O Ministério Público do Trabalho (MPT) conseguiu a condenação da multinacional Aperam Inox Serviços Brasil Ltda., empresa fabricante de produtos de aço inox com fábrica sediada em Campinas, por assédio moral e discriminação a trabalhadores vítimas de acidentes e doenças do trabalho. A sentença da 10ª Vara do Trabalho de Campinas determinou uma série de obrigações de fazer e não fazer, além do pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 200 mil. Cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15).
Em nota, a empresa afirma que sempre se colocou à disposição para esclarecer as alegações ora acatadas pelo Ministério Público, demonstrando “tratarem-se de acusações levianas e que não refletem a realidade dos fatos”.
A decisão
De acordo com o MPT, foram impostas à empresa ré as seguintes obrigações: abster-se de cometer atos de assédio moral (xingamentos, pressão psicológica, ameaças, imposição de castigos e metas abusivas, etc), especialmente contra empregados reabilitados; elaborar programa permanente de prevenção ao assédio moral no ambiente de trabalho, prevendo uma série de iniciativas de diagnóstico, intervenção e treinamento; oferecer mediações em casos de conflito, com a garantia de sigilo; realizar palestras e atividades de conscientização com periodicidade mínima de 6 meses.
A empresa também precisa criar uma ouvidoria e canal de denúncia, garantindo a proteção e sigilo da identidade do denunciante, com a obrigação de divulgar o canal; acompanhar a conduta do assediador em caso de confirmação do assédio, instruindo-o a não mais praticar tal conduta e, se necessário, punindo-o; afixar comunicações informando sobre as medidas de prevenção ao assédio, bem como as obrigações impostas à empresa; implementar normas de conduta que garantam um meio ambiente de trabalho saudável e digno; e deixar de utilizar métodos de gestão que propiciem o assédio moral, como o estímulo à competição, a exposição pública de desempenho e a atribuição de tarefas vexatórias, bem como manter trabalhadores reabilitados em estado de ociosidade.
Caso descumpra a decisão, a empresa pagará multa de R$ 10 mil por item.
Inquérito
A ação civil pública foi ajuizada pela procuradora Carolina Marzola Hirata, após a instrução de inquérito civil que reuniu provas de que a empresa pratica assédio moral organizacional contra trabalhadores que se acidentaram ou contraíram doença ocupacional, aponta o MPT.
Segundo depoimentos registrados no inquérito, a empresa dificulta o retorno dos empregados reabilitados às suas atribuições funcionais. Foram relatados ao MPT casos em que a empresa oferecia acordos para que os trabalhadores renunciassem à estabilidade acidentária, imposta por lei, em troca de indenizações individuais.
“Os empregados que foram vítimas de acidentes ou doenças do trabalho eram expostos a situações vexatórias, deixados sem função por meses. Há relatos de xingamentos, tais como “vagabundo”, e de pressão psicológica para forçar um pedido de demissão por parte do trabalhador. Um empregado foi colocado em um arquivo morto com fezes e urina de rato, goteiras e sem mesa para o trabalho, obrigando-o a desempenhar suas funções no chão”, aponta o órgão.
Ainda de acordo com o MPT, a conduta da empresa também impedia a ascensão profissional de trabalhadores reabilitados, que se disseram estagnados na carreira pelo fato de sua condição de lesionados, mesmo tendo realizado cursos para se capacitarem para a execução de novas atividades dentro da fábrica.
“A destruição de oportunidades de emprego de trabalhadores que adoecem em razão do trabalho implica violação a direitos fundamentais consagrados constitucionalmente como o direito ao trabalho, à igualdade e, consequentemente, à não discriminação. A discriminação não só impede o trabalhador de sobreviver dignamente, mas também inviabiliza a sua realização como ser humano e como cidadão, já que é através do trabalho que ele adquire independência e pode exercer sua criatividade”, afirma a procuradora.
“Percebe-se que a reclamada dispensava tratamento discriminatório aos empregados que detinham restrição ao trabalho, em razão de redução da capacidade laboral, possivelmente com estabilidade no emprego decorrente da referida cláusula convencional. Tanto que os depoimentos acima colacionados demonstram intuito dos prepostos da reclamada no sentido de forçar os trabalhadores a pedir demissão”, escreveu na sentença a juíza Paula Araújo Oliveira Levy, complementando que, ao agir dessa forma, “a empresa deixa de cumprir com sua função social, com sua obrigação de redução de riscos inerentes ao trabalho […], ao contrário, gera um ambiente nocivo em que se propicia o surgimento e agravamento de doenças”.
A multinacional reiterou que não concorda com o desfecho.
“Quanto ao processo em questão, trata-se de decisão de primeira instância e para a qual ainda cabem diversos recursos judiciais, que serão oportunamente interpostos pela empresa a fim de que a verdade prevaleça, buscando a reversão da decisão nos termos desfavoráveis à Aperam”.