Enfraquecimento do Ministério de Marina Silva, decisões que afetam demarcação de áreas indígenas e o crescimento dos interesses econômicos frente às questões ambientais. Os últimos eventos do Governo Lula servem de alerta neste Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado nesta segunda-feira (5). O cenário impõe uma ameaça aos compromissos assumidos pela gestão e aponta para desafios.
Especialista em meio ambiente, o jornalista José Pedro Martins, autor de mais de 40 livros sobre o tema e colunista do Hora Campinas, faz uma reflexão sobre o atual quadro. E chama a atenção para o perigo do projeto socioambiental, uma das bandeiras do atual governo, ser engolido por uma política negacionista e destrutiva que caracterizou o Brasil nos últimos quatro anos.
“Permanecem os fortes interesses políticos e econômicos sobrepujando os interesses coletivos”, detecta Martins ao analisar as últimas decisões na Câmara dos Deputados. Uma delas, que retira atribuições do Ministério do Meio Ambiente, se configura em um risco ao plano de preservação, avalia.
“É mais um entrave no combate ao desmatamento da Amazônia e à proteção da Mata Atlântica, que já teve 90% da cobertura original destruída”, observa o jornalista.
Outra decisão prejudicial ao compromisso de proteção do meio ambiente foi a aprovação na Casa na última semana do projeto sobre o marco temporal da ocupação de terras por povos indígenas, que afeta a demarcação das áreas.
“Está provado que onde mais se concentra a proteção dos recursos naturais são nas áreas ocupadas pelos povos indígenas”, reforça Martins.
O atual embate da Petrobras com o Ibama é também um episódio caracterizado pelo interesse de grupos políticos e econômicos em prevalecer sobre as questões ambientais. Nos últimos dias, a empresa entrou em conflito com o instituto, que barrou a exploração de petróleo na Foz do Amazonas, a chamada Margem Equatorial, por não identificar garantias de medidas para evitar o impacto no meio ambiente. A posição do Ibama provocou uma chuva de ataques de grupos políticos e econômicos ao órgão.
“Muitas das possíveis áreas de exploração estão em espaços com frágeis ecossistemas de recifes de coral, ou seja, há o temor do impacto ambiental na região”, explica Martins, que, diante do conflito, questiona a respeito dos caminhos que a Petrobras seguirá no futuro.
“A empresa que desenvolveu sólida e eficiente tecnologia nacional para a extração e processamento de petróleo e derivados encontra-se diante do dilema do necessário esforço que precisa ser feito pela comunidade internacional para deter a escalada das mudanças climáticas. Então a Petrobras precisa definir se continuará sendo uma empresa de petróleo e demais combustíveis fósseis ou uma empresa de energia, com investimento sólido também em energia limpa.”
Martins reforça que a rápida substituição de combustíveis fósseis, como gasolina, carvão e gás, por fontes limpas e renováveis, como energia solar e eólica, é um dos principais caminhos dentro do desafio de enfrentar as mudanças climáticas. Ele observa avanço nessa trajetória, mas ainda em uma velocidade muito aquém do necessário.
“A nível global, os investimentos em fontes renováveis estão crescendo, mas, por outro lado, o total de subsídios governamentais aos combustíveis fósseis em 2022 superou 1 trilhão de dólares, recorde histórico, segundo a Agência Internacional de Energia”, expõe o especialista.
Trajetória
José Pedro Martins, de 62 anos, começou a fazer jornalismo ambiental em 1982, quando ainda era estudante de comunicação e acompanhou, em Piracicaba, a mobilização da cidade em defesa do Rio Piracicaba, que passava por grave processo de poluição.
Desde então, se envolveu com o tema e se tornou uma voz de destaque em defesa do meio ambiente, com reportagens premiadas, livros lançados e participação em importantes eventos, como a ECO-92, no Rio de Janeiro.
Martins acredita que nesses seus mais de 40 anos de atuação houve avanços nas ações ligadas à preservação da vida, com a adoção de políticas públicas, legislação e mobilização social. No entanto, ele avalia que as medidas ainda não atingem uma intensidade suficiente para deter o “rápido processo de deterioração ambiental em todos os níveis”.
“Temos hoje duas grandes crises globais: a das mudanças do clima e da erosão da biodiversidade, com desmatamento acelerado em várias áreas, como na Amazônia”, aponta o jornalista, que também alerta sobre outros graves problemas, como a poluição dos oceanos por excesso de plástico, e a poluição atmosférica. “São situações que afetam a vida marinha e provocam milhões de mortes anuais no planeta”.
Para Martins, a ampliação da fiscalização é uma medida emergencial. “É preciso uma ação urgente, determinação política e punição efetiva para os responsáveis por delitos ambientais, para deter a destruição da vida”, encerra.