Impossível assistir a “Ingresso para o Paraíso” (Ticket to Paradise, EUA, 2022, comédia romântica, 104 min.), de Ol Parker, sem pensar em “Mamma Mia!” (Phyllida Lloyd, 2008), o filme baseado no famoso musical. O enigma fica fácil de solucionar quando descobrimos que o diretor Ol Parker dirigiu a sequência do musical intitulado “Mamma Mia! Lá Vamos nós de Novo…” (2018).
No delicioso musical, a mãe (Meryl Streep) prepara o casamento da filha em magnífica ilha grega, mas espera solucionar um caso do passado: saber qual dos três antigos namorados é o pai. A atmosfera de casamento permeia o filme, mas a história é da mãe e os tais namorados.
Este é, basicamente, o roteiro de “Ingresso para o Paraíso”, escrito pelo próprio diretor. A mãe da vez é Georgia (Julia Roberts), só que, agora, acompanhada do ex-marido e pai David (George Clooney), com quem vive às turras. A filha que vai se casar chama-se Lily (Kaitlyn Dever) e a ilha é Bali, na Indonésia.
O filme mantém a mesma levada do musical original, ou seja, beleza espetacular das paisagens, que transformam o filme em coleção de cartões postais, conflitos que mais parecem brigas infantis e obstáculos resolvidos sem grandes complicações – não por acaso, combina romance com comédia.
Sucesso nos cinemas (lidera, atualmente, a bilheteria no Brasil), o filme se compõe de personagens simpáticos – todos, mesmo os pais de Lily que, em tese, são os vilões e cuja maldade maior não passa de preocupações próprias dos pais: querem evitar que a filha passe pelos mesmos sofrimentos deles (viveram cinco anos juntos e se separaram porque não ouviram os conselhos paternos de que o casamento deles não daria certo). Quer dizer, vilões que não geram medo em ninguém.
Para alcançar o objetivo, na hora da cerimônia de casamento, escondem a aliança evitando que a apaixonada Lily (turista em Bali cuja viagem ganhou de presente de formatura) se case com Gene (Maxime Bouttier), o garoto nativo. Gene é bonito, gentil e bem-sucedido criador de algas exportadas para o mundo todo.
Para os pais, trata-se de uma aventura da filha. Segundo o prognóstico deles, quando acabar o encanto pelo lugar e pelo dedicado Gene, ela irá se arrepender e voltar para casa a fim de exercer o papel de advogada. Esta é a razão da união momentânea dos separados Georgia e David.
Mas, como foi dito, a história não é da filha, mas dos pais e o roteiro foi escrito para Julia Roberts (a campeã de comédias românticas deliciosas) e George Clooney (o queridinho de dez entre dez mulheres em idade um pouco mais avançada) façam do trabalho uma diversão, brinquem e brilhem. E é, exatamente, o que ocorre.
Eles atuam sem esforço – as cenas com erros de filmagens, ao final, comprovam a tese. Julia continua bela e altiva e dona de um sorriso espetacular e Clooney segue sendo charmoso e elegante. O resultado não poderia ser outro.
Como se vê, a história é manjada, com gosto de repetição, que aposta nos quesitos “gente bonita, alegre, (aparentemente) feliz e, claro, de posses”. Também quer seduzir o espectador a se apaixonar pela ilha e tal tarefa tem o mesmo efeito de oferecer doces para crianças.
Ao final, se tivéssemos o mesmo dinheiro da família protagonista, sairíamos da sala de cinema diretos para a agência de viagens mais próxima e compraríamos passagem apenas de ida com destino a Bali e suas montanhas, mares, pores-do-sol, rituais e as múltiplas e lindas cores que, certamente, enfeitariam nossas vidas.
Cinema serve para reflexões diversas, seja filosófica, espiritual, política ou econômica. Mas pode, também, acalentar nossas fantasias. A vida seria insuportável sem as fantasias, assim como seria intragável se consumíssemos, apenas, a realidade crua dos dias.
Enquanto, sentados no conforto das salas de cinema, com luzes apagadas e entregues à beleza, a graça e as fantásticas soluções que encontram aqueles que não precisam batalhar muito para viver bem, quem pensa em pandemia e seus nefastos efeitos ou no desfecho das conflituosas eleições brasileiras ou nas violências do cotidiano?
Alguém chamaria esta atitude de escapismo ou alienação. Que seja. Nós sabemos que a vida não é um filme (lembra?), mas não custa fantasiar que, em certos dias, gostaríamos que a vida fosse, de fato, um filme. De preferência, com características iguais a este, que começa a seduzir ao colocar a palavra paraíso no título.
João Nunes é jornalista e crítico de cinema
O filme está em cartaz nos cinemas. Em Campinas, pode ser visto no Cinemark do Shopping Iguatemi, no Cinépolis do Shopping Galleria e do Campinas Shopping, Kinoplex do Shopping D. Pedro, Unimart Shopping, Shopping das Bandeiras e Prado Boulevard Shopping