Gestantes e puérperas acabaram se tornando um grupo vulnerável à Covid-19. Estudos feitos em larga escala em todo o mundo apontam que a mulher que leva o seu filho no ventre tem a capacidade respiratória reduzida, abrindo chance para complicações. Levantamento publicado em setembro de 2020 no British Medical Journal, por exemplo, calculou que gestantes infectadas com o coronavírus tinham um risco 62% maior de internação em UTI e 88% mais probabilidade de necessitar de ventilação mecânica invasiva. É por isso que elas têm de ter um cuidado especial. É é por isso que há uma rede de proteção mais ampla para esse grupo.
Mesmo assim, há casos de judicialização. A Justiça do Trabalho acaba de conceder liminar obrigando uma empresa de Campinas a manter uma funcionária gestante em home office durante a pandemia sem qualquer prejuízo à sua remuneração e ao contrato de trabalho, sob pena de multa de R$ 1 mil por mês se o empregador descumprir a decisão.
A liminar da 6ª Vara do Trabalho de Campinas foi obtida pelo escritório Advocacia Cremasco, que deu início ao processo após ter sido procurado por algumas trabalhadoras que tiveram o direito ao teletrabalho negado pelos empregadores mesmo depois da aprovação da Lei 14.151, que prevê a substituição do trabalho presencial pelo remoto.
Lei já sancionada
No mês passado, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou lei que garante o afastamento presencial de empregadas grávidas durante o período de crise da Covid-19, sem qualquer prejuízo ao salário. O projeto de lei havia sido aprovado pelo Congresso no último dia 15 de abril. A autoria é da deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC). O texto prevê que a funcionária gestante deve permanecer em trabalho remoto, à disposição do empregador, até o fim do estado de emergência em saúde pública.
Obrigação
A decisão da Justiça em Campinas ressalta que a empresa não poderá suspender o contrato de trabalho e incluir a funcionária no Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda. “Muitos empresários têm usado a MP 1.045 do governo federal para suspender o contrato de trabalho das grávidas numa tentativa de burlar a Lei 14.151 para não manter suas funcionárias em teletrabalho. A suspensão do contrato corta uma série de benefícios a que as mulheres têm direitos, como vale-alimentação e FGTS”, explica a advogada especialista em Direito do Trabalho e Previdenciário, Thaís Cremasco.
A especialista explica que, por meio da suspensão do contrato de trabalho, o salário do funcionário é custeado pelo governo (70%) e empregador (30%), mas essa medida implica a suspensão do depósito do FGTS, da concessão de cesta básica e do vale-refeição, que são direitos garantidos pela lei. “As empresas são obrigadas a colocar as gestantes em home office e manter o contrato de trabalho ativo. Se a empresa se recusar ou pedir para que as funcionárias assinem documentos para a suspensão do contrato, as mulheres podem procurar um advogado para garantir seus direitos”, orienta.
Preocupação no Brasil
O número de mortes de grávidas e puérperas – mães de recém-nascidos – por Covid-19 mais que dobrou em 2021 em relação à média semanal de 2020. Além disso, o aumento de mortes neste grupo ficou muito acima do registrado na população em geral, segundo dados analisados pelo Observatório Obstétrico Brasileiro Covid-19 (OOBr Covid-19).
Uma média de 10,5 gestantes e puérperas morreram por semana em 2020, chegando a um total de 453 mortes no ano passado em 43 semanas epidemiológicas. Já em 2021, a média de óbitos por semana chegou, até 10 de abril, a 25,8 neste grupo, totalizando 362 óbitos neste ano durante 14 semanas epidemiológicas.
Segundo o levantamento houve um aumento de 145,4% na média semanal de 2021 quando comparado com a média de mortes semanal do ano passado. Enquanto isso, na população em geral, o aumento na taxa de morte semanal em 2021 na comparação com o ano anterior foi de 61,6%.
A professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e uma das criadoras do observatório, a médica Rossana Francisco, avalia que o País precisa de políticas públicas direcionadas para a população de gestantes e puérperas para conseguir reduzir sua mortalidade.
Morte materna elevada
A médica, que também é presidente da Associação de Medicina e Obstetrícia do Estado de São Paulo (Sogesp), afirma que a morte materna no Brasil, em geral, é elevada e que havia uma fragilidade no atendimento às gestantes e puérperas dentro do sistema de saúde no País. Diante de elementos como a sobrecarga nesse sistema por conta da pandemia e o surgimento de variantes de Covid-19 – que podem estar associadas a casos mais graves da doença -, há uma piora no atendimento a este grupo.
“Quando olhamos a situação da gestante e da puérpera, já temos uma rede de saúde que não é muito organizada para atenção a casos graves para este público, tanto que [o Brasil] tem uma razão de morte materna de 55 [mortes por 100 mil nascidos vivos], deixando claro que realmente temos uma dificuldade na atenção para a saúde da mulher, especialmente gestante e puérpera”, disse a médica. A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é que a razão de morte materna seja menor que 20.
Até o mês passado, o governo federal havia contabilizado no País, este ano, a morte por Covid-19 de 642 grávidas, contra 457 em todo o ano passado.
(Com informações da Agência Brasil)