É fundamental a atenção especial que vem sendo dada à Amazônia, no cenário de agravamento da emergência climática. Entretanto, esse cuidado não pode significar negligência com relação aos demais biomas brasileiros. Está claro por exemplo que avança de modo acelerado o desmatamento no Cerrado. E não podemos, nunca, nos esquecer da Mata Atlântica, que cobria originalmente toda a faixa litorânea e agora está reduzida a menos de 10% de sua configuração original.
Nos últimos anos houve um enorme esforço para a proteção do que resta de Mata Atlântica, com legislação mais rígida e políticas públicas de conservação. Entretanto, os riscos permanecem e uma pesquisa recente mostrou a seriedade da situação do bioma.
Os resultados de uma avaliação das 5 mil espécies encontradas na Mata Atlântica foram publicados na prestigiada revista “Science”, com base em extensa pesquisa. Foi então possível identificar as espécies com algum tipo de ameaça e as conclusões são assustadoras.
De acordo com o estudo, 82% das 2 mil espécies de árvores exclusivas da Mata Atlântica sofrem algum tipo de ameaça. Algumas espécies emblemáticas do bioma, como Pau-Brasil, Jequitibá Rosa, Imbuia, Peroba, Cabreúva, Palmito-juçara, Angico e Araucária, foram classificadas como ameaçadas de extinção.
Os autores do trabalho avisam que as estimativas de ameaças foram feitas com base na história do bioma. Não consideram, por exemplo, os futuros impactos das mudanças climáticas na Mata Atlântica. O grupo de autores e autoras da pesquisa foi coordenado por Renato de Lima, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP), de Piracicaba.
Na pesquisa, os autores utilizaram critérios diferentes daqueles observados pela União Internacional de Conservação da Natureza (IUCN), para identificação de espécies ameaçadas. No caso, foram incorporados critérios como os associados aos impactos do desmatamento. Os modelos utilizados na pesquisa serão agora empregados em uma avaliação ambiciosa, das 12 mil espécies de árvores consideradas exclusivas do Brasil.
O estudo publicado na “Science” representa um grande alerta sobre o futuro da Mata Atlântica.
Em sua área de influência moram 70% da população brasileira. A urbanização continua avançando nas regiões do chamado Domínio Atlântico e é fundamental uma atenção rigorosa para o que acontece no bioma, que apesar de sua destruição ainda guarda uma biodiversidade inestimável.
Um dos instrumentos existentes para a proteção de espécies ameaçadas de extinção no Brasil são os Planos de Ação Nacional (PAN), estabelecidos em lei. Já existem PANs para a conservação de várias espécies ameaçadas no país. Um PAN abrange medidas como a proteção da espécie in situ, muita pesquisa científica, educação ambiental e eventualmente criação de Unidade de Conservação. A pesquisa sobre as espécies de árvores ameaçadas na Mata Atlântica indica que serão necessários muitos novos Planos para a conservação de importantes representantes da biodiversidade brasileira.
A conservação da Mata Atlântica é de grande interesse para Campinas e toda a região metropolitana, atualmente composta de 20 municípios. A Mata Atlântica está na própria origem de Campinas. O primeiro nome da futura cidade foi Freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Campinas do Matto Grosso, fundada a 14 de julho de 1774. Agora em 2024, portanto, estamos lembrando os 250 anos de fundação da cidade e é muito importante relembrar como foi a ocupação do território nesse período.
As Campinas do Matto Grosso, obviamente, devem-se à Mata Atlântica que cobria originalmente toda a região. Pois hoje no município de Campinas restam menos de 5% de vegetação nativa de Mata Atlântica. A destruição aqui, portanto, foi muito maior do que a média brasileira. Em alguns municípios da RMC a proporção de vegetação nativa de Mata Atlântica é até menor.
Os fragmentos de Mata Atlântica existentes na Região Metropolitana de Campinas (RMC) são geralmente protegidos, mas permanecem riscos evidentes. Em Campinas, a maior área de Mata Atlântica é a Mata de Santa Genebra, localizada no distrito de Barão Geraldo e para cuja conservação foi criada a Fundação José Pedro de Oliveira, nome de membro da família que doou o espaço para o município, com a condição de que este, município, a proteja. Na Área de Proteção Ambiental (APA) de Campinas também estão outras importantes formações naturais de Mata Atlântica.
Seria muito saudável uma articulação mais consistente entre os municípios da RMC para a conservação das áreas de mata nativa ainda existentes e, principalmente, para projetos de reflorestamento. Existem exemplares ações isoladas nesse sentido, mas seria muito interessante uma cooperação mais sólida e ambiciosa.
A proteção do que já existe e a ampliação da vegetação são estratégicas também no enfrentamento das mudanças climáticas, que todo município deve abraçar e com força a partir de agora. Áreas arborizadas são fundamentais para a fotossíntese e para a criação de microclimas, cada vez mais importantes em um cenário de elevação sistemática das temperaturas.
Mais árvores nativas nas cidades da região, esse deveria ser um lema importante para as respectivas comunidades, considerando todos os seus integrantes.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: [email protected]