O programa ChatGPT foi lançado em 30 de novembro de 2022, pela OpenAI/Microsoft. “Chat Generative Pre-trained Transformer” é um pouco como o Google com ajustes e adequações às suas finalidades. Mas depois do meu breve contato com as limitações pessoais que reconheço para lidar com estes sistemas de inteligência artificial, não posso deixar de me perguntar se ele consegue lidar com as nuances, o contexto, o humor e a criatividade das mentes humanas.
Poderia, talvez, me substituir como autor de artigos científicos, crônicas e livros? O ChatGPT é muito recente para eu usá-lo, sistematicamente. Eu não saberia. Um autor humano acrescenta perspectiva, experiência e talvez conhecimento além do que o ChatGPT pode extrair da Internet.
O tipo de inteligência artificial (IA) que poderia escrever livros didáticos é chamado de generativo, o G em GPT. Ele aprende os padrões e as estruturas dos dados de “treinamento” e gera combinações semelhantes de novos dados, produzindo textos, imagens ou outras mídias. Então, o ChatGPT poderia escrever um livro? Eu também não acho.
Posso imaginar a IA generativa escrevendo um romance. Seria muito difícil. Os livros didáticos, entretanto, têm um estilo altamente distinto. Em geral, os livros didáticos têm muito mais do que uma única narrativa por capítulo. O processo também envolve a seleção de fotos, desenhos de ilustrações e criação de ferramentas pedagógicas – perguntas, resumos, referências, leituras em blocos, etc. Portanto, em relação a publicação de livros didáticos, suspeito que a IA pode não ser capaz de executar tão bem quanto um autor humano.
Certamente, há muita evolução de um livro didático nas ciências da vida.
Cada edição traz novas fontes, elementos de design, para fazer a nova versão parecer diferente, até porque alguns temas não mudam por fazerem parte de um elenco de assuntos tradicionais. Poderia exemplificar em minha especialidade, a Hematologia, onde cada edição de nossos tratados atualiza vários capítulos. Certamente, alguns novos serão inseridos até porque, a ciência avança e o conhecimento deve ser difundido.
Estamos neste processo neste momento, reeditando um importante tratado anterior de Hematologia. Os primeiros E-books datam da década de 1990. Como os livros tradicionais são caros devido aos seus custos de editoração e produção, ocasionalmente surgem esforços para substituí-los.
Eu adoro livros físicos, pela minha idade e formação ainda não me adaptei às formas digitais. Mas montar um curso a partir de materiais on-line, ou de notas de aula e perguntas de testes, exige mais tempo e esforço do que a maioria pode imaginar. E os livros on-line gratuitos que surgiram há alguns anos não tinham o escrutínio editorial e de revisão que uma editora acadêmica oferece. Uma habilidade menos tangível na criação de um livro didático ou não é o talento inato para escrever. Os elementos de estilo são sutis.
A IA pode imitar a criatividade da mente humana? A IA pode montar rapidamente uma tabela. Mas como pode um algoritmo, por mais bem treinado que seja, imitar a escolha de exemplos da experiência de um autor ou desenvolver estudos de caso baseados em entrevistas pessoais com pessoas que têm doenças hematológicas, por exemplo?
A IA melhoraria minhas comparações com as células-tronco? E a pedagogia? A IA poderia produzir questões de preenchimento de lacunas ou de múltipla escolha. Mas poderia criar o meu exercício de pensamento crítico dos diagramas de Venn de três variantes do SARS-CoV-2 com algumas mutações compartilhadas? Conseguiria rastrear um tipo de sangue raro em uma família no Hospital Geral? E a história clínica?
A IA pode facilmente montar cronologias. Mas combinaria a decifração do código genético de 1961 por Marshall Nirenberg e Heinrich Matthaei numa leitura de “Glimpse of History” (Vislumbre da História) com a invenção de Katalin Karikó e Drew Weissman da primeira vacina baseada em mRNA?
Finalmente, a IA pode usar o humor? Uma isenção de responsabilidade do ChatGPT diz “Embora tenhamos salvaguardas, o ChatGPT pode fornecer informações imprecisas”.
Aparentemente, o ChapGPT também comete erros de omissão. Desse modo, vamos seguir a evolução desta ferramenta que parece ser bastante útil, mas que dependerá sempre do ser humano para cria-la, aperfeiçoa-la e operá-la.
Carmino Antônio De Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020. Secretário-executivo da secretaria extraordinária de ciência, pesquisa e desenvolvimento em saúde do governo do estado de São Paulo em 2022 e atual Presidente do Conselho de Curadores da Fundação Butantan. Diretor científico da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH).
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