A Justiça de São Paulo, validou em segunda instância, a demissão por justa causa de uma auxiliar de limpeza, de um hospital infantil de São Caetano do Sul, que recusou por duas vezes ser imunizada contra a Covid-19. No processo, a auxiliar de limpeza não apresentou motivo médico que justificasse a falta de vacinação.
A funcionária era contratada desde 11 de dezembro de 2019 e foi dispensada em 02 de fevereiro de 2021, quando após advertência foi demitida por justa causa. Ela buscou a justiça na tentativa de reverter a justa causa. Nos autos, a empresa comprovou ter realizado campanhas sobre a importância da vacinação, em especial para os que atuam em áreas críticas do ambiente hospitalar, a chamada “linha de frente”, e juntou advertência assinada pela trabalhadora por recusar a vacina. Na semana seguinte a advertência houve a segunda recusa em receber o imunizante.
Para a magistrada, é dever do empregador oferecer condições dignas que protejam a saúde, a integridade física e psíquica de todos os trabalhadores que lhe prestem serviços. E ainda: a liberdade de consciência não deve se sobrepor ao direito à vida.
“A necessidade de promover e proteger a saúde de todos os trabalhadores e pacientes do Hospital, bem como de toda a população deve se sobrepor ao direito individual da autora em se abster de cumprir a obrigação de ser vacinada”, completou a juíza Isabela Flaitt, na decisão proferida na 2ª Vara do Trabalho de São Caetano do Sul, na primeira instância, no mês de maio.
Em seu embasamento, ela apontou entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou válida a vacinação obrigatória disposta no artigo 3º da Lei 13.979/2020 (ADIs 6.586 e 6.587 e ARE 1.267.897), além mencionar guia técnico do Ministério Público do Trabalho (MPT) sobre a vacinação de Covid-19, que prevê afastamento do trabalhador e considera falta grave a recusa injustificada em não se vacinar.
Segunda instância
A ex-funcionária não aceitou e recorreu da decisão. Na segunda instância, em decisão publicada no último 19 de julho, o desembargador relator Roberto Barros da Silva aponta que foram feitos treinamento e campanhas internas sobre a prevenção contra a Covid-19. “(…) A sentença de mérito proferida na origem se mostrou irretocável e não enseja a reforma pretendida”, afirmou.
O desembargador destacou que a empresa comprovou pela extensa prova documental acostada à sua peça defensiva, a adoção de um Protocolo Interno focado no combate e enfrentamento à pandemia gerada pelo novo coronavírus. “Consigne-se que os principais objetivos do Protocolo adotado pela reclamada eram justamente promover e disseminar as diretrizes adotadas para conter o contágio entre os clientes e colaboradores em geral, fornecer orientações aos colaboradores da empresa sobre a prevenção e a necessidade de adoção de cuidados diante da pandemia, bem como consolidar as ações e as medidas práticas adotadas pela empresa para a mitigação dos riscos”, escreveu.
No processo, a trabalhadora alegou que não poderia ser obrigada a receber a vacina porque não há lei nesse sentido, mas o argumento também foi rebatido pelo desembargador.
“A despeito das alegações da reclamante no sentido de que não poderia ser obrigada a tomar a vacina, porque não existe lei que a obrigue, é preciso consignar que em 07/02/2020 foi pulicada a lei 13.979/2020, que dispõe justamente sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública mundial deflagrada do novo coronavírus. Veja-se que o referido regramento, previu, em seu artigo 3º, inciso III, a possiblidade de realização compulsória de vacinação e outras medidas profiláticas baseadas em evidências científicas”, destacou.
” (…) Fico plenamente convencido de que a conduta adotada pela reclamada (aplicação da justa causa) não se revelou abusiva ou descabida, mas sim absolutamente legítima e regular, porquanto, para todos os efeitos, a reclamante não atendeu à determinação da empresa. Ante todo o exposto, tenho por bem manter a improcedência dos pedidos formulados na exordial, e negar provimento ao apelo ora interposto, em todos os seus aspectos”, decidiu o desembargador.
Advogada defende a decisão
A advogada Mirella Pedrol Franco, coordenadora da área trabalhista do escritório GBA, de Campinas, defende a decisão dos juízes de primeira e segunda instância nesse caso.
“As decisões foram bem assertivas e dão precedentes robustos. Em 2020, o STF já tinha discutido a constitucionalidade da obrigatoriedade da vacinação. O STF decidiu que o estado não pode obrigar o cidadão a se vacinar, mas pode agir de forma compulsória, ou seja, aplicar medidas punitivas, como não permitir que frequente determinados lugares, não viajar, não se matricular em cursos. É como o cinto de segurança, ninguém pode colocar em você, mas você pode ser multado se não usar”, exemplifica a advogada.
De acordo com a advogada, no caso da vacinação contra a Covid-19, se trata de um direito coletivo se sobrepondo ao individual. “A decisão foi bem fundamentada. O próprio Ministério Público do Trabalho (MPT) já havia orientado sobre a importância da vacinação e, caso por mera liberalidade o funcionário se recusasse a vacinar e não fundamentasse a negativa, poderia ser demitido por justa causa”, aponta.