No último domingo, 1º de outubro, foi lembrado o Dia Internacional do Café. A data é comemorada desde 2015 pelos países e associações que integram a Organização Internacional do Café (OIC). Outras datas celebram a segunda bebida mais consumida do mundo, atrás somente, claro, da água sagrada.
Maior produtor e segundo consumidor mundial de café, o Brasil e sua cultura diversa devem muito ao grão de origem imemorial, possivelmente da Etiópia, na região de Kaffa, embora a Arábia Saudita tenha sido provavelmente quem propagou a delícia planeta afora. O café chegou ao Brasil no século 18, mas a produção passou a ser mais expressiva a partir de sua aclimatação no Vale do Paraíba, no século 19.
No século 20, o grande responsável pelo desenvolvimento de variedades do café, mais indicadas para essa ou aquela geografia, a esse ou aquele clima, é o Instituto Agronômico de Campinas. Criado como Estação Agronômica em 1885, foi fundado oficialmente a 27 de junho de 1887.
Nascia a instituição que deu origem a um dos mais importantes e talvez o mais dinâmico ecossistema de ciência, tecnologia e inovação do país. E seria uma instituição voltada para a realização de pesquisas com a marca do que hoje é rotulado de sustentabilidade, na medida em que o trabalho do IAC é essencialmente orientado pela preocupação social, econômica e ambiental.
As pesquisas em café são de fato algumas das realizações mais notáveis do Instituto Agronômico. Mas não é “só” nisso que o IAC é notável. Grande parte do que o brasileiro consome hoje, do café da manhã ao jantar, tem origem em variedades desenvolvidas nos campos experimentais da instituição, em Campinas e outras cidades paulistas.
Mas também é importante evidenciar o olhar permanente do Instituto Agronômico e seus cientistas para a conservação e/ou proteção do equilíbrio natural. Já falamos aqui da atuação de João Pedro Cardoso, inspetor do 2º Distrito Agronômico de Campinas e responsável pelo primeiro Dia da Árvore no Brasil, na cidade de Araras. Isso em 1902, mesmo ano em que o mesmo João Pedro Cardoso publicou artigos denunciando os impactos das ferrovias nas florestas paulistas. Cardoso foi muito influenciado pelo botânico sueco Alberto Loefgren, que participou de várias expedições científicas europeias no Brasil até se fixar definitivamente neste país. Loefgren foi chefe da Seção Botânica de São Paulo e colaborou com o Instituto Agronômico.
Na década de 1960, pesquisadores do IAC coordenaram o primeiro levantamento aerofotogramétrico da cobertura florestal de São Paulo. Foram feitas 25 mil fotografias aéreas.
Na época, constatou-se que o território paulista tinha 13,7% cobertos com floresta nativa, o que alimentou a preocupação com a destruição de um dos principais biomas do Brasil, a Mata Atlântica.
Ex-diretor do Centro Experimental de Herbicidas do IAC, Reinaldo Forster empenhou-se na reconstituição fiel, em uma área da Fazenda Santa Elisa, de propriedade do Instituto, de um ambiente com vegetação de Cerrado, outro bioma muito afetado pela devastação.
Na mesma Fazenda Santa Elisa, Hermes Moreira de Sousa, ligado à Seção de Floricultura e Plantas Ornamentais, plantou uma mata com 3.500 espécies de árvores e 400 de palmeiras. Um trabalho de mais de 40 anos, para completar uma das principais coleções do tipo do país e da América do Sul.
Também no Instituto Agronômico de Campinas foram realizados os primeiros estudos de zoneamentos agroecológicos. Eles começaram na Seção de Agrogeologia, criada em 1935 e que teve o alemão Paul Vageler como primeiro chefe.
Nos últimos anos, o Instituto Agronômico tem-se dedicado cada vez mais ao que hoje é denominado de agricultura sustentável.
Um claro exemplo de agricultura sustentável é o fato de que o Centro de Citricultura “Sylvio Moreira” passou a ter, desde outubro de 2002, a única fazenda de pesquisa agronômica com certificação internacional de sustentabilidade.
O Selo Ouro Farm Sustainability Assessment (FSA) ou Avaliação de Sustentabilidade da Fazenda foi conquistado em função de uma série de investimentos e adequações na unidade do IAC em Cordeirópolis, em termos de proteção ambiental, de questões trabalhistas e sociais e de gestão. obtido no final de outubro de 2022, graças a investimentos e adequações realizados em aspectos relacionados ao meio ambiente, as questões trabalhistas, sociais e de gestão. A FSA, que já avaliou mais de 200 mil fazendas em 40 países, pertence à plataforma SAI (Iniciativa de Agricultura Sustentável) e está sujeita a rigorosas análises de estruturas e procedimentos adotados, avaliados como ocorre para obtenção de uma certificação nos moldes da ISO.
São muitos outros exemplos nessa linha. O certo é que o Instituto Agronômico de Campinas é um ícone, uma inspiração, em termos de ciência praticada com objetivos sociais e econômicos e preocupação ambiental. Nada mais sustentável, nada mais dadivoso para Campinas, um farol a ser seguido por seu ecossistema de ciência e tecnologia.
No total, são mais de 800 variedades de diversas espécies desenvolvidas no Instituto Agronômico, com maior resistência a doenças e maior produtividade. O IAC é um dos grandes responsáveis, portanto, por o Brasil ter-se tornado uma potência agrícola, base fundamental de nossa segurança alimentar.
Não por acaso, o Instituto Agronômico sediou, em outubro de 1949, a primeira Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), fundada no ano anterior. Os encontros anuais da SBPC se tornariam, nas décadas seguintes, os eventos mais relevantes e badalados de ciência no Brasil. Campinas sediaria três outras Reuniões Anuais, em 1963 (na PUC-Campinas, no Páteo dos Leões), em 1982 e 2008, as duas últimas na Unicamp.
O tema da primeira reunião anual, no Agronômico, foi “Alimentação”, por sugestão da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o tema escolhido para a Reunião Anual inaugural da SBPC foi “Alimentação”.
A Unesco estava muito preocupada com a questão da fome, que se aprofundava em escala internacional no pós-Segunda Guerra Mundial. É relevante que o tema tenha sido discutido justo na organização que tanto se destacou na busca da segurança alimentar, o Instituto Agronômico de Campinas, patrimônio nacional e símbolo de ciência para a sustentabilidade.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: [email protected]