Cidades são ambientes de troca – sejam mercadorias, serviços, conhecimento ou ideias. Quando surgiram, há mais de cinco mil anos, sua função era possibilitar a troca de mercadorias. Ao longo do tempo, esse cenário não mudou tanto. A cidade, como importante núcleo de nossa organização geográfica, manteve papel semelhante, propiciando não somente a troca de bens, mas também de ideias e conhecimento.
No entanto, com a ascensão da tecnologia, estar presente fisicamente deixou de ser necessário para o aproveitamento de algumas trocas, que migraram para o “mundo online”. Desse modo, os habitantes das cidades desenvolveram um senso de urgência por conexão, bem-estar e humanidade, questionando toda a estrutura urbana existente.
As Smart Cities, por sua vez, surgem para ressignificar essa relação – idealizadas como as cidades “do futuro”, seu objetivo é utilizar tecnologia e análise de dados para melhorar o ecossistema urbano como um todo, promovendo maior eficiência nas interações e, consequentemente, maior bem-estar para os habitantes.
Singapura é considerada uma das nações mais inteligentes do mundo. Para tanto, foca na digitalização da sociedade, da economia e do governo, implementando soluções que misturam tecnologia com sustentabilidade, além de buscar mesclar os diferentes núcleos urbanos, como universidades e indústrias, em uma mesma zona física, a fim de incentivar o intercâmbio de conhecimento e, também, a facilidade de locomoção. Outra iniciativa interessante é o plano de inclusão de carros autônomos na frota de transporte público para locomoção de pessoas idosas ou com deficiência.
Apesar dos benefícios, o desenvolvimento de soluções desse tipo, além de ser extremamente caro, exige, normalmente, um grau de expertise que os governos não possuem. Por isso, é comum que “dores” das cidades sejam atacadas por startups, que, como aliadas natas do risco, visualizam os setores tradicionais – e normalmente ineficientes – como oportunidades únicas.
O estímulo a esse tipo de iniciativa é um passo significativo para as cidades inteligentes.
Apesar das soluções finais serem direcionadas ao setor público, o capital privado tem se revelado impulsionador da inovação urbana: 21,5% dos 17,5 bilhões de dólares investidos em Venture Capital no Brasil entre 2017 e 2021 foram direcionados a startups que aprimoram a vida urbana – entre elas, empresas de mobilidade, moradia, saúde e educação, conforme revelou relatório da Distrito.
Os agentes públicos, por sua vez, também podem apresentar papel relevante no desenvolvimento do ecossistema de empreendedorismo. Sua atuação costuma desenvolver-se em três frentes: facilitação do acesso ao capital – seja por linhas de crédito ou investimento direto via fundos; redução de exigências legais e/ou regulatórias para as empresas operarem – que pode ser para todas as empresas ou direcionada a grupo seleto, como ocorre com o sandbox regulatório da CVM (Comissão de Valores Mobiliários); e, por último, criação de programas de aceleração – promovendo ações que impulsionam o empreendedorismo por meio da criação de verdadeiros laboratórios para o desenvolvimento de novos produtos e serviços.
Desse modo, é importante ressaltar o papel assumido pelas startups na construção – ou transformação – de uma smart city. Se o poder público estiver embarcado na jornada juntamente com o ecossistema empreendedor, teremos um ambiente mais seguro para levantamento de investimentos por empresas inovadoras. Assim, fomentar o desenvolvimento de startups locais, principalmente por meio do acesso ao capital, é um importante passo em direção à criação de uma smart city.
A cidade de Campinas reflete idealmente essa parceria com o empreendedor. Consolidada como a 8ª cidade mais inteligente do país, vem trabalhando não só como protagonista da inovação, mas também como fomentadora de um ambiente favorável para startups. Em seu plano de ação 2021/2024, inclusive, há o claro objetivo de transformar a cidade em uma smart city genuinamente brasileira.
Essa perspectiva também se encontra refletida em outras ações. Campinas foi a primeira cidade do Brasil a aprovar, a partir do Marco Legal das Startups, uma lei orgânica de inovação (Lei nº 16.165/2021). A lei simplificou a contratação de startups pela prefeitura, abriu espaço para empresas testarem modelos e soluções no sandbox regulatório e no Living Lab (ecossistema aberto de inovação) e, ainda, instituiu um fundo de financiamento de inciativas inovadoras.
A Secretaria de Desenvolvimento Econômico, por sua vez, lançou o Aprova Fácil, que diminuiu para apenas 24 horas o prazo para abertura de empresa. O lançamento do “Campinas na Palma da Mão”, que permite a consulta a diversos serviços de forma totalmente virtual, também veio para desburocratizar a vida do campinense.
Campinas mostrou protagonismo no incentivo ao ecossistema de startups e, mais uma vez, comprometimento com a inovação, ampliando o caminho para uma cidade cada vez mais inteligente.
Mais que isso, por meio das iniciativas ao empreendedorismo proporcionou relações de troca valiosas entre a cidade e seus habitantes, reforçando o motivo inicial do ser humano ter optado pela vida urbana.
Aloísio Carneiro da Cunha Menegazzo é sócio nas áreas Societária e de Fusões e Aquisições, Tecnologia & Inovação de TozziniFreire Advogados, em Campinas
Victor Cabral Fonseca é advogado na área de Tecnologia & Inovação de TozziniFreire Advogados e coordenador do ThinkFuture, programa de Inovação do escritório