No dicionário acolher significa dar ou receber refúgio, abrigo ou proteção. Um belo exemplo desta definição é da Majory Vieira Santa Maria, 47 anos, professora, mãe de três filhos biológicos, com idades entre 23 e 25 anos, e que resolveu realizar o sonho de ser uma família acolhedora. Até hoje já passaram por sua casa 12 crianças, sendo que a mais nova tinha apenas 10 dias de vida e a maior 6 anos. No momento eles estão cuidando de uma menininha que chegou em dezembro e está com 6 meses.
“Eu não embarquei sozinha neste sonho. Somos uma família acolhedora há sete anos, pelo ConViver. Tudo começou quando eu assisti a uma reportagem na TV sobre famílias acolhedoras, há muitos anos. Na época, eu fiquei bastante impactada pela matéria, mas meus filhos ainda eram bem pequenos, então, deixei guardado esse sonho por um tempo. Quando cresceram, conversei com meu esposo e filhos e todos toparam”, conta Majory sobre o processo de acolhimento familiar, que consiste em medida protetiva excepcional e temporária com prazo determinado, empregada para acolher crianças e adolescentes em situação de risco social em uma família, até o retorno à família de origem, encaminhamento para família extensa ou adoção.
Ela destaca que sempre gostou do papel de mãe e cuidadora: “Seguir cuidando, além de cuidar dos meus filhos, sempre foi algo muito importante. Quando recebemos uma criança, ela passa a fazer parte da família no período que está conosco. Acredito que ajudamos a reescrever a história dela, com capítulos mais amorosos e felizes a partir do dia que a recebemos em casa”.
Majory sempre é questionada sobre como faz para lidar com as despedidas. “Eu tenho plena consciência de que o meu papel é cuidar, e o cuidado faz parte do entregar também. Cuidar é a palavra-chave, e junto vem amar e deixar ir quando é hora”, diz.
Mas para além desse aprendizado, ela também relata que no começo foi difícil lidar com a dor da separação e do silêncio: “Hoje temos consciência de que vamos sentir saudades, até choramos, mas sabemos que está tudo bem e que faz parte do processo. O mais importante é que nossa família caminha junta nessa missão. Sabemos que fizemos o melhor para aquela criança no período em que ela esteve conosco”.
“Assim que a criança chega, começamos a montar um álbum de fotos registrando sua história, contando detalhes de quando nasceu o primeiro dentinho, quando começou a engatinhar, os primeiros passinhos, as primeiras palavras, o que gosta de comer, de brincar. Tenho a grande bênção de ter contato com boa parte das famílias das crianças que moraram em casa. Algumas eu vejo pessoalmente. Nós somos até padrinhos de um deles, com outros falamos por WhatsApp, recebo vídeos, vou nos aniversários, mas respeito o limite da família e eles respeitam o nosso”, diz.
Ela conta ainda que para quem sonha em ser uma família acolhedora é importante buscar informações de como funciona, sem medo. “É muito mais gratificante do que se possa imaginar. Não estamos sozinhos nesta jornada, recebemos apoio para lidar com cada etapa, desde a chegada até as despedidas”.
Campinas é referência no acolhimento familiar
Campinas é referência no acolhimento e realiza o serviço de acolhimento familiar desde 1997. A cidade oferece dois serviços: o Serviço de Acolhimento e Proteção Especial à Criança e ao Adolescente (Sapeca), vinculado à Secretaria de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos, e o ConViver, executado pela OSC Guardinha em parceria com a Prefeitura.
Desde 2005, a Fundação FEAC investe na promoção do serviço de acolhimento familiar em Campinas.
Hoje ela participa do Grupo de Trabalho (GT) do Serviço de Família Acolhedora em parceria com a Secretaria de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos e a Secretaria de Comunicação e do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).
Como ser uma família acolhedora?
Para quem deseja ser uma família acolhedora, o primeiro passo é participar de uma de uma reunião informativa. A exemplo do ConViver, a equipe apresenta o que é o acolhimento familiar, como funciona e quais são os passos e a documentação necessária para conseguir uma habilitação. Depois, é feita uma visita domiciliar para saber como é a estrutura da casa da família.
“Em linhas gerais, a pessoa precisa morar em Campinas, ter mais que 18 anos, não estar na fila de adoção. Além disso, todas as pessoas que moram na casa precisam estar de acordo e participar de todo o processo de preparação”, conta Mariana Martins Alves Alcantara, coordenadora de projetos sociais na Guardinha e no ConViver.
A coordenadora também aponta que é muito importante para a criança ser recebida por uma família acolhedora. “Uma criança quando está em uma família acolhedora tem o cuidado basicamente exclusivo. Já para uma criança na modalidade coletiva, que seria os abrigos e casas-lares, muitas vezes é mais difícil receber o olhar mais atento para suas demandas, por mais que a equipe esteja sempre atenta. O cuidado individual contribui muito com a evolução da criança e em seus marcos de desenvolvimento. A família acolhedora ajuda a ressignificar a violação que a criança sofreu. Percebemos na prática a importância deste serviço para as crianças”, destaca Mariana.
Tem interesse em se tornar uma família acolhedora?
Entre em contato com a equipe do programa de acolhimento ConViver por meio dos números (19) 99368-1440 ou (19) 3772-9699 – ramal 9697. Ou acesse o site: guardinha.org.br/conviver.
Também é possível entrar em contato com o Sapeca por meio dos telefones (19) 3256-6067 e (19) 3256-6335. Para saber mais acesse: https://sapeca.campinas.sp.gov.br/.
Kátia Camargo é jornalista, mãe por adoção do Marcos Thiago que está com 14 anos e ao conhecer a história da Marjory e sua família acolhedora lembrou muito da canção do Jota Quest, Daqui só se leva o amor: