Após um longo período de isolamento, incertezas, medo, eis que se aproxima mais um Natal. Em 2020 tivermos uma comemoração de uma maneira que antes sequer imaginávamos. Foi pior ou melhor que nos anos anteriores? Não sabemos. Não é possível extrair conclusos generalizadas. A maneira como vivemos e comemoramos depende muito das nossas disposições interiores, muito mais do que das circunstâncias externas. Mas seguramente a última celebração natalina foi muito diferente das que passamos em anos anteriores.
Mas agora tudo dá mostras de flexibilização, que voltaremos a conviver com outras pessoas, ainda que com cuidados que permanecem necessários. Mas, com a abertura dos locais públicos e a volta do convívio social mais intenso, não raras vezes encontramos pessoas acanhadas, temerosas, como que vivendo ainda as marcas deixadas por esses tempos difíceis.
Diante desse cenário, talvez possamos nos perguntar: o que será que faz com que a vida das pessoas perca o sabor? Em poucos dias chegará o Natal. É tempo de festa, de confraternização, de alegria. Curiosamente, porém, é tempo também em que nos questionamos mais profundamente. Pensamos nos rumos que temos dado às nossas vidas. E, não raras vezes, sem o sabermos, procuramos explicações mais consistentes acerca de nós mesmos: De onde vim? Para onde vou? O que devo e o que não devo fazer?
Estamos de passagem neste mundo. Portanto, um ingrediente imprescindível nesta caminhada é a esperança.
Para entendermos a importância de termos esperança, podemos comparar nossa trajetória nesta vida como uma viagem que fazemos. Tomemos como exemplo dois passageiros que ocupam poltronas vizinhas em um avião.
Ambos vão para um lugar que não conhecem, que nunca pisaram antes. O primeiro, muito otimista, sabe dar asas à imaginação. Enquanto viaja, pensa em como será o aeroporto do destino, imagina os lugares aprazíveis que o espera naquela cidade, pensa no passeio que poderá fazer ao pôr-do-sol. O outro, extremamente pessimista, pensa que sua vida se limita à viagem, e tenta distrair o pensamento, pois pensa que, ao final, a aeronave irá se chocar contra um rochedo, quando então tudo acabará tragicamente.
A viagem de ambos os passageiros é a mesma. Ambos terão os mesmos incômodos do assento, os mesmos cansaços, as mesmas dificuldades para dormir etc. Porém, aquele que pensa nas delícias do destino, ainda que desconhecido, viaja alegre, sereno, pois sabe que a aventura vale a pena. O outro, ao contrário, cuidará apenas de escolher o melhor prato a ser servido, pois afinal, em breve não poderá mais se deliciar com comidas. Não perderá tempo em escutar os problemas dos outros, afinal, os momentos existem, pensa ele, para serem curtidos para si. Ele se irritará facilmente com qualquer incômodo, pois a viagem é curta e, se ao final tudo acabará, então não tem tempo a perder com os problemas dos outros.
Ambos, portanto, estão na mesma viagem, mas o primeiro segue muito melhor que o segundo. E o motivo é muito simples. É que o primeiro tem esperança.
Com palavras simples e profundas, é isso, dentre muitas outras verdades, o que o Papa Bento XVI expôs na sua encíclica, Salvos pela Esperança. Partindo da carta de São Paulo aos Tessalonicenses, o Santo Padre aponta “(…) como elemento distintivo dos cristãos o fato de estes terem um futuro: não é que conheçam em detalhe o que os espera, mas sabem em termos gerais que a sua vida não acaba no vazio. Somente quando o futuro é certo como realidade positiva, é que se torna vivível também o presente”. E em seguida conclui que “o Evangelho não é apenas uma comunicação de realidades que se podem saber, mas uma comunicação que gera fatos e muda a vida. A porta tenebrosa do tempo, do futuro, foi aberta de par em par. Quem tem esperança, vive diversamente; foi-lhe dada uma vida nova”.
Mas os mais céticos e incrédulos, para não dizer desesperançados, poderiam ainda questionar: que garantia temos de que a viagem não termina de fato num choque contra um rochedo, ou, como preferir, num tenebroso vazio?
A garantia que temos é o nascimento do Menino, que em breve celebramos. O Seu nascimento fez com que os Magos viajassem muitos dias em busca da estrela que O apontava. Por certo a viagem foi penosa, mas eles a percorreram com alegria, afinal, buscavam ver a causa de sua alegria.
Esse Menino sempre trouxe alegria. Já desde o ventre de Sua Mãe fez João Batista saltar de júbilo nas entranhas de Isabel. Já adulto, quando Ele já se despedia dos seus que ficariam neste mundo, disse-lhes com todas as letras: “Eu hei-de ver-vos de novo; e o vosso coração alegrar-se-á e ninguém vos poderá tirar a vossa alegria”.
Que seja esse Natal um renascimento da verdadeira esperança. E, com ela, que tenham também a alegria. A alegria perene que se edifica nos corações daqueles que sabem que são filhos de Deus.
Fábio Henrique Prado de Toledo, casado com a Andréa Toledo, pai de 11 filhos e avô de 2 netas. Moderador em cursos de orientação familiar do Instituto Brasileiro da Família – IBF. Especialista em Matrimônio e Educação Familiar pela Universitat Internacional de Catalunya – UIC, é Juiz de Direito. E-mail: [email protected]