Não deixe o samba morrer/ Não deixe o samba acabar/ O morro foi feito de samba/ De samba para gente sambar. É cantando os versos da canção Não Deixe o Samba Morrer, de Alcione, que Lídia de Andrade, 82 anos chega toda animada para conversar.
Além de soltar a voz, ela arrisca alguns passos de samba, antes de contar sobre como tem sido participar do projeto Nossas Gerações, que ocorre toda semana em quatro Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPI), de Campinas.
“Eu sempre gostei de música e da cantora Alcione. Desde que começou o projeto não falto um dia. Eu canto, eu danço, gosto de tocar pandeiro e arrisco tocar alguns dos instrumentos que o professor constrói com sucatas e materiais recicláveis e apresenta para gente. Também tento animar as outras participantes”, conta Lídia, que vive desde 2021 na instituição.
“As músicas tocam o nosso coração, resgatam lembranças de fases da nossa vida, umas boas e outras nem tanto, mas que são parte importante da nossa história. Esse encontro aqui, no Lar da Amizade, é muito esperado por todas nós”, diz.
Atualmente moram 35 mulheres, entre 64 e 98 anos, no Lar da Amizade Ilce da Cunha Henry. O local foi pensado para ser o mais acolhedor possível. O espaço lembra uma casa de vó, com várias plantas espalhadas pelos cômodos, flores, toalhinhas de mesa e um quintal com árvores frutíferas.
Parte das moradoras tem dificuldades de locomoção, até mesmo algumas são cadeirantes. Há também aquelas com doença de Alzheimer ou demência vascular, e esse trabalho com música e instrumentos musicais tem ajudado a fortalecer o convívio entre elas.
“Percebemos que a música traz um lindo resgate de vida e conexão com as histórias delas. Elas gostam muito de participar, se divertem e também se emocionam bastante”, conta Margareth Barbosa, coordenadora do Lar da Amizade.
O Projeto Nossas Gerações faz parte do Programa Acolhimento Afetivo da Fundação FEAC (Federação de Entidades Assistenciais de Campinas) e, além do Lar da Amizade, acontece semanalmente no Lar São Vicente de Paulo, no Lar Alice de Oliveira e na Afascom.
As atividades são conduzidas pelo músico, compositor e professor Ricardo Botter Maio, criador do projeto Pequenos Contos Sonoros. Ele ensina a transformar sucata e material reciclado em instrumentos musicais surpreendentes.
Para os encontros, Ricardo também leva alguns instrumentos tradicionais, como violão, ukulele, sanfona e piano, para complementar as melodias.
Rebeca Silva, analista de projetos do Programa Acolhimento Afetivo da Fundação FEAC, conta que os retornos sobre o projeto das quatro instituições de longa permanência de idosos têm sido extremamente positivos. Ela destaca o poder da música ao contar o caso de uma senhora que tem a doença de Alzheimer e relembrou como tocar acordeão durante a oficina.
“Esse projeto consegue mobilizar e unir os idosos que moram nesses locais, ajudando a promover uma convivência mais próxima entre eles e fortalecendo os vínculos. É também muito inclusivo, pois mesmo as pessoas que têm movimentos mais limitados são convidadas a participar pelo professor Ricardo, que tem um olhar muito sensível e cuidadoso com todos. A música consegue acessar nossa subjetividade de uma maneira muito especial e isso traz à tona muitas memórias, como foi o caso da senhora que tocou acordeão”, destaca Rebeca.
Para o professor Ricardo, a experiência tem sido surpreendente.
“Já trabalhei com musicalização em sucata em outras instituições de Campinas, mas com idosos é a primeira vez. Procuro trazer canções conhecidas e eles também pedem músicas que gostam. Além disso, são muito disponíveis para tocar instrumentos não convencionais, feitos com objetos como garrafão de água, tampas, garrafas plásticas, isopores e tubos de PVC”, destaca.
Kátia Camargo é jornalista e ficou encantada com o poder da música de conectar as pessoas. Uma das músicas que fizeram parte da oficina e emocionou muito as participantes foi “Que Beijinho Doce”, das Irmãs Galvão.
Para ouvir a música: