Outro dia recebi o retorno de uma entrevista que eu tinha mandado as perguntas por áudio. Notei que a pessoa falava tão rápido, sem respirar, dava até agonia de escutar (e eu nem tinha colocado para aumentar a velocidade de reprodução do WhasApp). Comecei a observar que não era só ela que estava acelerada em sua fala. Fui ouvir minhas perguntas e eu também estava no ‘modo acelerado.’
Escutar esse áudio várias vezes para construir o texto me fez lembrar do documentário, disponível na Netflix, Quanto tempo o tempo tem, onde a diretora Adriana Dutra começa narrando que o tempo tem passado tão rápido que ela já deixa até a árvore de Natal montada dentro do armário. Ela segue falando que é como se o tempo tivesse encurtado, ficado mais rápido, tudo sugere velocidade e urgência. Será o tempo ou nós?
Pensando nesse tema fui conversar com a psicóloga Priscila Ribeiro Manzoli para saber se a falta de tempo e essa aceleração das pessoas era uma questão vivenciada dentro do consultório também.
“Nos estamos mais sobrecarregados, não só pelas atividades que temos que fazer, mas também pela quantidade de estímulos que temos respondido. Se olharmos para como era nossa vida há 10 anos atrás, não tínhamos internet disponível 24 horas por dia. Também não havia uma demanda de coisas que acabam aparecendo por conta desse acesso ilimitado a todos nós. Isso acabou ocorrendo após o advento da internet, onde todo mundo está conectado o tempo todo”, diz.
Ela dá um exemplo comum em muitas empresas. “Antes as pessoas terminavam seu dia de trabalho, iam para casa e só no dia seguinte os chefes e seus pares teriam acesso a elas. Hoje em dia esse contato é instantâneo pelo celular ou mesmo por e-mail. E a maioria das pessoas está disponível o tempo todo. Isso acaba deixando as pessoas mais cansadas, porque é muito estímulo o tempo todo”, diz.
A psicóloga diz que observa isso presente na vida de muitas famílias. “Muitas crianças têm uma agenda lotada de atividades, parecida com a do adulto. Isso acaba deixando elas bem sobrecarregadas, cansadas”, destaca.
Mas, a psicóloga aponta um caminho para desacelerar. “É preciso voltar a olhar para o que é valoroso para cada um, o que faz sentido para a sua vida. Quando conseguimos identificar o que é valoroso tentamos levar nossa vida nessa direção”, diz.
Ela destaca ainda que é preciso estabelecer quais são as prioridades e entender que nosso corpo, mesmo sendo parecido com uma máquina, precisa desligar de vez em quando. “Tem que encontrar momentos para descansar, se desconectar desse monte de estímulos e se conectar com o que importa. Fácil não é, mas é possível”, diz.
Kátia Camargo é jornalista e para entrar em harmonia com o tempo tão precioso desacelerou a fala no WhatsApp e buscou na literatura um título que conversa amigavelmente com o tempo: “As coisas que você só vê quando desacelera”, de Haemin Sinim. Mas também buscou na música de Caetano Veloso, Oração do Tempo, um respiro para o dia.