Nesse período de pandemia e quarentena onde muitos infelizmente vieram a falecer tem sido comum eu ouvir frases como: “– Que pena, mas Deus sabe o que faz!”, ou: “– Entrega nas mãos de Deus!”, ou ainda: “ – Chegou a hora dela (e)!”. Tais expressões de pensamentos, de crenças me incomodaram a ponto de parar e refletir nessa temática: será que Ele é um ser que planeja a morte das pessoas, promovendo dor e sofrimento tanto em quem parta quanto em quem permaneça só para se divertir? Será que esse deus seguido pela massa da sociedade, é o mesmo Deus cuja liberdade nos foi dada? Cujo pedido de Amor e Compaixão nos foi pedido? Cujo julgamento desejava que fosse abolido? Seríamos nós meras marionetes nas mãos de um deus levado, que gosta de ver o sofrimento alheio? A partir dessa linha de raciocínio e perguntas gostaria que você me acompanhasse nessa reflexão.
Por favor, peço que não me abandone, pois a caminhada é longa e delicada.
Gostaria de deixar claro aqui que a minha reflexão será laica, ou seja, sem defender nenhuma religião, quero apenas provocar a questão que considero ser a principal e que está como pano de fundo dessa realidade que enfrentamos: a Responsabilidade de cada um.
Uns culpam os chineses pela cultura que à eles pertence por terem se alimentado de morcegos, outros culpam políticos, mas é triste ver que o básico não é feito, é desanimador constatar que as orientações mínimas da OMS para que o vírus não se espalhe não sejam levadas a sério.
Li uma frase essa semana que penso ter grande sentido, era algo do tipo: “Até que são apenas números está tudo bem, a hora que os números ganharem nome de pessoas conhecidas e familiares a postura muda, aí talvez seja tarde!”. Mediante essas provocações eu ouso ir mais além: como outorgar a Deus, ou seja, como destinar à Ele a responsabilidade pela disseminação do vírus e pior: pelas mortes? Me desculpe, mas isso me soa cinismo e hipocrisia misturado com ignorância.
Penso que Deus grita incessantemente para que sejamos mais prudentes, para que sejamos mais responsáveis, para que sejamos mais negligentes em relação a atitudes que visem a prevenção contra o COVID-19, mas ele o faz por meios simples, através de pessoas, propagandas, oportunidades de decisão que compreendamos. Se ele intervisse em nossa liberdade e em nossa responsabilidade que Deus seria esse? Acredito que tudo que ele nos ensinou e que ficou registrado não obrigações, apenas convites, Deus está longe de ser um ser autoritário. Ao pensar nisso me recordo na teoria de Causa e Efeito do filósofo Aristóteles, não pense que irá colher tomates se plantar sementes de mamão.
Não coloque a culpa em Deus pelas mortes, pelo desemprego, pela crise, pela disseminação do vírus quando muitas vezes nós é quem saímos de casa por motivos banais, assumindo assim uma postura irresponsável perante a realidade que nos acomete. Cada vez que você sai sem necessidade é como se você tivesse responsabilidade no sepultamento de um ser humano, cheio de sonhos e com uma belíssima história cheia de alegrias e tristezas.
Peço desculpas pelo teor ácido das provocações que lhe fiz, mas esse é o papel da Filosofia, e se escrevo tudo isso é primeiramente para me provocar, para me fazer refletir e me fazer amadurecer, me tornando assim mais responsável. Acredito muito no “Milagre a Quatro Mãos”, é uma metáfora que visa ambas as responsabilidades: as ‘duas mãos’ de Deus intervindo quando nada mais nos é possível e as nossas duas quando temos a oportunidade de fazer a diferença em simples atitudes, decisões e detalhes.
Penso que Deus faz Seus milagres na medida em que nós não julgamos prematuramente, à medida que optamos por respeitar as recomendações da OMS, à medida que usamos de compaixão para com o próximo… São nessas singelas situações que Deus opera e faz seus milagres. Obrigado por me acompanhar até aqui, se você pensa completamente diferente de mim eu lhe respeito e defendo seu direito de pensar assim.
Thiago Pontes é filósofo e neurolinguista (PNL)