O Projeto de Lei que propõe a redução de jornada de trabalho para servidores que têm dependentes com deficiência é alvo de polêmica em Campinas.
Um grupo de funcionários da Prefeitura se contrapõe às bases do PL de autoria do prefeito Dário Saadi, que sugere uma redução de 16% na carga horária.
A reivindicação é por uma redução entre 30% a 50%, como aponta a legislação federal. O PL está em análise na Câmara Municipal desde agosto e ainda não tem data para votação.
“Entramos com uma denúncia coletiva, com seis assinaturas, no Ministério Público de São Paulo e no Ministério Público do Trabalho em função do descumprimento da legislação federal em Campinas”, diz a professora de Arte da rede municipal Flávia de Moraes Franklin, de 47 anos.
Com dois filhos que requerem cuidados especiais, ela integra um movimento que luta pelos direitos dos servidores que têm dependentes com deficiência.
O coletivo, denominado “Você Minha Dupla”, tem conversado com vereadores para propor mudanças no PL, que já recebeu a sugestão de dez emendas do grupo. Uma audiência pública sobre o assunto também já foi realizada na Câmara no último dia 23 de setembro.
Flávia conta que a controvérsia com a Prefeitura dura desde 2016, quando entrou em vigor a legislação federal. “Requerimentos são encaminhados e indeferidos, isso quando não ficam parados na Administração”, afirma. Ela lembra que desde o final de 2022 o Superior Tribunal Federal (STF) reiterou que estados e municípios sem leis específicas sobre o assunto sigam os critérios estabelecidos pelo dispositivo de autoria do ex-jogador Romário aprovado por deputados e senadores há sete anos.
Em Campinas, a professora diz que alguns servidores precisaram entrar com ações na Justiça e, mesmo com as causas ganhas, encontram dificuldades em ter o direito cumprido junto à Administração. “Agora, a Prefeitura tenta criar uma legislação própria, que não atende nossas demandas”, afirma.
De acordo com Flávia, a redução de 16% da jornada de trabalho, proposta pela Prefeitura, é insuficiente diante das necessidades atreladas aos dependentes com deficiência. Quem trabalha 40h semanais, por exemplo, terá um pouco mais de 1h diária de disponibilidade. A professora argumenta que o PL não leva em conta casos específicos para estabelecer critérios diferentes na distribuição de cargas horárias.
“Creio que os médicos que acompanham cada pessoa com deficiência precisam ser ouvidos para que a quantidade de horas necessárias ao cuidado seja distribuída de forma particular. Por isso que existe essa amplitude entre 30% e 50% na legislação federal. Uma redução de 16% não facilita em nada nossa vida”, comenta a professora, acrescentando que os servidores não foram ouvidos para a elaboração do PL.
Rotina difícil
Mãe de um menino de 8 anos com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e de uma menina de 13 com Transtorno de Déficit de Atenção (TDA) e Distúrbio do Processamento Auditivo Central (DPAC), Flávia diz que precisa acumular muitas aulas em poucos dias da semana para ter tempo disponível ao acompanhamento das terapias dos filhos.
“O meu chefe direto é uma pessoa compreensível, mas nem todos têm esse privilégio. Mesmo assim, é difícil conciliar. Quantas vezes temos que almoçar no carro, indo de um lugar para o outro, e há momentos que nem tempo de almoçar temos”, afirma.
O que diz a Prefeitura
A secretária de Gestão e Desenvolvimento de Pessoas, Eliane Jocelaine, afirma que o PL é resultado de um amplo estudo da Prefeitura realizado desde 2021.
Ela reconhece a determinação do STF, mas também acrescenta que o Judiciário permite que os municípios criem suas próprias regulamentações baseadas em suas possibilidades e realidades. “Creio que estamos alinhados com o STF e todas as legislações e estatutos específicos”, afirma.
Ainda segundo Eliane, “Campinas está sendo mais flexível que outros municípios, inclusive está estendendo o benefício para quem já tem jornada especial”. Ela diz também que trata-se de “um projeto que pode ser aprimorado a qualquer momento”.
De acordo com a Prefeitura, 326 profissionais que atuam na Administração Municipal têm dependentes com deficiência, sendo a maioria da Educação (139) e da Saúde (66).