Já se passaram sete meses do dia em que Jaguariúna viveu uma madrugada de terror. Dois cães da raça pit bull escaparam de uma residência e fizeram uma série de ataques a pessoas ao logo de diversos bairros, durante toda a madrugada de 1º de junho. Ao todo, oito pessoas foram mordidas, e a maioria ficou gravemente ferida.
Desde então, os cães permanecem sob os cuidados da Unidade de Vigilância de Zoonoses de Jaguariúna (UVZ), e até o momento não há qualquer perspectiva desses animais retornarem ao antigo dono, ou tampouco a interessados em adota-los.
É que o macho Apolo e a fêmea Bonie, além de outros dois pit bulls que viviam na mesma residência, ainda recebem um intenso processo de reabilitação e ressocialização.
O Hora Campinas foi até a UVZ acompanhar os trabalhos desenvolvidos pelos médicos veterinários da Prefeitura, Paulo Roberto de Almeida Costa e Paloma Klain, e observou tanto a evolução física dos cães, como comportamental. É um trabalho constante de terapia canina e que, segundo os veterinários, pode-se perder o controle a qualquer momento, caso não haja um acompanhamento diário.
“Ainda temos um pouco de dificuldade com a convivência do macho com os outros cães, mas melhorou muito. Com a fêmea foi uma situação mais tranquila, assim como outra mãe com o seu filhote. São animais que hoje passam por uma rotina de treinamento, através de uma série de técnicas”, explicou Almeida Costa, enquanto caminhava com Apolo ao seu lado.
Diante das condições em que os pit bulls chegaram até a UVZ, o veterinário avalia que eram animais que não tinham uma rotina de exercícios adequada, viviam em um local pequeno e que, no caso do Apolo, pode ter sido retirado do convívio com a mãe antes do tempo – o que gerou o comportamento dominante agressivo daquele macho.
“Um animal precisa andar, em média, 20 quilômetros por dia. Precisam de um ambiente onde possam farejar, caçar, brincar. Se o cão fica num ambiente somente cimentado, ele provavelmente será um animal frustrado. Com isso, ele vai querer ir para a rua explorar outros territórios”.
E como sendo o ‘alfa’, acaba levando junto de si o restante da matilha numa fuga como ocorreu, explica.
“Naquela ocasião a outra pit bull não acompanhou a dupla pois estava nos cuidados do filhote que tinha acabado de nascer, senão seriam os três nas ruas”, acredita. Segundo moradores do bairro Nassif, esses mesmos pit bulls já haviam escapado em outras ocasiões e feito outros ataques.
E dessa forma, como saíam para a rua com frequência, o veterinário explica que já haviam marcado território. Naquela madrugada, sob intensa neblina que pairava nas ruas de Jaguariúna, assim que os animais encontravam as vítimas, iam ao enfrentamento, ainda mais pelo fato das pessoas darem as costas e gritarem.
“É um cão altivo, de foco, de caça, ansioso. É possível controlar o temperamento do cão, mas não mudá-lo. É difícil manter a calma numa possível situação de confronto, mas a pessoa numa ocasião dessas, nunca deve ficar de frente ou de costas para o animal, sempre de lado e sem gritar”, ensina Almeida.
Diante desse lamentável episódio, a veterinária Paloma Klain explica que equipe da UVZ direcionou o projeto que trabalha comportamento animal a outros cães que estão na unidade, com o intuito de colocar esses cães para adoção.
“Hoje temos dentro das nossas especialidades uma consulta de medicina comportamental, que estuda a questão dos problemas comportamentais dos cães. Temos tido muito avanços não só com os pitbulls, mas como os outros cães da unidade”, relata a veterinária comportamentalista.
Vítima relata desespero
As dores físicas e os traumas após o ataque ainda abalam uma das vítimas, que preferiu o anonimato ao conversar com a reportagem. Ele foi a penúltima presa dos pit bulls naquela madrugada, e surpreendido na porta de sua casa, no bairro Silvio Rinaldi 2.
“Assim que fechei o portão e me virei eles estavam na minha frente. Me arrastaram para o meio da rua com os dentes rasgando minha panturrilha. Consegui jogar um deles longe quando veio morder meu braço, e fui pular o portão de casa. Nesse momento o outro me puxou pelo pé. Novamente consegui me livrar e pulei pra dentro de casa. Minha roupa foi arrancada do corpo”.
As marcas e as dores estão presentes, sete meses depois. A vítima relata que havia passado por uma cirurgia em um dos joelhos, meses antes do ataque, e que depois dos ferimentos nas pernas provocados pelas mordidas, a locomoção ficou ainda mais difícil.
“Acabo de chegar da UPA (Unidade de Pronto Atendimento), onde tomei duas injeções para aliviar as dores. Não posso fazer fisioterapia, pois passei a ter pressão alta por causa da operação no joelho e das mordidas. Todos ficamos com sequelas”, afirma.
O dono dos animais responde a processo judicial. Ele chegou a ficar preso três dias, e foi liberado. A reportagem do Hora Campinas não o encontrou para comentar sobre o caso.
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