São, em sua maioria, “guerreiros” políticos, inebriados, viciados pelo poder, “caçadores” de postos de mando e prestígio na máquina do Estado em todos os níveis.
Para esses personagens, a política é a guerra por outros meios, sem idealismos nem escrúpulos. Competem vorazmente entre si. Aventureiros e oportunistas, esses políticos não se desempenham autenticamente como servidores do povo. Este só lhes interessa como eleitorado passivo, a iludir-se periodicamente, com as pirotecnias da propaganda política enganosa. É lógico que há exceções, mas poucas!
Esse processo transformador se caracterizaria por ser sem ódio nem desrespeito a pessoas, mas sem complacência com as ações daqueles que, em seus cargos e mandatos públicos, estão traindo os interesses e os ideais do nosso povo na construção de um país digno, justo e solidário – essa com que tantos enchem a boca nas campanhas eleitorais e que depois esquecem, pois mal lhes sobra tempo para encher os bolsos com as cobiçadas mutretas do poder, ou para inflarem egos com suas ambicionadas mordomias.
Portanto, paixão lúcida e ação criativa, justa e restaurativa da construtividade política e social seriam os instrumentos fundamentais dessa possível ‘Revolição’ brasileira.
Se olharmos bem, ela de certa forma já começou na indignação e na revolta dos que não aceitam mais ver a vida e as instituições políticas brasileiras jogadas na lama da corrupção e do carreirismo, do cinismo narcisista, da insensatez e da ignorância arrogante erigidos em norma da ação de um considerável número de políticos.
Não precisamos de mudanças radicais ou movimentos violentos para melhorar o Brasil.
A justiça, a democracia plena e o desenvolvimento sustentável somente serão realidade quando houver uma ‘revolição’, ou seja, uma mudança social gradativa que reflita a liberdade de cada um na construção dos conceitos de cidadania e responsabilidade social.
A ‘revolição’ acontecerá em dois tempos. No primeiro, os indivíduos devem ser sensibilizados para acreditar que é possível uma ação solidária em favor do bem comum. No segundo, deve ocorrer a mobilização de forma contagiante. As pessoas veem seus horizontes ampliados, multiplicam suas ações e conquistam mais pessoas para lutar pela causa.
Luis Norberto Pascoal é empresário e presidente da Fundação Educar