A Unicamp colocou em prática novas regras para facilitar o ingresso de alunos refugiados na universidade. Antes, só poderiam participar do programa de ingressos quem já estivesse com o status jurídico de refugiado. Agora, também podem se inscrever quem está em situação de refúgio, mesmo sem ter o reconhecimento jurídico da condição, processo que pode levar anos, ou se enquadram em outras categorias legais.
A Unicamp possui atualmente tem 15 alunos refugiados matriculados, quase todos de graduação, que vieram do Congo, Angola, Síria, Irã, Palestina, Gana e Egito. Desde a promulgação das novas regras, a Universidade recebeu quatro solicitações de estudantes da Rússia e Afeganistão.
“Isso vai cada vez mais ampliando as políticas de acolhimento da Universidade em relação a esse drama humanitário sem precedentes, que infelizmente não tem prazo para se encerrar. As regras anteriores exigiam reconhecimento de refúgio pelo Comitê Nacional para os Refugiados, documentação bastante demorada, o que acaba excluindo uma grande parcela de indivíduos que estão nessa situação de refúgio”, explica Ana Carolina Maciel, historiadora e presidenta da Cátedra Sérgio Vieira de Mello na Unicamp.
Além da Unicamp, a Cátedra Sérgio Vieira de Mello está presente em cerca de 30 instituições brasileiras, através do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR). A pesquisadora da Unicamp Isadora Lins França, que também é membro da Cátedra, avalia que as novas regras representam um avanço importante para que mais refugiados tenham acesso às vagas.
“O Brasil tem diferentes processos de reconhecimento de imigrantes que chegam ao país em busca de proteção e da garantia da vida”, explica Isadora. O visto humanitário, que atende haitianos e afegãos, e a categoria de residência temporária, para venezuelanos, são citados pela professora como exemplos de outras categorias jurídicas, além do refúgio.
A Unicamp é signatária da Cátedra Sérgio Vieira de Mello desde 2019. Desde então, 21 estudantes refugiados foram acolhidos na Universidade. Nesse período, a pandemia de Covid-19 gerou, ao mesmo tempo, novos fluxos migratórios e aumento das restrições nas fronteiras, fatores que se somaram à realidade de riscos gravíssimos já existentes em regiões sensíveis do planeta: conflitos armados, perseguições de vários tipos, desamparo econômico, além de outras condições severas que levam civis ao êxodo forçado.
Embora a criação da Cátedra na Unicamp seja relativamente recente, trazendo uma nova estrutura e ampliação aos programas de acolhimento, a vocação da Universidade para o refúgio acadêmico tem lastro histórico. “Faz parte da história da Unicamp incorporar pessoas que estejam sofrendo perseguição no seu país de origem”, salienta o professor Omar Ribeiro Thomaz, também membro da Cátedra na Unicamp.
“É sempre importante a gente lembrar que nos anos 1970, ou seja, no primeiro período da Unicamp, a Universidade recebeu muitos professores, principalmente da Argentina”, contextualiza Omar, referindo-se à perseguição sofrida durante a ditadura militar naquele país.
O professor avalia ainda que a atual demanda por refúgio não é momentânea, mas tende a se manter nos próximos anos. “Nós temos a situação do Afeganistão. Nós temos a situação recente na Ucrânia, que afeta os países da região. Nós temos uma ditadura na Bielorrússia, uma ditadura na Rússia. Precisamos assumir que temos colegas acadêmicos e acadêmicas que têm o seu trabalho impossibilitado ou dificultado”.
Refúgio
Desde 1985, o Brasil reconheceu cerca de 60 mil pessoas como refugiadas, a maioria proveniente da Venezuela (81,3%), seguida por pessoas da Síria (6,11%), República Democrática do Congo (2,41%) e Angola (2,27%).
Somente em 2021, quase 30 mil pessoas de 117 países solicitaram o reconhecimento da condição de refugiado no Brasil, sendo 78,5% venezuelanos, 6,7% angolanos e 2,7% haitianos.
Em Campinas, cerca de 10% dos quase 20 mil estrangeiros recebidos pela cidade entre 2010 e 2020 são refugiados, de acordo com o Observatório das Migrações em São Paulo, grupo de pesquisa do Núcleo de Estudos de População da Unicamp (NEPO), do Sistema Cocen. (Com informações da Unicamp)