Parecem cada vez mais evidentes e comprovados, para os cidadãos em geral, os benefícios da proteção ambiental e dos cuidados com os recursos naturais. Mas se ainda restam dúvidas sobre a relevância das temáticas ambientais para um desenvolvimento de fato sustentável, basta estar mais atento para os impactos das múltiplas formas de poluição para a saúde.
Um estudo divulgado em 2022 pela revista Lancet, uma das mais conceituadas publicações científicas na área da saúde, mostrou que em 2019 a poluição provocou 9 milhões de mortes em todo o mundo. O estudo da Comissão Lancet sobre Poluição e Saúde revelou que os óbitos associados a diversas formas de poluição cresceram em 7% em relação a 2015 e em 66% desde o ano 2000.
A Organização Mundial da Saúde também tem feito constantes alertas a respeito. Em 2022, a OMS advertiu que 99% da população global respira partículas finas de poluição acima dos limites considerados seguros para a saúde. A queima de combustíveis fósseis, como petróleo, carvão e gás natural, está na origem de grande parte da má qualidade do ar, afetando a saúde das pessoas, completou a OMS. Os mesmos fósseis, aliás, que estão agravando a crise climática planetária.
E por falar em crise climática, são igualmente reiteradas as advertências sobre os efeitos das mudanças do clima para agravar algumas enfermidades. Doenças como dengue, por exemplo, podem atingir níveis recordes, com o esperado aumento das temperaturas em algumas regiões, provocando a multiplicação dos vetores da enfermidade.
Apesar de todo esse arsenal de dados, ainda é limitada a associação, na consciência coletiva e também na mídia, entre agravamento das condições ambientais e más condições de saúde. Uma oportunidade para mudar esse cenário aparece agora no Brasil, pela atuação da Rede Saúde e Natureza.
Formada em 2020 por cientistas, ambientalistas e profissionais em geral, a Rede vem se dedicando a propor a discussão e a estudar de forma mais aprofundada a relação direta entre as diferentes formas de poluição e seus impactos na saúde humana. A Rede está divulgando um Manifesto a respeito, com o título “A importância de incluir as Relações entre Saúde e Natureza nas Políticas Públicas e nas Ações da Sociedade”.
O Manifesto lembra que a associação entre saúde e natureza está prevista na própria Constituição brasileira, em seu artigo 225: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”.
Os signatários do Manifesto pedem então que haja uma maior articulação das ações entre Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e Ministério da Saúde, entre outros órgãos públicos, para planejar e executar políticas voltadas para a relação entre saúde e natureza.
Um dos caminhos para isso, propõe o Manifesto, seria reconhecer e fortalecer o papel das áreas protegidas e conservadas, incluindo as urbanas, como espaços e equipamentos de promoção da saúde e bem estar físico e mental.
Claro está que, como muitos dos espaços naturais em território brasileiro estão degradados ou sofrendo exploração inadequada, seria fundamental melhorar a sua proteção e recuperação, em benefício da própria natureza e da saúde das pessoas.
A Rede Saúde e Natureza Brasil entregou o Manifesto na última segunda-feira, 22 de maio, Dia Mundial da Biodiversidade, às ministras do Meio Ambiente, Marina Silva, e da Saúde, Nísia Trindade.
Há uma expectativa positiva, pelas pessoas e organizações envolvidas, de que a relação entre saúde e natureza fique cada vez mais clara no Brasil, com efeitos benéficos na formulação de políticas públicas. Mas como sempre os avanços apenas serão alcançados, se houver mobilização e pressão suficiente da sociedade civil e cidadania em geral.
O que não pode é o povo brasileiro continuar sofrendo sistematicamente pelo agravamento da destruição da natureza. Os casos de Mariana e Brumadinho são os exemplos mais trágicos do que pode acontecer se não houver a devida preocupação com as condições ambientais nas cidades e também no meio rural. Esse é um dos sentidos mais profundos do que hoje se conhece como sustentabilidade.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: [email protected]