De todos os fatos surpreendentes da nossa análise do sistema climático mundial, o mais surpreendente pode ser este: se os oceanos não cobrissem 70% do nosso planeta, estaríamos fritos, literalmente.
Isso porque nossos oceanos absorveram em torno de 93% do calor extra que fica preso em nossa atmosfera pelo efeito estufa, causado por nossa queima de combustíveis fósseis.
Nos últimos cento e cinquenta anos, fizemos o oceano absorver, em média, o calor equivalente a uma bomba nuclear do tamanho de Hiroshima a cada um segundo e meio; e, nos últimos anos, isso aumentou em cinco ou seis vezes.
Mas não é como se esse calor ficasse trancado no armazenamento de água salgada. A energia desse calor se manifesta de muitas maneiras, derrete gelo, por exemplo e mata corais — especialistas sugerem que os corais podem estar mais seguros em tanques na terra do que no golfo do México neste verão.
E, por consequência, esse calor absorvido pelos oceanos eleva o nível do mar — no momento, mais de um terço do aumento do nível do mar é devido ao fato de que a água do mar se expande quando aquece. No meio do verão do hemisfério norte, 44% dos oceanos do mundo estavam sob uma “onda de calor marinha”. Esse calor impulsionou o furacão Idalia até chegar à Baía Apalache, na Flórida, um trecho de terra que não era atacado por um grande furacão desde que a manutenção de registros começou, em 1851. Idalia era apenas uma tempestade tropical no dia anterior, quando passou por Cuba.
As águas do golfo do México são incrivelmente quentes. Nos últimos anos nos acostumamos com temperaturas elevadas e começamos a nos referir ao Golfo como uma banheira; no início do verão no golfo, foi registrada uma temperatura acima 38º, um novo recorde mundial em potencial. Isto é uma banheira quente, mais quente que o sangue. Você não conseguiria ficar sentado nela por muito tempo.
Em todo o Golfo, as temperaturas da água estão em média 1 grau acima do normal. E essas altas temperaturas se estendem a 30 metros, ou mais, abaixo da superfície; a água superaquecida é o combustível que permite o que é chamado de de “intensificação rápida” pelos observadores de furacão, isto é, a aceleração quase inacreditável dos ventos girando.
Em questão de 12 horas, o furacão Idalia passou pelas categorias 1, 2 e 3 na escala Saffir-Simpson, chegando a ser uma tempestade de categoria 4, antes de fazer o landfall (isto é, chegar à terra) na categoria 3. Especialistas apontam que se tivesse tido mais tempo sobre as águas abertas do Golfo, provavelmente, teria continuado se fortalecendo. Foi um processo de ciclismo natural, conhecido como “substituição da parede ocular”, que fez com seus ventos diminuíssem um pouco antes de chegar à terra.
É realmente magnífico, porém amedrontador. Alguém já questionou se o mundo havia sido feito apenas para o homem ou para todos nós, animais. E, agora, a Natureza começa a pedir “me salvem” e ainda pouco fazemos. Por que o homem deveria se valorizar como mais do que uma pequena parte da grande unidade da criação?
Para muitos pensadores, essa visão de mundo exige ação, não qualquer uma, mas uma ação muito profunda e eficiente.
Nossa própria Terra fez muitas viagens bem-sucedidas ao redor do sol antes do homem ser criado, e reinos inteiros de criaturas desfrutaram da existência e retornaram à poeira que o homem parece reivindicar. Depois que os seres humanos também desempenharem seu papel no plano da Criação, eles devem assumir a sua responsabilidade. E se não o fizerem, podem desaparecer sem qualquer comoção extraordinária.
Claro, a “queima geral” é o que estamos fazendo. E no decorrer de um ou dois séculos, conseguimos dominar o mundo que agora estamos destruindo. Derramamos calor no ar e especialmente nos oceanos, e agora esse calor está começando a dominar a vida em nosso planeta.
Ainda podemos recuar, mas a jornada será contra a riqueza, o dinheiro, contra o conforto que ninguém quer largar. Para reduzir riscos, podemos começar com milhões painéis solares, que ainda seria pouquíssimo. O desafio é muito grande e não sabemos como resolver.
Luis Norberto Pascoal é empresário, empreendedor e incentivador de projetos ligados à educação e à sustentabilidade. A Fundação Educar Dpaschoal é um dos pilares de seu trabalho voltado ao desenvolvimento humano e social.