Um sonho perturbador interrompeu o estado de alegria da campineira Karin Rachel Aranha Mohamed Fayz dias antes de seu retorno ao Brasil. Após passar dez meses em Londres, na Inglaterra, a trabalho, ela contava as horas para rever o filho Adam, de três anos, que durante o período ficou com o pai no apartamento alugado da família no bairro São Vicente, em Campinas. No entanto, em uma noite de sono, a ocorrência de um fato parecia real: “Eu procurava meu filho pelo condomínio em que morávamos. Procurava e não o encontrava”, conta Karin.
“Quando acordei daquele pesadelo, procurei acalmar meu coração com um salmo”, completa a mulher sem imaginar que, dias depois, a história do sonho se repetiria com doses dramáticas, no tempo e no espaço. “É difícil falar, só penso no meu filho, mas tenho fé que o Adam estará de volta”, diz Karin, que desde o último dia 21 tenta se recuperar emocionalmente na Casa de Apoio Dr. Klaus Werner.
Um dia antes, ela retornou ao Brasil e encontrou o apartamento vazio, depredado e sujo. “As roupas do Adam também não estavam lá, nem meus documentos. O dinheiro que eu tinha no banco sumiu”, conta. “Ele levou tudo e ainda deixou dívida”, completa, referindo-se ao marido e também pai da criança, o egípcio Ahmed Tarek Mohamed Fayz, que está com o filho do casal, no Egito.
MENSAGENS E VÍDEOS
Dois dias depois do desembarque no Brasil, Karin recebeu uma mensagem de Ahmed. No texto, ele afirma que havia chegado ao Egito e que Adam estava bem.
Diz ainda que ela é bem-vinda na casa da família dele para ver o filho quando quisesse e que o casamento havia terminado.” Segundo Karin, todos os dias Ahmed envia vídeos da criança e, pelas imagens, ela diz ter certeza que eles estão no país africano, na cidade do Cairo. “Me pergunto todos os dias o porquê dele ter feito isso”, questiona Karin.
INVESTIGAÇÃO
Ao mesmo tempo em que chora a ausência do filho, Karin também luta para tê-lo de volta. Quando retornou ao Brasil, ela acionou a polícia. Antes de se ter conhecimento de que o egípcio e a criança estavam no Egito, buscas foram feitas em locais onde possivelmente os dois pudessem estar. Segundo Karin, brinquedos de Adam foram encontrados em uma Mesquita em Campinas. O caso está nas mãos da Polícia Federal.
Os dois advogados que acompanham o caso questionam as autoridades a respeito da saída de Ahmed e Adam do Brasil. “Eles só poderiam ter viajado com uma autorização expressa da mãe no passaporte ou em posse de um consentimento judicial por parte dela”, esclarece o advogado Humberto Carvalho Terraciano.
“Só que ninguém responde de fato como que eles conseguiram sair do país. A Polícia Federal empurra para o Ministério da Justiça e não nos oferece uma prova de que a viagem aconteceu por via aérea. Já o Itamaraty lavou as mãos”, lamenta Terraciano.
A mãe mostra inconformismo. “Eu quero que as autoridades brasileiras tragam Adam de volta porque foi um erro das autoridades”, esbraveja. Para ela, visitar o filho no Egito está fora de cogitação. “Temo pela minha vida, pois sei que nesse país mulheres desaparecem”, justifica.
Karin classifica o caso como sequestro e hoje acredita que o plano do crime começou quando ela viajou para a Inglaterra. “Essa viagem foi ideia dos pais dele, que inclusive enviaram o dinheiro”, conta.
COMO TUDO COMEÇOU
Ahmed e Karin se conheceram pela internet em 2017. “Nós tínhamos um amigo em comum”, conta a mulher, que chegou a morar no Egito. Ela diz que a convivência com Ahmed no país africano antes do casamento sempre foi boa. “A minha sogra que era contra o relacionamento”, afirma.
No Brasil, onde casaram, Karin começou a perceber alterações no comportamento do companheiro. “Cheguei a ser agredida. Ele passou a ter comportamentos machistas. Mas eu sempre relevava e achava que iria ter mudanças. Hoje vi que fui ingênua”, recorda.
O filho Adam nasceu nos Estados Unidos, segundo Karin, a pedido do pai. “Ele dizia que no Brasil criança não tinha oportunidade e fui sozinha para Nova Jersey. Mas depois de 40 dias voltei”, conta Karin.
De acordo com a campineira, Ahmed sempre demonstrou ser um bom pai. Lutador de judô, o egípcio, que é muçulmano, também trabalhava como garçom em Campinas. O sonho do casal era morar nos Estados Unidos com o filho.
Hoje, na Casa de Apoio, Karin tem a companhia de uma tia e das lembranças dos bons momentos com Adam. Aos 41 anos, ela tenta reconstruir a vida.