Campinas contabilizou no ano passado 2.886 notificações de casos suspeitos ou confirmados de violência em crianças, adolescentes e idosos – faixas etárias consideradas mais vulneráveis. Trata-se do maior número já notificado desde que o Boletim Sisnov (Sistema de Notificação de Violências), que chegou a sua 16ª edição, começou a ser usado pela Administração.
Os números foram apresentados nesta segunda-feira (11) pela Secretaria de Saúde de Campinas. O documento, com dados de 2018 a 2022, mostra que os registros diminuíram no início da pandemia de covid-19, mas tiveram crescimento significativo a partir do recrudescimento dela, em 2021, conforme houve avanço da cobertura vacinal contra a doença.
Desde 2009, quando teve início a série histórica, Campinas registrou 24.628 notificações. O sistema indica tendência de crescimento, com exceção dos anos de 2019 e 2020.
Ainda no intervalo de 2021 até o ano passado, o sistema verificou aumento de casos em todas as faixas a partir de 10 anos – referência para início da adolescência por conta do ciclo de vida e diferente da divisão etária feita pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
No intervalo de 2018 a 2022 foram 10.659 notificações, o equivalente a 43,2% do total.
“A violência é complexa e muitas vezes estigmatizada e de difícil condução. Precisamos falar mais sobre esta temática e o boletim consegue, em partes, demonstrar este perfil e onde devemos atuar de forma a garantir uma sociedade mais justa e livre da violência”, avaliou a responsável técnica pelo Sisnov, Juliana Bassul.
“O maior número de notificações [nestes quatro anos] foi realizado pelas unidades da Secretaria Municipal de Saúde, com 5.641 notificações (54%), seguidas pelas unidades da Secretaria Municipal de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos, com 3.144 notificações (30%), e pela Unicamp/Caism, com 835 das notificações (8%). Esses três grupos são responsáveis por 90,3% das notificações”, informa trecho do boletim
Violência em crianças e adolescentes
O levantamento mostra que, a partir de 2021, o número de notificações aumentou para crianças e adolescentes. No ano seguinte, em contrapartida, houve redução de casos no grupo de crianças, enquanto que para o de adolescentes verificou um novo aumento.
Desde 2018, a maioria das notificações de violência contra crianças e adolescentes foi para vítimas do sexo feminino, sendo 55,1% de crianças e 63,4% de adolescentes.
Com relação ao tipo de violência registrada, as notificações de crianças foram principalmente a negligência, em 42,7%, seguida de violência sexual, que representou 27,3% do total.
Já em adolescentes, o tipo de violência notificado com maior frequência foi a violência sexual, em 23,2%, e na sequência aparece a tentativa de suicídio, com 20,8%.
Nas estatísticas sobre crianças, os principais autores foram os cuidadores diretos (mãe, pai, madrasta, padrasto), e para adolescentes foram os próprios indivíduos, informou o boletim.
Violência em mulheres
O levantamento enfatiza que “a violência contra mulheres é um importante problema de saúde pública que vem apresentando aumento expressivo desde o ano de 2020 para todas as faixas etárias”. A predominância de casos está na faixa etária de 30 a 59 anos.
A violência notificada com maior frequência foi física, com 46,3% do total, seguida das tentativas de suicídio, com 27,5% e tendência de aumento nos últimos dois anos.
Sobre o autor, “nota-se aumento considerável naquelas em que a própria pessoa foi responsável, com 31% das notificações em 2022, dado importante para ser analisado em conjunto com o aumento de notificações por tentativas de suicídio a partir do ano de 2020.”
O cônjuge como autor representou, em 2021 e 2022, respectivamente, 24% e 25% do total de notificações. Já quando associados cônjuge e pessoa com relação próxima ou familiar, os valores foram 37% e 39%, o que demonstra proximidade do agressor com a vítima.
Violência em idosos
Ainda considerando-se o período de 2018 a 2022, as notificações de violência contra pessoas de 60 a 69 anos foram responsáveis por quase metade do total. No último ano, também houve aumento para faixas de 70 a 79 anos, e para 80 anos ou mais.
As principais vítimas foram do sexo feminino ao longo dos anos analisados.
O tipo de violência mais notificado em idosos foi a física, com 35,4%, seguida da negligência, com 23,7% do total. O ano de 2022, especificamente, se destacou pelo aumento do número de notificações de violência física, negligência e tentativa de suicídio.
“Ao analisar os autores das violências contra a população idosa foi possível verificar que mais da metade das notificações envolveram, como autores, pessoas próximas à vítima. Com predominância de filhos e netos como principais autores”, informa o levantamento.
Suicídio
Houve aumento acentuado e progressivo das notificações por tentativas de suicídio em Campinas de 2020 a 2022, e a maioria das notificações, no período, envolveu a população do sexo feminino. “Foi possível observar, ainda, que a maioria das notificações de tentativa de suicídio ocorreu em indivíduos de 20 a 59 anos, e que residiam no distrito Sul”, diz texto.
O que está sendo feito?
Diante do novo Boletim Sisnov, o Departamento de Vigilância em Saúde (Devisa) destacou a importância da continuidade do processo de articulação e organização da rede de combate à violência, e das ações de vigilância para definir estratégias de enfrentamento.
“A notificação se revela como uma ferramenta fundamental para compreender o perfil da violência, possibilitando intervenções e ações preventivas. A abordagem intersetorial e a formação de redes para o atendimento de pessoas em situação de violência são indispensáveis para conduzir ações efetivas de prevenção e promoção da saúde.”
O Devisa reiterou que as secretarias têm realizado trabalho contínuo de sensibilização para o tema para aprimorar a qualidade dos dados de violência e fortalecer a rede de cuidado “ressaltando a importância de abordagens diferenciadas nas escolas, unidades de saúde e demais serviços, promovendo uma escuta qualificada e protegida”.