A União Plurinacional dos Estudantes Indígenas (UPEI) do Brasil defende uma punição “exemplar” ao estudante do curso de Filosofia da PUC-Campinas, que aparece em vídeo com declarações polêmicas durante o evento Portas Abertas da Unicamp, realizado no último sábado (19), no qual os participantes integram visitas guiadas pela universidade.
A entidade denuncia racismo contra os povos indígenas por parte do acadêmico e classifica a atitude dele como intolerável. “Estamos cobrando a Unicamp e a PUC, inclusive defendendo a expulsão do estudante da universidade”, diz Arlindo Baré, presidente da UPEI.
No vídeo, o estudante da PUC se manifesta durante uma sessão de exposição do Grupo de Estudos de Filosofia Indígena: “acho que índio, no meu ponto de vista, tem que tirar aquela tanga dele lá… tá certo? E estudar nossa língua ao invés de ficar falando essa língua que ninguém entende. A maioria das pessoas não está interessada em aprender tupi guarani e nem língua nenhuma deles”.
Veja aqui o vídeo
As palavras provocaram repúdio por parte de representações dos povos indígenas. “Entendemos que o principal objetivo do curso de Filosofia é formar profissionais capazes de fazer análises críticas, rigorosas e profundas sobre questões das mais variadas dimensões da existência humana, incluindo individual, social, política, econômica, artística e espiritual. Dessa forma, não aceitamos a formação de universitários com pensamentos e comportamentos preconceituosos, racistas e xenofóbicos”, diz nota publicada pela UPEI em seu Instagram.
Para Baré, que também é integrante do coletivo dos Estudantes Indígenas da Unicamp e aluno do curso de Engenharia Elétrica da universidade, a desinformação ainda é a causa principal das posições que violam a história dos povos originários.
“Defendo que o Estado deveria atuar pela reeducação da sociedade brasileira a partir da base para que o desconhecimento não se reflita até mesmo em acadêmicos de instituições importantes”, afirma. Ele reforça a necessidade de uma posição rigorosa ao estudante da PUC. “Só assim, é possível inibir ocorrências da mesma natureza”, justifica.
Por enquanto, Unicamp e PUC se manifestaram em forma de repúdio por meio de publicações em redes sociais.
Para a Universidade Estadual, o estudante de Filosofia “emite opiniões infundadas, demonstra preconceito e ignorância, desrespeita a diversidade de saberes e culturas, expressa e promove a violência contra os povos indígenas e incorre no crime de racismo”. A universidade ainda afirma que o “IFCH e toda sua comunidade se solidarizam com os povos indígenas, que hoje fazem parte dos saberes que ensinamos, aprendemos e compartilhamos”.
A PUC segue na mesma linha. “A PUC-Campinas defende e preza, em todas suas atividades acadêmicas e institucionais, uma sociedade justa e fraterna, o que inclui o respeito às origens e às culturas diversas que compõem a nação brasileira. A Universidade condena com veemência a manifestação do estudante e reforça que a postura do aluno confronta a missão e os valores da instituição”.
A Unicamp tem hoje 460 estudantes indígenas. Para Baré, de 43 anos, essa integração contribui para “a cura de uma sociedade doente”, diz. “Nossa ciência é a relação com a natureza e, nesse sentido, podemos levar nossa contribuição”, afirma.
Do Amazonas à Unicamp
Originário da terra Cué-Cué Marabitanas, no Amazonas, Baré ficou órfão aos 2 anos de idade, quando passou a ser criado pelo avô junto com uma irmã e um irmão. Aos 12 anos, se mudou para São Gabriel da Cachoeira, cidade mais próxima da aldeia que habitava. No local, passou a se dedicar aos estudos, um anseio do avô.
“Achei que na área da energia elétrica poderia contribuir com meu povo. E hoje tenho a possibilidade de trabalhar em políticas públicas voltadas à implantação de energia renovável em terras indígenas”, explica ele, que é integrante do Conselho Nacional de Educação Escolar Indígena (Cneei), órgão ligado ao Ministério da Educação.
Na Unicamp, como membro do Diretório Central dos Estudantes (DCE) e cofundador do coletivo dos Estudantes Indígenas, alcançou conquistas importantes. Uma delas, diz, foi ter adquirido um terreno para a ampliação da moradia da universidade com o objetivo de atender estudantes de baixa renda. Aliás, ele mesmo é um dos moradores do local junto com a esposa, que é estudante de Engenharia de Alimentos, e dois filhos, um de 6 e outro de 17 anos.