Os primatas representam o ápice taxonômico. A escala evolutiva é assim entendida, fechando com os macacos e os humanos.
Menos de 1% de diferenciação genética nos separa de alguns símios, mas isso tem sustentado nossa racionalidade, um dado suficiente para nos manter com forte impressão de sermos os mais evoluídos…
S. Freud já nos provocava com mamíferos de taxonomia menor: “Cães amam seus amigos e mordem seus inimigos, bem diferente das pessoas, que são incapazes de sentir amor puro e têm sempre que misturar amor e ódio em suas relações”.
Um brasileiro muito bem-sucedido financeiramente tinha viajado muito pouco, sempre empenhado em fazer fortuna. Perto dos 70 anos, conheceu os EUA e agora visitava a Europa. Em Roma, comentou com a esposa: “Não sei se a Itália é o mais pobre dos países ricos ou o mais rico dos países pobres”…
Diante dos horrores que a mídia e as redes sociais nos apresentam diariamente, podemos verdadeiramente duvidar de nosso desenvolvimento. Seríamos o macaco mais evoluído? Ou o ser humano mais atrasado possível em relação ao nosso potencial evolutivo?
Assombra-nos a Inteligência Artificial. A tecnologia nos atropela, a atualização tem que ser muito rápida e flexível, mas tudo se ajustaria progressivamente muito bem se pudéssemos confiar no próximo. Ou até em nós mesmos!
Ter à disposição, em casa, um aparelho magnífico como “Alexa” é empolgante. Essa assistente virtual é realmente uma ferramenta deslumbrante da Inteligência Artificial. Como é muito sensível ao seu devido nome, não se pode conversar sobre ela no mesmo ambiente onde está, para não a confundir. Alguns chegam a pensar que ela se melindraria com certos descuidos… Há grupos de amigos que já se mobilizaram a dar-lhe um apelido, para falar dela à vontade. Um que foi aprovado por 13 em uma turma de 18 pessoas foi “Xuléa”…
Precisamos brincar, temos que dedicar muito bom humor ao que fazemos e compartilhamos. As novidades são deliciosas, mas ameaçadoras. Estamos escaldados de inovações admiráveis com resultados execráveis.
Os massacres promovidos pelas bombas atômicas no Japão são história recente, revivida por filme atual muito recomendado, “Oppenheimer”, de Christopher Nolan.
“Agora me tornei a morte”, arrependeu-se o eminente físico J. R. Oppenheimer, chocado com a constatação destrutiva da bomba atômica que ajudou a criar.
Alguns seres humanos são realmente evoluídos, espiritualmente nobres. Eles conseguem nos animar, fazer acreditar em nossa latência evolutiva.
Os artistas, de modo geral, conseguem, com força anímica e exuberância estética, manter os incentivos, fazer com que acreditemos na predominância dos homens de bem. E até nos entusiasmar com épocas e datas tradicionais, suportando as explorações publicitárias e abusos comerciais.
Seja para os cristãos, agora com o Natal e o Ano Novo, para os judeus, no ano 5.784, ou para os muçulmanos, no ano 1445, ou quaisquer calendários, a arte tem esse vigor existencial.
Aproveitemos, então, textos de expoentes da literatura luso-brasileira: Fernando Pessoa e Clarice Lispector.
Do português: “Pedras no caminho? Guardo todas. Um dia, vou construir um castelo.”
Entremeando os dois, criemos um chanfro para lembrar do que Carlos Drummond de Andrade fez com a pedra no meio do caminho…
E da ucraniano-brasileira: “Mandei lustrar os instantes do tempo, rebrilhar as estrelas, lavar a lua com leite e o sol com ouro líquido. Cada ano que inicia, começo eu a viver.”
A meus caros leitores, colegas, amigos e familiares, excelente final de temporada e ótimo 2024!
Joaquim Z. Motta é psiquiatra, sexólogo e escritor