Por trás da ascensão da seleção colombiana feminina de vôlei, que derrotou o Brasil no Sul-Americano e se classificou pela primeira vez ao Campeonato Mundial, está o técnico Antonio Rizola Neto. Garimpar jogadoras e renovar elencos são estratégias que o transformaram em um treinador vitorioso, tanto no Brasil quanto na Colômbia, onde trabalha desde 2016. O curioso é que todos esses títulos passam, necessariamente, pelo Guarani, clube que o lançou ao mundo do vôlei.
A história de Rizola começou a ser contada em quadras bugrinas no ano de 1979, quando o Brasil, assim como ele, despertava para o vôlei. Rizola foi recrutado pelo então técnico Antonio de Pádua Báfero para ser preparador físico das equipes femininas do Guarani, onde permaneceu até 1986.
Aquele aluno do segundo ano da Faculdade de Educação Física da PUC-Campinas, que ingressou no Guarani há mais de quatro décadas, somou conquistas ao longo da vida profissional. O vôlei se transformou, as regras mudaram algumas vezes, mas a relação de carinho de Rizola com clube de Campinas se mantém até os dias de hoje.
Os laços de amizade com técnicos e ex-jogadoras do Guarani avançaram nos anos. Rizola expressa clareza nas memórias. Descreve com exatidão todos os eventos que impulsionaram sua carreira a partir da oportunidade dada por Pádua e dos conselhos recebidos de outro técnico bugrino, Renato Petta, pessoas destacadas por suas declarações.
Natural de Itapira, o treinador chegou ao Guarani aos 21 anos. Não demorou até que assumisse as equipes de base e conquistasse, em 1980, os campeonatos Paulista do Interior e Estadual infanto-juvenil, com uma equipe liderada pela então promessa do vôlei Vera Mossa. Mais títulos estaduais vieram até 1986, quando encerrou seu trabalho no Guarani para iniciar outro no time masculino campineiro da Lojicred. De novo, Rizola recebeu a tarefa de comandar uma promessa do esporte nacional, no caso, o levantador Maurício.
“Só uma relação especial, como a que tive com o Guarani, poderia durar mais de 40 anos.”
“Tudo o que passei em Campinas foi especial, tanto, que guardo muito carinho pelo Pádua, pelo Petta e pelas ex-jogadoras. Nos falamos até hoje por um grupo de WhatsApp e quando é possível nos vemos. Se não fosse especial, não iria durar tanto tempo”, assegura, com a voz ainda rouca, quatro dias após a vitória sobre o Brasil, que rendeu o vice-campeonato sul-americano e trouxe a confirmação da vaga no Mundial de 2022.
Pádua e o Guarani lançaram Rizola para uma trajetória de sucesso, que teve também momentos esquisitos, como sua dispensa vagamente justificada pela Confederação Brasileira de Vôlei. O treinador passou por clubes como o Santos, São Caetano, Ribeirão Preto e MRV, e depois foi reencontrar Vera Mossa na Itália para, juntos, conquistarem o título europeu de clubes, em 1994, pelo Ecoclear/Palavollo.
Foram cinco anos na Europa, entre 1992 e 1997. Neste período, já trabalhava com as seleções brasileiras de base. Também tinha atuado como auxiliar de Wadson de Lima na seleção brasileira principal e ficado em quarto lugar na Olimpíada de Barcelona/92.
O trabalho de Rizola com a base do Brasil merece adendo. Desde 1989, os times de baixo do vôlei feminino brasileiro não conquistavam um título mundial, jejum que acabou em 1999, com direito a bis em 2001 e repeteco em 2005, só para citar as conquistas mais importantes.
“Minha proposta era ir atrás de talentos, reestruturar a base, e comecei esse trabalho em 1998 na CBV”. A empreitada de renovação rendeu ao vôlei nomes como os de Sheila, Paula Pequeno, Sassá, Fabíola, Taíssa, Adenízia, Fernanda Garay – uma geração de ouro. “Foi um período excepcional. Eu e o Luizomar (Luizomar Moura, técnico), nos revezávamos no comando das seleções infanto e juvenil do Brasil, alternando uma geração com cada treinador”, recorda.
“Não guardo mágoas e nunca faria avaliações sobre o atual momento do vôlei do Brasil. Hoje sou técnico da Colômbia.”
Elevado à gerente de seleções do Brasil, e após o vôlei brasileiro ganhar ouro e prata na Olimpíada de Londres/2012, com o feminino e masculino, respectivamente, Rizola foi dispensado pela CBV. Sem mágoas, assegura ele. “Fui pego de surpresa, tudo o que perguntei foi se minha dispensa era por deficiência profissional, o que garantiram não ser”.
Que venha a Colômbia!
Depois de várias tentativas, a federação Colombiana recebeu um sim de Rizola ao convite para assumir o projeto do vôlei feminino do país. A meta proposta era chegar pela primeira vez à Olimpíada, no Projeto Paris/2024. Na metade do caminho, veio a inédita vaga no Mundial.
“Neste Mundial, a Colômbia será a única seleção estreante entre os 24 classificados da competição”, observa o técnico.
Em 2016, ao iniciar seu trabalho, a Colômbia era 28ª colocada no ranking da Federação Internacional de Vôlei – hoje é a 16ª. No top 20 feminino da FIVB só há dois países sul-americanos: Brasil e Colômbia. Peru e Argentina ficaram para trás.
Colocar as colombianas no mapa, explica Rizola, exigiu mudança de estilo. “A Colômbia tinha como característica o voleibol de força, mas minha proposta era criar um time técnico”. Mais uma vez, Rizola foi em busca de talentos. “Saí pelo país assistindo jogo e treino em todos os lugares. É importante destacar que a Colômbia já possuía um trabalho quando cheguei, precisávamos ampliar o que já existia”.
“A mesma liberdade que tive para trabalhar com as seleções do Brasil eu tenho para trabalhar hoje na Colômbia.”
Com apenas três meses de trabalho desse grupo renovado, a Colômbia venceu a Copa Pan-Americana infanto-juvenil. A atual seleção colombiana possui várias jogadoras lançadas ao vôlei no infanto-juvenil por Rizola. A média de idade do time que bateu o Brasil é de 22 anos. A jogadora mais velha tem 24 anos. É o projeto Paris/2024, com fôlego para avançar até Los Angeles/2028.
Rizola chegou sozinho para trabalhar na Colômbia. Hoje tem um staff na seleção formado por 11 profissionais, como no Brasil. Há médicos, nutricionistas, psicólogos, preparadores físicos e auxiliares à disposição do time, todos colombianos. Ao mesmo tempo em que tenta aplicar uma nova característica ao jogo colombiano e descobrir novos valores, cuida de formar os formadores.
O momento de descoberta do vôlei por um país, vivido quando começou a trajetória no Brasil, se repete agora na Colômbia.
“O país abraçou o vôlei, como ocorreu no Brasil na década de 1980. Quando cheguei, ninguém sabia quem eu era, hoje, o taxista me reconhece, porque a Colômbia reconhece o vôlei”, detalha.
Para quem ainda acha que a derrota do Brasil para a Colômbia no Sul-Americano foi zebra, ou interferência da torcida da casa, fica a dica estatística: o placar dos últimos três duelos entre Brasil e Colômbia é de 2 a 1 – para a Colômbia.