N este último mês de março de 2023, tivemos uma importante e auspiciosa notícia da Fapesp que aprovou um projeto inovador (CEPID – Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão – CancerThera) e que desperta enorme interesse pelo potencial científico e médico para o futuro do tratamento de alguns tipos de câncer: “A abordagem teranóstica do câncer”.
A palavra teranóstica é um neologismo que deriva da junção de duas palavras: terapêutica e diagnóstico”, feitos no mesmo procedimento. Como sabemos, o câncer é um importante problema de saúde pública, talvez o maior, em todo o mundo e está entre as principais causas de morte. Identificar novos agentes para o diagnóstico e tratamento de pacientes com câncer é altamente desejável e desafiador. Um novo tipo de abordagem do câncer vem ganhando destaque mundial, a abordagem teranóstica do câncer.
O conceito geral envolve a identificação de uma molécula ativa relacionada a um alvo tratável e, subsequentemente, a rádio marcação da molécula para diagnóstico (emissores de raios gama ou de pósitrons) e fins terapêuticos (alfa ou beta-emissores). Os metais são grandes ferramentas desta proposta.
Por muitos séculos, os metais foram usados empiricamente para tratar várias doenças. Hoje em dia, os metais e seus compostos – estáveis ou radioativos – são racionalmente aplicados tanto no diagnóstico quanto no tratamento de neoplasias.
Reunindo pesquisadores de uma ampla gama de áreas de especialização, incluindo Oncologia Clínica, Onco-Hematologia, Química, Medicina Nuclear, Farmácia, Estatística, Biologia e Física, o esforço é de criar um Centro de Inovação Teranóstica do Câncer. O objetivo do CancerThera é desenvolver um centro de pesquisa internacionalmente competitivo, com recursos humanos qualificados para a criação e manipulação de produtos farmacêuticos e rádio fármacos para o diagnóstico e tratamento do câncer em uma abordagem teranóstica.
O CancerThera será dividido em duas equipes interligadas – Pesquisa Básica e Pesquisa Clínica – que desenvolverão projetos convergentes:
CancerThera Pesquisa Básica: Moléculas bioativas servirão para sintetizar novos Metallo (radio) fármacos com potencial ação no diagnóstico e bloqueio de replicações de células tumorais. Os compostos e quelantes serão conjugados com vários peptídeos relacionados ao microambiente tumoral. Os compostos serão radio-marcados com o par gálio-68 e lutécio-177, que, respectivamente, permitem o diagnóstico e tratamento de neoplasias, além de outros radioisótopos.
CancerThera Pesquisa Clínica: Possíveis novos usos para moléculas já conhecidas serão estudados. A infraestrutura de radiofarmácia marcará vários radioisótopos diagnósticos baseados em oncologia para possíveis tratamentos de câncer. As investigações serão conduzidas em vários tipos de câncer (como mieloma múltiplo, linfomas indolentes, câncer colorretal e gástrico, glioblastoma multiforme, carcinoma espinocelular cutâneo de cabeça e pescoço, doenças mielo proliferativas crônicas Ph1-negativas, etc.).
A interação contínua entre as equipes de Pesquisa Básica e Clínica do CancerThera ocorrerá em um modelo inédito no país nessa área. Assim, os rádio fármacos produzidos com sucesso na Pesquisa Básica serão utilizados na fase 1 e, eventualmente, na fase 2 de estudos clínicos.
Da mesma forma, novas aplicações de medicamentos conhecidos terão sua radio-marcação monitorada pelos pesquisadores da Pesquisa Básica. Para garantir a apropriação dos resultados do CancerThera pela sociedade, diversos atores de diversas instituições serão interligados entre pesquisadores, acadêmicos, organismos de pesquisa, agências de fomento nacionais e internacionais, microempresas e grandes empresas, governos (estaduais e municipais), imprensa e, em última instância, a sociedade brasileira.
Estamos trabalhando fortemente para levar este projeto adiante. Felizmente, temos a Fapesp que está nos apoiando de maneira decisiva no sucesso deste novo projeto na luta contra alguns tipos de câncer.
Carmino Antônio De Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994), da cidade de Campinas entre 2013 e 2020 e Secretário-executivo da secretaria extraordinária de ciência, pesquisa e desenvolvimento em saúde do governo do estado de São Paulo em 2022. Atual presidente do Conselho de Curadores da Fundação Butantan.
Celso Dario Ramos é professor associado da Departamento de Radiologia, Oncologia e Anestesiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.