Quem já subiu a Avenida Ayrton Senna da Silva, antiga Avenida dos Esportes, em direção ao Centro de Campinas, certamente já deve ter se deparado com um busto encravado bem no meio da Praça Dr. Antonio Carlos Corsini, a poucos metros de distância do estádio Moisés Lucarelli. O que muitos não sabem é que o monumento representa a figura de um dos mais célebres radialistas do Interior de São Paulo, acima de tudo um torcedor pontepretano fanático: Salvador Lombardi Netto.
O Dia do Radialista é comemorado oficialmente no Brasil neste domingo (7), como forma de homenagem natalícia ao radialista, compositor e músico mineiro Ary Barroso (1903-1964), autor da música “Aquarela do Brasil”. A celebração de 7 de novembro foi instituída pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que sancionou a Lei nº 11.327, de 27 de julho de 2006, alterando a data oficial dedicada aos profissionais da categoria, originalmente 21 de setembro.
Nascido em Campinas, no dia 9 de maio de 1930, Salvador Lombardi Netto trabalhou durante quase duas décadas na antiga Rádio Educadora (PRC-9), atual Bandeirantes, que o contratou como locutor esportivo em julho de 1951, quando ele tinha apenas 21 anos.
Ao longo de sua trajetória de 18 anos na Educadora, Salvador Lombardi Netto chefiou o departamento de Esportes da emissora e apresentou um inesquecível programa matinal diário chamado “A Hora do Trabalhador”, cujo slogan era “Uma hora de alegria para quem sua todo dia”.
“Era um programa de muita audiência em Campinas, talvez uma das maiores na época”, conta o jornalista Ariovaldo Izac, que não chegou a trabalhar com Lombardi Netto, mas era ouvinte assíduo nos anos 60, antes de atuar em diversas rádios da cidade, entre elas a própria Educadora, a partir da década de 70.
Mesmo com várias propostas para se transferir à capital paulista, Salvador Lombardi Netto nunca abandonou a sua terra natal, ao contrário de ilustres colegas conterrâneos como Luciano do Valle e Oliveira Andrade.
“Lombardi Netto foi um dos baluartes para que Campinas chegasse em uma fase decisiva do programa de televisão ‘Cidade Contra Cidade’, que era exibido pela Rede Tupi”, lembra Ariovaldo Izac.
Entre outras atividades que desempenhou, Salvador Lombardi Netto fundou a Associação Campineira de Rádio (ACR) e presidiu a Associação dos Cronistas Esportivos de Campinas (ACEC), além da Liga Campineira de Futebol (LCF). Ele também chegou a integrar a diretoria da Ponte Preta, seu time do coração.
Apesar da incrível coincidência entre os nomes, Salvador Lombardi Netto não possuía nenhum grau de parentesco que se conheça com Luiz Lombardi Netto (1940-2009), célebre locutor de rádio e televisão, que trabalhou durante mais de 40 anos com o apresentador Silvio Santos, primeiro na Rede Globo e depois no SBT.
Salvador Lombardi Netto morreu de forma precoce no dia 8 de setembro de 1969, aos 39 anos, vítima de parada cardíaca, no Hospital Beneficência Portuguesa, em Campinas. Ele deixou a esposa Maria Helena Ganade Lombardi e dois filhos, Maurício e Lílian.
Poucos meses antes da morte de Salvador Lombardi Netto, o filho Maurício havia fundado a Torcida Jovem Amor Maior, primeira organizada jovem do estado de São Paulo, no dia 23 de março de 1969. Pontepretano roxo, paixão herdada do pai, Maurício Antonio Lombardi faleceu em 23 de agosto de 2020, aos 63 anos, vítima de Covid-19. Ele era conselheiro do clube alvinegro.
Os últimos meses de vida de Salvador Lombardi Netto coincidiram com o início da trajetória de Luiz Antonio Piva na Rádio Educadora. Campineiro e pontepretano como Lombardi, Piva é apresentador do programa de rádio mais antigo de Campinas, “A Grande Parada”, que está no ar ininterruptamente há 52 anos, sempre na voz dele. A atração começou a ser transmitida na Rádio Educadora em 1969, inicialmente aos domingos, das 8h às 13h, e migrou em 1980 para a Rádio Brasil Campinas, onde continua até hoje, aos sábados, das 12h às 13h30.
“Em janeiro de 1969, ao chegar na PRC-9, fui recebido por Luciano do Valle, que me levou até Lombardi Netto. Eu disse que gostaria de ser locutor da emissora. Quem gravou o meu teste foi o chefe técnico Antonio de Almeida, o Toninho, que chamou Lombardi para ouvir a gravação. Logo no dia seguinte, fui chamado e já apresentei o programa esportivo ‘Novidades Esportivas Antarctica’. Quem me promoveu foi Lombardi Netto”, revela Piva.
“Eu entrei na Educadora como locutor comercial no dia 2 de janeiro de 1969. Com a morte de Lombardi Netto, ganhei ‘A Grande Parada’, que na verdade se chamava ‘As 50 Mais da Semana’, mas pedi autorização para mudar o nome ao diretor artístico Carlos Guedes de Oliveira, que aceitou. Comecei a apresentar o programa num domingo, dia 7 de setembro, que coincidentemente também é a data que marca a minha passagem para a Rádio Brasil, em 1980″, explica Luiz Antonio Piva.
“Dos meu colegas daquela época de Educadora, apenas Oliveira Andrade, Pereira Esmeriz e José Célio de Andrade, que comandava o esporte da PRC-9 ao lado de Lombardi Netto, continuam vivos. Nós éramos em 53 funcionários e todos os outros já morreram”, lamenta Piva.
Inauguração do busto
Cerca de seis meses após a morte de Salvador Lombardi Netto, o busto do radialista foi inaugurado na manhã de um domingo, 25 de janeiro de 1970, em uma grande e comovente solenidade na Avenida dos Esportes, que tinha esse nome pois liga o estádio Brinco de Ouro ao Moisés Lucarelli. A festividade contou com a presença de familiares e amigos do falecido radialista, além de autoridades públicas, dirigentes e jogadores da Ponte Preta, jornalistas e populares emocionados.
Além do busto, Salvador Lombardi Netto dá nome à cabine de imprensa do estádio Moisés Lucarelli, a uma praça no Jardim Eulina, próxima ao CT da Ponte Preta, e a uma rua na Vila Teixeira. As homenagens não se restringem apenas a cidade de Campinas. Também há vias com o nome do radialista em Paulínia, Sumaré e até em São Paulo, no bairro Carandiru, a pedido do lendário radialista e locutor esportivo Fiori Gigliotti.
O evento foi aberto com uma apresentação da Banda da Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx), seguido por uma revoada de pombas que deu um toque de beleza e ternura à homenagem. Mais tarde, pétalas de rosas foram arremessadas por um avião do Aeroclube de Campinas.
Houve vários discursos, entre eles do grande amigo Lauro de Moraes Filho, ex-presidente da Ponte Preta, que pertencia à comissão organizadora da cerimônia, além do radialista Pedro Azevedo, orador oficial da solenidade, que ressaltou a personalidade e o espírito filantropo de Lombardi Netto.
Outro importante nome da história do rádio campineiro, também apaixonado pela Ponte Preta, Sérgio José Salvucci dá nome a uma praça que fica ao lado do estádio Moisés Lucarelli.
O momento mais emocionante ficou por conta da singela participação dos dois filhos de Lombardi, que descobriram o busto produzido pelo escultor italiano Lélio Coluccini, radicado em Campinas. “Ao Cidadão Salvador Lombardi Netto, coração sempre voltado aos necessitados, a homenagem de seus amigos e de Campinas, cidade que tanto amou”, dizia a placa, que foi roubada, logo abaixo do busto que resiste há pouco mais de meio século.