O termo, que significa “demissão silenciosa”, começou a ganhar destaque entre os usuários do TikTok em meados de julho, quando uma série de vídeos começaram a surgir na plataforma questionando a histórica relação com o trabalho.
A ideia central desta tendência gira em torno de bater o ponto, cumprir as tarefas estabelecidas para a jornada de 8 horas, desligar o computador, bater o ponto e esquecer que o trabalho existe.
Em resumo, é a estratégia escolhida pela geração Z de dedicar-se o mínimo possível no emprego para evitar – o cada vez mais frequente – burnout.
Apesar da tradução, o fenômeno não tem muito a ver com a demissão em si, já que os profissionais continuam trabalhando e cumprindo as suas demandas diárias. Só não estão dispostos a entregar nada além disso – ou seja, sem horas extras, sem novos projetos, sem proatividade e sem nenhum desejo de evoluir na carreira.
É uma forma de enxergar o trabalho sob uma nova perspectiva, menos desgastante. Tanto que os primeiros vídeos que surgiram no TikTok citavam a importância de cumprir as obrigações, mas sem colocar o trabalho no centro da vida. As prioridades deveriam ser qualidade de vida e lazer.
Zaid Khan, 24 anos, desenvolvedor de software, foi um dos responsáveis pela fama repentina do quiet quitting. Sentado em uma estação de metrô de Nova York, ele refletiu sobre o fenômeno de uma forma leve e tranquila: “Você não está desistindo de vez de seu trabalho; está só desistindo da ideia de ir acima e além do dever. Você continua a desempenhar suas funções, mas não adere mais à mentalidade da cultura batalhadora, que faz do trabalho a coisa mais importante de sua vida.”
O vídeo já foi assistido 4,9 milhões de vezes até esta semana e gerou milhares de comentários positivos sobre a sua interpretação.
Em pouco tempo, o quiet quitting virou manchete pelo mundo e se transformou no novo grande fenômeno que estaria mudando o mercado de trabalho.
Uma recente pesquisa da Society for Human Resource Management reforça a tese do movimento: metade dos profissionais de recursos humanos se mostram preocupados com o cenário futuro e um terço deles afirmaram ter visto de perto alguns exemplos de “demissão silenciosa” em suas empresas.
Uma outra pesquisa, conduzida pela Gallup, que divide a força de trabalho em três grupos: “engajados”, “ativamente engajados” e “não engajados” – após entrevistar 15 mil profissionais nos Estados Unidos, mapeou que 50% dos respondentes estão no grupo de “não engajados”. Ou seja, são aquelas pessoas que cumprem seu trabalho, mas não necessariamente se sentem satisfeitos ou animados com ele. Inclusive, a maioria dos participantes desse grupo está procurando novas oportunidades.
Como tudo na vida, o quiet quitting não é consenso. Fazer apenas o que é necessário e não ir além do esperado – sem nenhum tipo de recompensa – não é uma postura nova e, muito menos, revolucionária. É normal dizer também que à medida que novas gerações entram no mercado de trabalho, novos olhares para a relação entre vida pessoal e profissional apareçam.
Por outro lado, o quiet quitting encorpa outros movimentos que já estão transformando o mercado de trabalho, como a flexibilização dos regimes de contratação, a redução de cargas horárias sem redução nos salários, a valorização de temas voltados à saúde mental e o aumento das demissões voluntárias (Grande Resignação).
Longe de cravar se o fenômeno é ou não legítimo, fica o alerta: até que ponto os profissionais estão dispostos a dedicar uma significativa parte da vida – única e exclusivamente – ao trabalho?
Flávio Benetti é professor, palestrante, publicitário e especialista em Comunicação interna e endomarketing. Considera-se um cara apaixonado pela vida, curioso por natureza, fã de tecnologia, design e fotografia