Confira a abertura do livro “Tempos Idos e Vividos”, do historiador Jorge Alves de Lima, obra autobiográfica que será lançada pela Pontes Editores. Serão duas noites de autógrafos: 16 de maio, em Campinas, no evento de abertura do ano acadêmico da Academia Campinense de Letras (ACL), e no dia 21 de maio, em Londrina, no Paraná. Boa leitura!
Naquele início do mês de Janeiro de 1957, os dias de férias rolavam lentos e calorentos para mim, na linda cidade de Londrina, onde residia com os meus pais, Lauro e Maria Alves de Andrade Lima. E ainda, aqueles momentos eram tensos, porque haveria uma mudança radical nos meus planos e no destino de minha vida.
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Eu iria estudar em Campinas e não como eu queria, em Curitiba, destino natural de todos os meus amigos e companheiros do nosso lendário e inesquecível Colégio Cristo Rei, localizado na charmosa cidade de Jacarezinho, no Norte Pioneiro do Paraná, fronteira do Estado de São Paulo. A mudança de direção do local dos meus estudos foi motivada pelo pedido da minha tia Aparecida de Andrade Lima Rosler, ao seu irmão Lauro, meu pai, para que eu viesse estudar em Campinas, uma vez que o seu marido Guilherme Rosler havia falecido e a minha chegada seria bem-vinda!
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Papai comunicou-me a sua decisão, que seria apenas por dois anos e que, depois, iria para Curitiba cursar a faculdade de Direito na Universidade Estadual do Paraná. Assim é que, na madrugada do dia 16 de janeiro, data da minha partida para Campinas, fui despertado pela voz carinhosa de minha mãe:
– Meu filho, acorde! Chegou a hora da sua partida! Ainda sonolento e estremunhado, vi na face de minha mãe uma tristeza, banhada em lágrimas, quando ela me estreitava ao encontro do seu coração! Depois de banhar-me e de um rápido café com leite, eu e papai beijamos mamãe e partimos, rapidamente, rumo à estação Rodoviária. A primeira etapa da viagem a Campinas foi de ônibus até a cidade de Marília, de onde tomaríamos o trem de luxo da Companhia Paulista de Estradas de Ferro.
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Naquela época, as estradas e rodovias paranaenses, salvo exceções, eram sem asfalto, de chão batido e poeirentas. O percurso de seis horas, por estrada esburacada sem pontos de parada e postos de gasolina, com forte calor, foi terrível! Lá pelas 13 horas da tarde, chegamos extenuados, esfomeados, sedentos, roupas com poeira roxa. O belo trem da Paulista já se encontrava estacionado na plataforma da estação. Era o famoso trem de luxo!
O VAGÃO DO RESTAURANTE
Eu e papai embarcamos, rapidamente, e fomos diretamente ao vagão restaurante. Adentrando-o, foi uma inesquecível e bela surpresa. O seu recinto de temperatura amena, resfriado a ar condicionado, era rico e elegantemente decorado. O cenário do restaurante ostentava luxo requintado, suas mesas cobertas com toalhas e guardanapos de linho branco, talheres de prata, pratos finíssimos de louças francesas, taças e copos de cristais da Bohemia. E logo vi, no
centro da mesa, uma bela terrina esmaltada com uvas Niágara, levemente geladas. Não conhecia até então essa qualidade de uva e, pela primeira vez na vida, levei-as à boca! Oh, o sabor inebriante de suas bagas, inesquecível, até hoje, me enleva!
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Fomos atendidos por garçons educadíssimos, gestos fidalgos, vestidos de blazer e camisa social de linho branco, gravata borboleta de cor preta, e calças e sapatos da mesma cor e luvas brancas nas mãos. Depois de um almoço apetitoso de vários pratos deliciosos, regados com uma cerveja geladíssima, arrematado com um perfumado café, fomos para o vagão de primeira classe, e nos acomodamos, em confortáveis poltronas estofadas de couro. O trem de luxo da Paulista ia rompendo e vencendo distâncias rumo ao meu novo destino: Campinas.