Por José Pedro Martins
Especial para o Hora Campinas e Agência Social de Notícias
A aquisição de um radar meteorológico de última geração, para monitoramento de eventos climáticos extremos na Região Metropolitana de Campinas (RMC) foi motivada pela microexplosão atmosférica ocorrida em 5 de junho de 2016. Naquela data em que se comemorava mais um Dia Mundial do Meio Ambiente, Campinas foi atingida por uma microexplosão que deixou um rastro de destruição pela cidade.
Já em 2017 começaram as gestões para a compra do radar, que chegou sexta-feira (13) no Aeroporto Internacional de Viracopos, vindo dos Estados Unidos, e será instalado no Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri), da Unicamp. O equipamento vai compor o Centro Regional de Meteorologia da RMC, que é fruto de uma mobilização do conjunto dos 20 municípios e do Conselho de Desenvolvimento da Região, atualmente presidido pelo prefeito de Jaguariúna, Gustavo Reis.
“Será um avanço muito grande para o planejamento de situações de desastres na RMC. O radar terá um alcance de no mínimo 60 quilômetros a partir da Unicamp. Atualmente, a região depende de informações de radar instalado em Bauru, a cerca de 240 quilômetros”, comenta Sidnei Furtado Fernandes, coordenador regional da Defesa Civil e diretor do órgão em Campinas.
Ele participa desde o início das conversas pela aquisição do radar meteorológico, como parte do esforço de aprimoramento da capacidade regional de enfrentamento dos eventos climáticos extremos e desastres em geral.
Microexplosão e rastro de destruição
O radar foi adquirido com recursos do FundoCamp, que é vinculado à Agência Metropolitana de Campinas (Agemcamp) e destina recursos para obras e projetos prioritários para a região, debatidos nas Câmaras Temáticas específicas e aprovados pelo Conselho de Desenvolvimento da RMC. Composto por representantes dos 20 municípios da RMC e do Estado, o Conselho é o órgão máximo da Região Metropolitana.
De fato, a compra de um radar meteorológico com a tecnologia mais moderna foi considerada fundamental pelo conjunto da RMC, após o evento climático extremo registrado em Campinas em 5 de junho de 2016. Foram poucos segundos e estavam no chão tanto jequitibás-rosa centenários, localizados em área do Instituto Agronômico de Campinas, como palmeiras imperiais então recém-plantadas.
Estes foram alguns dos marcos localizados, respectivamente, no início e no final da rota da destruição provocada por microexplosões atmosféricas na madrugada daquele domingo, em que a cidade acordou apavorada.
Centenas de árvores derrubadas, destelhamento de residências e complexos como o Galleria Shopping, corte de energia para milhares de pessoas e várias ruas e avenidas interditadas: este foi o saldo material dos impactos de ventos que chegaram a 120 km por hora. Bambini, Educandário Eurípedes e Lar dos Velhinhos de Campinas foram atingidos, assim como residências do Caminhos de São Conrado, em Sousas.
O complexo social reunindo o Educandário Eurípides, a Editora “Allan Kardec” e a Creche Mãe Luiza foi duramente atingido. O Educandário teve o telhado quase todo destruído. Mais de 60 voluntários trabalharam ainda durante o domingo na limpeza do local.
A intensa ventania seguiu mais o menos a direção da avenida Dr. Theodureto de Almeida Camargo, fazendo vários estragos no alto do Taquaral. Muitas árvores caíram, na própria avenida Dr. Theodureto e em ruas próximas, como Padre Domingos Giovanini e Fernão Lopes.
Depois do Taquaral os ventos mais fortes foram registrados na região do Parque São Quirino, Residencial Vista Verde e Jardim Madalena, até provocar grande destruição na cobertura do Galleria Shopping, na rodovia D.Pedro I. Edifícios inteiros tiveram vidros de janelas e fachadas quebrados.
O roteiro da devastação prosseguiu, com a derrubada de várias árvores no distrito de Sousas, nas proximidades do Condomínio San Conrado, que foi especialmente atingido. Também foram ao chão muitas palmeiras plantadas que tinham sido recém-plantadas, ao longo da ampliação da avenida Mackenzie.
Mobilização na RMC
O alto potencial de destruição da microexplosão assustou os gestores e comunidades em geral na Região Metropolitana de Campinas. A RMC já tinha sentido o impacto de um tornado de vórtices múltiplos em Indaiatuba, em 24 de maio de 2005. A região já pressentia, então, a necessidade de preparação para eventos climáticos extremos, que na época eram alertados por cientistas, como consequência das mudanças climáticas em curso, mas ainda sem a atenção geral de governos e grande parte da sociedade.
A microexplosão acelerou a discussão na RMC, sobre a alta relevância de preparação para eventos climáticos extremos. Em 2017 começaram os debates na Câmara Temática de Defesa Civil, que tem a participação de órgãos de Defesa Civil dos municípios e técnicos de várias áreas que atuam na prevenção de desastres.
As reflexões na Câmara Temática tiveram a influência positiva das discussões que começaram a ser intensificadas na RMC, incentivadas pela Campanha Construindo Cidades Resilientes, iniciativa da Agência das Nações Unidas para Redução de Riscos de Desastres (UNISDR).
O propósito da Campanha era justamente estimular as cidades a se prepararem de forma adequada para os impactos dos eventos climáticos extremos e desastres em geral. Desde o início e durante muitos anos a Campanha foi coordenada no Brasil por Sidnei Furtado Fernandes, o dirigente da Defesa Civil de Campinas e coordenador regional. Começando por Campinas, os municípios da RMC passaram progressivamente a seguir os princípios da Campanha Construindo Cidades Resilientes.
Nos primeiros meses de 2020, teve início a pandemia de Covid-19, que representou “uma total mudança de curva”, nas palavras do coordenador Sidnei Fernandes. “Em função da Covid-19, todos os procedimentos de emergência tiveram que ser revistos. E toda a Região Metropolitana ficou ainda mais atenta para a importância da prevenção”, ele explica.
Durante a pandemia, a Câmara Temática de Defesa Civil aprovou então vários projetos de impacto para a prevenção regional voltada para desastres em geral, de calamidades como pandemias aos eventos climáticos extremos.
Foi aprovada, por exemplo, a instalação de uma sala de Centro de Operações de Emergência (COE) em cada um dos 20 municípios da RMC. As salas de COE, em implantação no conjunto da região, serão equipadas com recursos tecnológicos e humanos de perfil intersetorial. Terão, portanto, representantes das áreas de meio ambiente, saúde, assistência social e outros em cada município, de modo que as medidas de prevenção e contra desastres sejam tomadas de forma integrada.
As operações do COE, explica Sidnei Fernandes, utilizarão informações como aquelas derivadas do radar meteorológico e outros recursos do Centro Regional de Meteorologia da RMC. A compra do radar foi igualmente aprovada pela Câmara Temática de Defesa Civil e aprovada pelo Conselho de Desenvolvimento da RMC. A maior parte dos recursos investidos no equipamento, de cerca de R$ 4,8 milhões, foi aportada pelo Fundocamp e pela própria Unicamp.
Ainda como parte do esforço regional de enfrentamento das mudanças climáticas, a Câmara Temática também aprovou a instalação de estações meteorológicos em cada um dos 20 municípios da RMC, projeto desenvolvido em parceria com o Instituto Agronômico de Campinas. As estações já foram instaladas, com recursos do Fundocamp.
Como contrapartida a todos os benefícios recebidos, os municípios da RMC se comprometeram a aprimorar seus órgãos locais de Defesa Civil (ou a criá-los onde não existiam) e a aderir aos princípios da Campanha Construindo Cidades Resilientes da ONU (MCR 2030)
Com a chegada do radar meteorológico, o coordenador regional da Defesa Civil, Sidnei Fernandes, considera que a RMC dá um passo essencial para a preparação no enfrentamento de eventos climáticos extremos e desastres em geral, de forma associada com a estrutura baseada no funcionamento dos COEs e demais órgãos públicos municipais e estaduais.
Mas ele avisa que “será cada vez mais importante a mobilização e a capacitação das comunidades para o enfrentamento dos eventos climáticos extremos, é fundamental a autoproteção, como ficou claro nestes dias com a proliferação de incêndios”.
“Essa conquista é fruto de um esforço conjunto, resultado de uma demanda importante discutida em diversas reuniões do nosso Conselho,” disse Gustavo Reis, presidente do Conselho de Desenvolvimento da RMC e prefeito de Jaguariúna. “A instalação deste equipamento na Unicamp representa um avanço significativo para nossa região”, complementou Reis, prefeito que esteve à frente do Conselho da RMC em várias gestões, inclusive durante o combate à pandemia de Covid-19.
“Haverá muito trabalho a ser feito para atingir a plena capacidade (do radar meteorológico e Centro Regional de Meteorologia da RMC) de servir à população da nossa região,” comentou o reitor da Unicamp, Antonio José de Almeida Meirelles, sobre a aquisição do equipamento importado dos Estados Unidos.
O trabalho continua
Com efeito, o trabalho de capacitação da RMC para enfrentamento das mudanças climáticas não para. Em 2022, como resultado de sua atuação histórica no setor, Campinas se tornou o primeiro Centro (ou Hub) de Resiliência do Brasil, por reconhecimento do Comitê de Coordenação Global da Iniciativa Construindo Cidades Resilientes e Escritório das Nações Unidas para Redução de Desastres.
Com isso, a Defesa Civil de Campinas se credenciou para treinar outros municípios nos princípios seguidos pela MCR 2030 da ONU. Todos os municípios da RMC já participaram de treinamentos, em várias áreas, assim como municípios de outras regiões.
No caso de Campinas, especificamente, a preparação para desastres também contempla iniciativas como um convênio da Defesa Civil com a Embrapa Territorial, para o uso de tecnologia de satélite em medidas preventivas.
Como nota o coordenador Sidnei Fernandes, a recente e inédita onda de queimadas por todo o território brasileiro deixou claro que “não é questão de quando os eventos climáticos extremos vão acontecer, eles já estão acontecendo”.
Com seus mais de 3,5 milhões de habitantes, e um dos polos científicos e tecnológicos mais importantes do Brasil, a RMC está buscando aprimorar suas capacidades, com o essencial papel da sociedade em geral nesse momento novo, irreversível e assustador na história do planeta.