Vocês conhecem um brinquedo chamado Mané-Gostoso? Conheci a história da Josefa e do José, pais do André Gravatá, educador, escritor e um dos idealizadores do Jornal das Miudezas (vale a pena conhecer e ler a potência das palavras dentro desse jornal criado em parceria com a artista Serena Labate), e descobri que juntos eles dão vida e ajudam a eternizar o Mané-Gostoso e a poesia. Hoje o brinquedo é feito a seis mãos (pai, mãe e filho).
André me contou que os pais vieram do sertão baiano, de uma região chamada Paripiranga. Migraram para São Paulo no final da década de 70, onde André nasceu, mais exatamente na periferia de Embu das Artes.
A história de criar brinquedos começou após o casal passar por uma fase bem difícil.
“Ambos enfrentaram doenças graves, minha mãe com câncer de intestino e meu pai com aneurisma na perna e um tumor no rim”, conta André. Ele lembra de um momento em que os dois ficaram internados ao mesmo tempo, em andares diferentes de um hospital público. “Depois desse período de dor e angústias os dois foram obrigados a repensar toda a vida, pois meu pai que é pedreiro, pintor, jardineiro teve que parar de trabalhar e minha mãe também não voltou mais a se dedicar para a costura como antes”.
Os dois passaram a viver o tempo todo em casa, o tempo todo juntos. Isso causou muitos conflitos e também inaugurou outra fase da vida deles. “Foi então que um tio veio nos visitar e mostrou que tinha criado um brinquedo de madeira, que meus pais também conheciam porque tinha sido um brinquedo presente na infância deles, chamado Mané-Gostoso, eu e meu tio desafiamos meus pais a tentarem fazer esse brinquedo”, conta.
Os dois fizeram um brinquedo e André se encantou, mas eles pararam naquele primeiro brinquedo.
“Foi então que eu inventei uma mentirinha dizendo que um amigo tinha encomendado cinco brinquedos e iria pagar por eles. Daí eles se entusiasmaram, fizeram os cinco brinquedos, que depois eu entreguei para cinco amigos de presente. E, em seguida, vieram encomendas reais”, conta.
Despertando as potências
Depois disso eles seguiram fazendo não apenas o Mané-Gostoso, mas também outras criações com muita cor e invenção. “Meu pai é responsável por cortar a madeira e minha mãe por pintar os brinquedos. Mas tem vezes que minha mãe corta a madeira e meu pai pinta também, os dois têm aprendido muito com esse processo. Os conflitos e as dores não acabaram, claro, mas tem sido um arejamento constante a criação de brinquedos que depois alegram tantas outras pessoas e, por consequência, alegram meus pais também”, destaca André.
É bonito ver o carinho do José e da Josefa dando vida a pedaços de madeira e ganhando as mentes e corações de crianças e adultos.
“É gratificante criar. Agradeço muito quem admira nossos brinquedos e sempre a gente está criando algo diferente. Criar algo diferente é um incentivo para viver. Quando crio algo novo, dá alegria. Nunca tinha trabalhado com madeira antes e hoje sou apaixonada!”, diz Josefa.
E José conhece a felicidade que a arte da família traz para os outros. “O meu serviço hoje sempre alegra alguma criança no Brasil. Isso me deixa mais feliz ainda e me dá mais vontade de fazer. Quando termino um brinquedo e olho para ele, penso: ficou muito bonito!” (José Gravatá)
Os brinquedos ganham vida e cor nas mãos de Josefa e José e levam ainda a poesia de vida dessa família tão inspiradora.
“Um amigo e mestre querido, o poeta Ricardo Aleixo, com frequência me provocava para que eu criasse com meus pais um brinquedo com poesia. Dessa provocação, nasceu em mim o desejo profundo de inventar com meus pais um brinquedo que nos aproximasse ainda mais. Daí criamos um Mané-Gostoso com o seguinte verso escrito na madeira: “‘Todo mundo rodopia enquanto rodopia o mundo’. É um verso que escrevo com pirógrafo na madeira cortada pelo meu pai e pintada pela minha mãe, um verso que dança com o brinquedo, para ampliar ainda mais seus movimentos. O brinquedo é agora como um poema escrito a seis mãos”.
Quem tiver interesse no Mané-Gostoso do José, da Josefa e do André pode pedir informações pelo e-mail do André: [email protected].
Kátia Camargo é jornalista e sempre admirou os escritos do André Gravatá, ficou encantada ao conhecer a história do Mané-Gostoso que vai muito além de um brinquedo. Por experiência e vivência sabe que, em muitos momentos, é preciso recalcular a rota da vida e reescrever novas histórias. Gosta de brincar com o Mané-Gostoso pensando no quanto é preciso aprender a se equilibrar como um trapezista, por isso ela e o filho Marcos fizeram uma sequência de fotos que muito imita a vida.