Fundada no dia 14 de julho de 1774, Campinas viveu inúmeras histórias gloriosas e charmosas. Um desses momentos ocorreu quando o município teve destaque no automobilismo nacional e internacional na década de 1930, realizando a Volta do Chapadão, a primeira corrida oficial e profissional de automóveis no estado de São Paulo.
Quem teve papel fundamental nisso foi o prata da casa Benedicto Moreira Lopes. Conhecido como “Campineiro Voador”, ele nasceu no dia 11 de novembro de 1904, começou a trabalhar em oficinas mecânicas ainda jovem, consertando alguns dos poucos carros que circulavam pela cidade, até que conheceu o comendador Dante di Bartolomeu e sua vida mudou.
“Trabalhando na oficina, Benedicto Lopes consertava carros de passeio e também era responsável por consertar os carros de corrida de Dante di Bartolomeu, dono da equipe Excelsior. Em um desses momentos, Dante di Bartolomeu viu a habilidade de Benedicto para conduzir um carro e o convidou para começar a disputar corridas na sua própria escuderia”, conta o historiador e pesquisador Ronaldo Moreira.
“A primeira etapa que Benedicto Lopes correu foi em 1934, no Circuito da Gávea, no Rio de Janeiro, com uma Bugatti emprestada. Ele não concluiu a corrida, mas mostrou muito empenho e capacidade. A partir daí, ele ingressou de vez no mundo do automobilismo, tanto que em uma determinada época ele teve uma oficina em Campinas e outra no Rio de Janeiro”, completa Ronaldo Moreira.
Em 1935, inserido de vez no mundo do automobilismo, Benedicto Lopes participou, ao lado de políticos e empresários de Campinas, da organização da Volta do Chapadão, a primeira corrida de automóveis realizada na cidade e no estado de São Paulo, ainda nas ruas de terra vermelha que nem imaginam receber uma camada de asfalto um dia.
O campineiro competiu na Volta do Chapadão, mas ela foi vencida por Chico Landi, que curiosamente corria pela equipe Excelsior de Dante di Bartolomeu.
“Benedicto Lopes foi consultado na construção de todo esse circuito do Chapadão para definir o trajeto que tinha aproximadamente 11 km de extensão, largando próximo ao Castelo e passando pela região do Guanabara. Tudo isso teve dedo do Benedicto. Ele que colocou Campinas no mapa do automobilismo, já que na época ainda não existia o Autódromo de Interlagos em São Paulo”, destaca Ronaldo Moreira.

Mesmo ainda sem existir a Fórmula 1 nessa época, que atualmente representa o mais alto nível do automobilismo mundial, pilotos internacionais de países como Itália, Portugal e Inglaterra vieram até Campinas participar da Volta do Chapadão.
“Normalmente, os pilotos internacionais vinham para o Rio de Janeiro e competiam na cidade onde tudo era badalado e que também tinha a parte boêmia. Os pilotos ficavam ali algumas semanas ou meses e depois vinham para Campinas. As corridas em Campinas normalmente eram no mês de setembro. Depois daqui, eles partiam para Buenos Aires, na Argentina, e também iam para outros países” explica o historiador.
Em 1936, a Volta do Chapadão não foi realizada, mas houve corrida no Brasil, em Poços de Caldas. Em 1937, a prova campineira voltou com tudo, e Benedicto Lopes foi o vencedor, acelerando pelas ruas da cidade onde nasceu, foi criado e morava.

“Esse evento de 1937 teve o dedo do Benedicto Lopes também para promover politicamente o prefeito da época que inaugurava a caixa d’água do Castelo. Era um loteamento novo na parte nova da cidade e eles promoveram a corrida justamente para enaltecer essa obra pública que estava acontecendo”, conta Ronaldo, que restaurou a taça conquistada pelo piloto campineiro na Volta do Chapadão de 1937.
Vencedor da corrida de 1937, Benedicto Lopes foi premiado com um valor em dinheiro pago por uma empresa e pela Prefeitura. Além disso, a Prefeitura ofereceu como prêmio para os três primeiros colocados um terreno no loteamento do Chapadão, que estava surgindo na época.
Oportunidade fora do Brasil
No auge da carreira, também em 1937, mas antes da vitória na Volta do Chapadão, Benedicto Lopes liderou a 5ª volta do GP Cidade do Rio de Janeiro, no Circuito da Gávea, e foi convidado para disputar duas corridas em Portugal. Ele não se intimidou, colocou seu carro em um navio e partiu para Europa para ser o segundo brasileiro a disputar provas de automobilismo fora do território nacional.
Na primeira, o VI Circuito de Vila Real, o piloto campineiro ficou com o terceiro lugar em uma corrida que contou com nove participantes e foi vencida por Vasco Sameiro. A segunda prova foi o III Circuito do Estoril, e Benedicto terminou na segunda colocação. A disputa teve apenas cinco participantes e foi vencida por Manoel de Oliveira.

Em meio ao sucesso no automobilismo nacional e internacional, Benedicto Lopes sofreu com um problema de saúde na perna. O piloto ficou afastado das corridas, mas continuou a vida como mecânico. Veio a 2ª Guerra Mundial, e o automobilismo se tornou quase inexistente em todos os países, principalmente no Brasil.
Depois da Guerra, em 1947, 1948 e 1953, ocorreram três outras edições da Volta do Chapadão, onde Benedicto voltou a pilotar, mas sem grande destaque. “Ele teve participações esporádicas e pouco expressivas, mas era um baluarte da cidade que todo mundo respeitava”, define o historiador Ronaldo Moreira.

Final da carreira
Em 1954, Benedicto Lopes disputou sua última corrida, o III Circuito do Maracanã, no Rio de Janeiro. Aos 49 anos, pilotando a Maserati 6CM, conquistou a vitória e encerrou a carreira. Fora das pistas, o brasileiro voltou a Campinas para trabalhar novamente com oficina mecânica.
No final da vida, o ex-piloto campineiro trabalhou na Cacique Veículos, uma concessionária Volkswagen que ficava na Avenida Imperatriz Leopoldina. Lá, sua função era levar e trazer clientes que deixavam o carro para revisão. Benedicto faleceu em Campinas no dia 9 de agosto de 1989, aos 84 anos.
*Algumas informações foram extraídas do portal Bandeira Quadriculada e também cedidas gentilmente pelo historiador Ronaldo Moreira.