Rara leitora, raro leitor, há uma canção chamada “Sons do Silêncio” (Sounds of Silence) composta por Simon e Garfunkel em 1964. O tempo não apaga a excelência da música nem o apelo que ela possuía.
Muitas e muitas vezes, ouvi a música, mas não prestava atenção na letra, somente na melodia, que por si só, é uma obra de arte.
Mas da última vez que escutei a canção, saiu-me a necessidade de escrever este artigo.
Vamos aos trechos mais profundos, traduzidos livremente:
“Quando meus olhos foram apunhalados pelo brilho de uma luz de neon
Que partiu a noite
E tocou o som do silêncio
E na luz nua eu vi
Dez mil pessoas, talvez mais
Pessoas falando sem dizer
Pessoas ouvindo sem escutar
Pessoas escrevendo canções que vozes jamais compartilharam
E ninguém ousava
Perturbar o som do silêncio”
De pensar que essa canção, escrita 60 anos atrás, tem um apelo muito contemporâneo. Ela não fica velha; muito pelo contrário, torna-se cada vez mais atual. As “dez mil pessoas falando sem dizer e ouvindo sem escutar” se transformaram em bilhões.
Bilhões de anônimos em busca do reconhecimento, da fama, do like; tentando suprir as carências afetivas, as dores, as perdas, as exclusões sociais; como já disse o sociólogo Zygmunt Bauman, as redes sociais procuram fazer o papel das instituições enfraquecidas, tais como a escola, a família, os laços com os vizinhos.
Mas fato é que nada é capaz de compensar as ligações que não são criadas ou que são conectadas de forma equivocadas. Nada substitui uma boa educação de base, os exemplos maternos e paternos de respeito, os laços de uma verdadeira comunhão familiar.
E não se trata de ser saudosista, mas de perceber, analisando as publicações e comentários, que as pessoas simplesmente falam, mas não dizem nada; ouvem, mas não escutam.
Não são capazes nem mesmo de manter uma conversa, um diálogo. Tudo virou monólogo. Fala-se quando quer, o que se deseja. Uma conversa ao vivo tem toda a carga visual e energética, consegue-se ver as expressões e entender o corpo falando. Uma conversa por telefone já perde esse componente, mas ainda assim é um diálogo.
Já pelas mensagens on-line, caminhamos para um monólogo. Por excesso de comunicação e por falta de prioridades, deixa-se muitas pessoas sem respostas. Ou apenas com aquelas horríveis “reações” ou os famosos joinhas.
Percebo que nem mesmo consegue-se chamar alguém pelo seu próprio nome. É apenas um frio “oi” e olha lá!
Lembro-me de meu pai, que procurava o crachá em cada camisa de cada pessoa, para chamar pelo seu próprio nome.
Essa atitude era de grande respeito, e quem era chamado, ouvia o som do seu próprio nome, e não do silêncio.
Gustavo Gumiero é Doutor em Sociologia (Unicamp) e Especialista em Antigo Testamento – gustavogumiero.com.br – @gustavogumiero