A crise migratória nos Estados Unidos infiltrou-se na campanha eleitoral e Donald Trump quer aproveitar o tema para tentar derrotar o democrata Joe Biden, radicalizando a posição dos republicanos contra uma solução bipartidária.
Perante uma crise migratória crescente nas fronteiras com o México, que foram atravessadas por cerca de três milhões de imigrantes apenas no ano passado, a Casa Branca decidiu endurecer as medidas de controle, mas sem conseguir cativar a aprovação dos norte-americanos, nem suavizar a contestação do Partido Republicano.
A partir do verão do ano passado, o problema se tornou um verdadeiro pesadelo político para o presidente Joe Biden, à medida que o previsível vencedor das primárias republicanas, Donald Trump, voltou a usar o tema como bandeira de campanha.
O problema se agravou para a Casa Branca quando os republicanos decidiram condicionar a continuação da aprovação pelo Congresso da ajuda financeira e militar à Ucrânia, na sua resistência à invasão russa, a um significativo reforço do controle das fronteiras com o México.
Os republicanos argumentam que ambos os temas têm a ver com a segurança interna dos Estados Unidos, mas rapidamente ficou visível que a posição da maioria na Câmara de Representantes estava relacionada com a pressão exercida por Donald Trump para obter uma poderosa arma política contra Biden.
Vários congressistas republicanos da ala mais radical, próximos de Trump, começaram então a repetir que o país “está a ser invadido na fronteira sul”, para argumentar a favor de mais investimento federal na fronteira com o México.
Os democratas ficaram realmente alarmados quando, em setembro passado, a Câmara de Representantes inviabilizou um novo pacote de ajuda à Ucrânia, alegando falta de compromisso da Casa Branca no reforço da política migratória.
Biden tinha apostado muito do seu prestígio e popularidade no apoio à Ucrânia, e o impasse o deixou fragilizado nas suas esperanças de reeleição nas eleições presidenciais americanas que irão ocorrer em 5 de novembro.
Em resposta, a Casa Branca aceitou ligar os dois temas, procurando anular o plano dos republicanos, ao mesmo tempo que um maior esforço de investimento nas fronteiras lhe permitia resolver um problema que se adensava rapidamente, com o aumento significativo de imigrantes ilegais nas fronteiras com o México.
Contudo, a anuência de Biden caiu mal em vários setores do seu Partido Democrata, em particular mais à esquerda, que reclamaram que o presidente estava se vendendo aos interesses dos republicanos, sobretudo num tema tão sensível como o da imigração.
O principal ponto onde Biden cedeu foi no aumento das exigências para a obtenção do estatuto de asilo, com os republicanos alegando que muitos dos migrantes estão pedindo essa condição sem realmente merecer, não havendo sequer risco de perseguição nos seus países de origem.
Outro ponto foi aumentar a construção de infraestruturas para deter imigrantes ilegais, uma antiga exigência dos apoiantes de Trump, que defendem o reforço da capacidade das autoridades procederem ao repatriamento de muitos dos migrantes.
Biden cedeu ainda na criação de limite para o número de imigrantes que diariamente chegam aos Estados Unidos: se esse número exceder cinco mil, as fronteiras fecham-se automaticamente (no ano passado, a média de entradas chegou a ultrapassar os oito mil).
Estas medidas estão muito longe do posicionamento dos democratas na política de migração, mas Biden apareceu perante o Congresso justificando a gravidade da situação nas fronteiras, procurando apelar a um entendimento entre os dois partidos.
O recém-eleito líder da maioria republicana na Câmara de Representantes, Mike Johnson, visitou a fronteira no início deste ano e disse que havia uma “verdadeira situação de emergência”, subindo o parâmetro das exigências para haver um entendimento no Congresso.
Nos comícios para as primárias, Trump apareceu dizendo que o acordo entre os dois partidos não servia os interesses dos republicanos, acusando os democratas de não saberem lidar com o problema da imigração ilegal.
Falta agora saber se a maioria republicana na Câmara de Representantes se mantém unida ou se prevalece a facção moderada que já se tinha entendido com os democratas na procura de uma solução para o duplo problema: o financiamento da Ucrânia na resistência à invasão russa e o controle das fronteiras perante a crise migratória.
(Agência Lusa)