Os vereadores que defendem o afastamento imediato do presidente da Câmara Municipal de Campinas, Zé Carlos (PSB), entendem que os diálogos são bastante categóricos. Para eles, há indícios suficientes de negociação explícita de propina para renovação de contratos. Os diálogos, aos quais o Hora Campinas teve acesso, revelam que o operador do esquema era o advogado Rafael Creato, lotado no Legislativo. Ele é funcionário comissionado da Casa e trabalha diretamente com Zé Carlos.
Apuração do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do estado de São Paulo (MPSP) aponta que assim que o vereador José Carlos Silva, o Zé Carlos, assumiu a presidência da Câmara de Campinas, em janeiro de 2021, foi iniciado um esquema de exigência de vantagens indevidas.
O órgão recebeu gravações que comprovam ato de corrupção passiva por parte do parlamentar e de seu advogado comissionado. Segundo a investigação do MP, diversos fornecedores passaram a ser chamados para reuniões com o advogado e com o vereador.
Num dos diálogos (ouça abaixo), Creato conversa com um fornecedor. E o diálogo sugere um possível acordo para vantagem percentual do contrato a Zé Carlos.
“Deixa eu te fazer um pedido primeiro. Eu quero ser parceiro. Não de agora, não para esse ano. Longa data”, aborda Creato ao fornecedor. “Eu quero ser parceiro para essa licitação. Para a próxima licitação… Eu quero tá junto”, continua.
“Eu pensei nas duas opções. Na situação atual, o que dá para fazer… E na situação nova. Consegue se acrescentar os … (áudio truncado, mas parece ter sido citado 25%). Fica bem melhor para o presidente… E no meu eu não mexo em nada”, complementa o assessor.
A defesa de Zé Carlos e de Creato afirma que eles só irão se manifestar nos autos da investigação.
Pressão para afastamento
Em posse dos áudios, vereadores reforçam pedido de afastamento imediato de Zé Carlos e a instauração de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI). A situação de Zé Carlos no comando da Casa está sob risco.
Os áudios divulgados pelo MP têm quase quatro horas de duração e revelam negociação de Zé Carlos e do advogado Rafael Creato, subsecretário de Relações Institucionais da Câmara, com prestadores. As conversas foram gravadas em 2021.
Em um dos áudios, a conversa é com o empresário responsável pelo serviço da TV Câmara de Campinas a respeito de renovação de contrato. “Feche a porta que a conversa vai ser dura”, diz Zé Carlos em um dos trechos. “O contrato da TV Câmara está muito caro. Cinco milhões….Temos quatro meses para fazer a nova licitação. Não vou fazer se você me ajudar. O que podemos melhorar? Temos que dar uma enxugada”, continua o vereador.
Em outro trecho, Zé Carlos cobra o empresário “…Estou dependendo da tua resposta para ver o que a gente faz. Você esqueceu da última conversa?…Se quiser deixar o dinheiro…Estou aguardando você pra gente definir…não tem nada gravando aí, né?”.
Rafael Creato também aparece nos áudios. Na conversa com o mesmo prestador, a negociação segue assim: “então tá na mão do presidente, o que ele precisa decidir é isso. Se ele vai fazer uma nova licitação ou vai decidir pela prorrogação…maio, né? Então, ele queria saber qual seria a contraprestação para manter, o que a empresa pode fazer para ajudar”.
‘QUANTO SE ESTÁ PAGANDO PELO CIMENTO?’
A Câmara de Campinas reagiu com indignação aos áudios. Um grupo defende o afastamento imediato de Zé Carlos e a instauração de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para investigar se há indícios de corrupção em contratos com outras empresas.
“É estranho, por exemplo, a reforma pela qual passa a sede da Câmara”, questiona Nelson Hossri (PSD), mostrando interesse em saber detalhes das negociações envolvendo a prestação do serviço. “Há um bom tempo qu
e a reforma acontece e não vemos uma movimentação de pedreiros. Quanto se está pagando pelo cimento? É importante verificarmos esse e outros contratos para darmos uma satisfação à sociedade.”, diz Hossri.
A reforma no prédio no bairro Ponte Preta teve início no final de abril e a previsão é de que o trabalho seja concluído entre outubro e novembro desse ano. Durante as obras, as sessões estão acontecendo no Teatro Bento Quirino, no Centro.
ARTICULAÇÕES
Hossri e Marcelo Silva (PSD), autor das denúncias ao MP, são os principais articuladores da CEI. Cinco dias depois da investigação ser revelada, com a realização de busca e apreensão na Câmara e em endereços ligados a Zé Carlos por parte do Gaeco no dia 17 de agosto, Silva fez um ostensivo pronunciamento na tribuna. Ele defendeu de forma veemente o engajamento de seus colegas na investigação e pediu o imediato afastamento de Zé Carlos da presidência. Sem sucesso na ocasião, Silva se vê agora fortalecido com a divulgação dos áudios.
“Há um pedido explícito de propina”, diz o vereador. “Se não obtivermos 11 assinaturas, a Casa estará compactuando com o crime”, acredita, indicando o número de assinaturas necessárias para a instauração de uma CEI. “Agora não existe esquerda ou direita”, completa Hossri. “O que existe é escândalo grave”, classifica. “Se a Câmara não se posicionar a favor de uma investigação, pode fechar as portas.”
Ouça mais um dos áudios gravados por fornecedor
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