Atis Monteiro, 90 anos, é uma verdadeira lenda viva da Ponte Preta. Campineiro, nascido em 6 de abril de 1932, batizado com nome cuja origem remete à mitologia grega, ele marcou época vestindo a camisa alvinegra durante um breve porém relevante período na longínqua década de 50, pouco após a inauguração do estádio Moisés Lucarelli.
Atleta diferenciado, talentoso com a bola nos pés e nas mãos, algo bastante raro de se encontrar, Atis brilhou tanto nos campos de futebol, onde ganhou projeção e viveu os momentos mais memoráveis da carreira, quanto nas quadras de basquete, em um tempo ainda bastante primitivo do esporte. Um “deus” da “mitologia” pontepretana.
“Eu vi grandes estrelas da Ponte Preta, desde o time que inaugurou o Majestoso na década de 40 até equipes dos anos 50 e 60, mas confesso que nenhum jogador foi superior a Atis Monteiro”, declarou Zaiman de Brito Franco, em entrevista ao Hora Campinas.
Craque de um passado distante, porém não menos importante, Atis Monteiro é considerado o maior jogador da história mais que centenária da Macaca, na visão do conceituado jornalista campineiro e pontepretano Zaiman de Brito Franco, de 85 anos, testemunha ocular da capacidade no auge físico de seu contemporâneo conterrâneo, colocado à frente até mesmo de grandes ídolos como o goleiro Carlos, o zagueiro Oscar e o meia Dicá, ícones do clube nos inesquecíveis anos 70.
“No talento, nas diabruras, na malícia, nos truques, na improvisação, no drible desconcertante e surpreendente, Atis mantinha sincronia com o futebol de Heleno de Freitas. Porém também se identificava com a ousadia e precisão de movimentos maliciosos do futebol de Zizinho”, descreveu Zaiman, em reportagem publicada na antiga Tribuna de Campinas, no dia 6 de abril de 1997, produzida em parceria com o jornalista Luiz Sugimoto.
Em contato com a reportagem do Hora Campinas, Zaiman acrescenta, utilizando referências mais recentes do futebol brasileiro, para compreensão dos mais jovens, sobre a qualidade técnica refinada de Atis: “Um atacante maravilhoso que conseguia entrar na área tocando a bola com os dois pés, que tinha a lucidez de um Romário e era implacável como Ronaldo, um jogador completo”.
As palavras e comparações de Zaiman impressionam, mas se comprovam pela história. Afinal, não foi à toa que, antes mesmo de completar 21 anos, Atis Monteiro deixou a Ponte Preta para integrar o maior esquadrão da história da Portuguesa, um dos melhores times do Brasil na época, que conquistou feitos importantes, inclusive fora do país, além de ceder três jogadores para defender a Seleção Brasileira na Copa do Mundo de 1954, na Suíça.
Um deles era nada menos do que Djalma Santos, posteriormente eleito pela FIFA o melhor lateral-direito de todos os tempos, bicampeão mundial pelo Brasil em 1958 e 1962. Os outros dois eram o lendário ponta direita Julinho Botelho e o volante Brandãozinho, um dos cinco jogadores campineiros que já disputaram uma edição de Copa do Mundo, ao lado do goleiro Barbosa (1950), do zagueiro Amaral (1978), do meia Silas (1986 e 1990) e do atacante Luís Fabiano (2010).
Atis Monteiro só não aparece nessa seleta lista de campineiros mundialistas porque, às vésperas da Copa de 54, sofreu uma lesão que o impediu de ser mais uma estrela da Lusa convocada pelo técnico Zezé Moreira, o mesmo que depois o levou para o Fluminense. Em 1955, o Tricolor das Laranjeiras ostentava um timaço com o goleiro Castilho e o meia Didi, outros dois futuros bicampeões mundiais com a Seleção Brasileira, além de Telê Santana na ponta direita.
Com um acentuado lado irreverente, Atis Monteiro só não chegou mais longe no futebol porque resolveu pendurar as chuteiras muito cedo, aos 24 anos, encerrando uma jornada meteórica, porém recheada de deliciosas histórias que povoam o imaginário popular.
“Como Dicá, outro notável craque pontepretano, Atis nunca vestiu a camisa da Seleção Brasileira. Um fato que não diminui em nada sua biografia. Trata-se de uma simples contradição nada poética que é sempre repetida”, conclui Zaiman, em reportagem publicada na Tribuna de Campinas, em 1997.
Presente na vida de Campinas há exatamente nove décadas, portanto cerca de um terço do tempo de existência da cidade, que completou 248 anos no último dia 14 de julho, Atis Monteiro só morou fora de sua terra natal entre 1953 e 1955. Nesse curto período, em função da carreira de jogador, ele viveu em São Paulo e depois no Rio de Janeiro, à época capital federal, além de participar de excursões pela América do Sul e Europa.
Após fazer um razoável pé-de-meia e abandonar o futebol de forma precoce, a fim de se preservar de um meio repleto de negócios escusos, Atis Monteiro retornou a Campinas, onde se casou aos 26 anos com a esposa Marisa e tiveram seis filhos: Marcela, Viviana, Silvia, Juliana, Guilherme e Renata.
“Eu sou sincero, morei em São Paulo e no Rio de Janeiro, viajei duas vezes pela América do Sul e uma vez pela Europa, mas nunca vi nada melhor do que Campinas, uma cidade que absorve toda a minha vontade de viver”, declara-se Atis Monteiro.
A bem da verdade, em 1959, quando tinha 27 anos, Atis retornou à Ponte Preta para readquirir forma física e tentar retomar a carreira, mas já tinha perdido o bonde: jogou apenas durante dois meses e desistiu oficialmente do futebol.
Mesmo sem mais nenhum envolvimento profissional com o esporte, dedicando-se somente a outras ocupações, a atividade física continua presente até hoje em sua rotina, seja caminhando ou batendo bola, até mesmo a de tênis. É um dos segredos para a invejável longevidade, além dos hábitos saudáveis de alimentação que mantém desde a infância, baseados no vegetarianismo. Um verdadeiro exemplo de vida.
As principais características que garantem vitalidade a Atis Monteiro foram herdadas do pai, que também praticava esporte e não consumia produtos de origem animal. O nome dele, você já deve ter ouvido falar, Coriolano Moraes Monteiro, um importante professor do passado que dá nome a uma escola estadual em Campinas, além de uma rua no bairro Jardim Planalto. “Meu pai era diplomado em latim, mas virou professor de inglês porque faltava na época”, contou Atis, em entrevista concedida ao Hora Campinas.
“Ele era muito respeitoso”, acrescenta Juliana Monteiro, a respeito do avô paterno. “Mas também rígido e duro”, complementa Guilherme Monteiro. Os dois irmãos, quarto e quinto filhos de Atis, respectivamente, também participaram do bate-papo de cerca de duas horas realizado em volta de uma mesa de madeira repleta de fotos antigas e artigos de jornal, em uma casa rústica da família no condomínio San Conrado, no distrito de Sousas, o mais antigo de Campinas.
Chegada e estreia no Majestoso
Nascido e criado no bairro nobre do Cambuí, na região central de Campinas, Atis Monteiro começou a mostrar vocação para o esporte por volta dos 12 anos de idade, praticando natação, remo e basquete, seu maior xodó, no Clube Regatas. Logo, ele se aventurou no futebol e não demorou a chegar à Ponte Preta, na virada para a década de 50, graças ao olhar apurado do treinador Ernesto Bellucci, que à época comandava a categoria juvenil do clube alvinegro.
No final de 1950, com apenas 18 anos, Atis já recebia as primeiras oportunidades na equipe principal da Ponte Preta, então comandada pelo técnico Nico, segundo treinador que mais dirigiu o clube alvinegro na história, com 260 jogos, atrás apenas de Cilinho, que soma 345 partidas.
“Eu fui convidado para jogar em um time amador de Campinas que se chamava Corintinha e, quando acabou o ano, o técnico juvenil da Ponte Preta estava atrás de mim”, revela Atis, em referência a Ernesto Bellucci, responsável por levá-lo ao estádio Moisés Lucarelli, construído pelas mãos dos próprios torcedores e inaugurado em 12 de setembro de 1948.
A estreia oficial de Atis entre os profissionais da Ponte Preta aconteceu no dia 12 de novembro de 1950, no Majestoso, em um duelo contra o Esporte Clube Mogiana, extinto clube ferroviário de Campinas, que à época possuía o estádio mais moderno do interior do Brasil, o único da cidade com iluminação para jogos noturnos, sede de uma dezena de Dérbis entre 1941 e 1950.
Inaugurado em 1940, o estádio Doutor Horácio Antônio da Costa completou 82 anos no último dia 14 de julho, mesma data do aniversário de Campinas. O complexo esportivo passou a ser conhecido como Cerecamp nos anos 70, mas é popularmente chamado de Campo da Mogiana.
Goleador e cestinha nos tempos de amador
O ano de 1951 trouxe grandes avanços dentro e fora de campo para a Ponte Preta, como a inauguração dos refletores do estádio Moisés Lucarelli e a estreia da equipe na primeira divisão estadual, contando edições sob organização da Federação Paulista de Futebol, fundada em 1941.
Mesmo recém-promovida e debutante naquele campeonato, sob o comando de José Agnelli, a Macaca conquistou sensacionais vitórias por 3 a 0 sobre o Santos e 3 a 1 em cima do Palmeiras, ambas no Majestoso. Detalhe: o Verdão ostentava o honroso título de Campeão das Cinco Coroas, pois havia faturado os então mais recentes troféus do Campeonato Paulista, do Torneio Rio-São Paulo, da Taça Cidade de São Paulo, duas vezes, e da Copa Rio. Um feito inédito até então.
Naqueles tempos, a Ponte Preta contava com o lendário goleiro Ciasca e o grande atacante Sabará, revelado no Majestoso, que depois jogaria no Vasco e chegaria à Seleção Brasileira. Também não se pode esquecer do veterano e imponente zagueiro Stalingrado, que levava esse curioso apelido em alusão à maior e mais sangrenta batalha da Segunda Guerra Mundial, ocorrida entre 1942 e 1943, que terminou com vitória dos soviéticos sobre os alemães, mudando os rumos do histórico conflito a favor dos Aliados.
“Certa vez, num encontro em um restaurante, Ciasca me contou que houve um treino da Ponte em que meu pai deu uma porretada na bola que arrancou sete dentes dele”, diverte-se Guilherme Monteiro, filho de Atis.
Para abrilhantar ainda mais aquele período bem na metade do século XX, a Ponte Preta também se sagrou campeã invicta de futebol amador do estado de São Paulo, além de campeã do interior paulista de basquete, com participação decisiva de Atis Monteiro nas duas conquistas, atuando como ponta de lança nos gramados e ala nas quadras. Artilheiro e cestinha ao mesmo tempo, dá para acreditar?
“Naquela época, o futebol amador da Ponte era uma equipe com idade além do juvenil, quase uma espécie de segundo time, que disputava um campeonato estadual”, contextualiza Zaiman de Brito Franco.
“Atis Monteiro foi o grande destaque do time campeão amador do estado em 1951, que sob o comando do lendário técnico Nico permaneceu invicto por 45 partidas. Atraía multidões nas preliminares dos jogos do time principal da Ponte Preta”, relata o jornalista e escritor pontepretano Stephan Campineiro, autor dos livros “Ponte Preta – A torcida que tem um time” e “Majestoso 70”.
Mudando do futebol para o basquete, em tempo muito anterior à existência da cesta de três pontos, o título do interior conquistado pela Ponte Preta veio com vitória na final sobre um combinado da cidade de Sorocaba, no Ginásio Alberto Krum, no bairro Botafogo, em Campinas. “Vencendo domingo à noite a Seleção Sorocabana, os alvinegros campineiros lograram o título máximo – 39 x 26 a contagem final. Ramon, o cestinha da noitada esportiva e Atis, a maior figura em quadra”, destacou o jornal Diário do Povo, em sua edição de 11 de dezembro de 1951.
Na decisão estadual, no entanto, a Ponte não foi páreo para o Corinthians, então campeão da cidade de São Paulo. “O Corinthians era um time imbatível e tinha um jogador chamado Angelim, que foi um mito do basquete. Eles venceram e ainda queriam levar o Atis embora só para jogar basquete”, conta Zaiman de Brito Franco. Atis, no entanto, declinou o convite e continuou na Ponte Preta.
Naquela época, o basquete pontepretano também contava com o talento de Ramon de Souza, o Romão, pai de Marcel e Maury de Souza, grandes ícones do basquete brasileiro entre os anos 70 e 90, com diversas participações em Olimpíadas e Mundiais. Juntos na Seleção, Marcel e Maury conquistaram medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de 1987, em Indianápolis, superando os Estados Unidos por 120 a 115, em uma decisão histórica que completa 35 anos neste próximo mês de agosto. Aquela foi a primeira derrota dos americanos como anfitriões em toda a história da modalidade.
“Righetto me levou para jogar basquete pela Ponte quando eu já estava no juvenil de futebol do clube. Ele também era um importante arquiteto em Campinas, inclusive projetou a casa do meu pai na Rua Marcondes Salgado, no Bosque”, destaca Atis Monteiro.
Entre o fim dos anos 40 e início dos 50, o diretor de esportes amadores da Ponte Preta era o ilustre campineiro Renato Righetto, o mesmo que depois se tornaria um dos árbitros mais importantes da história do basquete mundial, com participação em quatro Olimpíadas e uma carreira que somou mais de 800 jogos internacionais.
Para se ter ideia, há exatamente 50 anos, Renato Righetto foi escalado para apitar a decisão do torneio de basquete masculino dos Jogos Olímpicos de 1972, em Munique, que terminou com vitória da União Soviética sobre o Estados Unidos, em um polêmico jogo decidido nos segundos finais, em pleno auge da Guerra Fria. Os americanos nunca haviam perdido uma partida olímpica até então.
Em meados dos anos 60, como dirigente das categorias de base da Ponte Preta, Renato Righetto foi responsável pela chegada ao Majestoso de ninguém menos do que o meia Dicá, que se tornaria o maior artilheiro da história do clube, além de recordista de partidas, com 155 gols em 581 jogos. Aniversariante do mês, Dicá completou 75 anos no último dia 13 de julho.
O Dérbi que consagrou Atis
O ano de 1952 começou de forma excepcional para a Ponte Preta. Em fevereiro, a equipe conquistou a primeira vitória internacional de sua história. Com presença de Atis Monteiro entre os titulares escalados pelo técnico Armando Del Debbio, a Macaca aplicou 2 a 0 no Estudiantes de La Plata, da Argentina, que excursionava pelo Brasil. O duelo de caráter amistoso, disputado em Campinas, tinha como objetivo arrecadar fundos para a conclusão das obras do estádio Moisés Lucarelli.
Esse histórico confronto contra o Estudiantes foi apenas um dos quase 40 jogos que Atis disputou ao longo daquela temporada, com direito a dezenas de bolas na rede. Em meados de 1952, exatamente três meses após completar 20 anos, Atis Monteiro se tornou o primeiro jogador da Ponte Preta a marcar três gols em um mesmo clássico contra o rival Guarani.
Ao todo, Atis Monteiro disputou 59 partidas e marcou 25 gols com a camisa da Ponte Preta, entre 1950 e 1953, e depois em 1959, em passagem de despedida pelo clube.
O histórico “hat-trick” de Atis eternizou o Dérbi 73, disputado no dia 6 de julho de 1952. O duelo, que completou 70 anos no início deste mês, terminou com goleada da Macaca por 4 a 0 sobre o Bugre, no estádio Moisés Lucarelli.
Aquele foi apenas o sétimo dos 66 clássicos campineiros já realizados no Majestoso e representa até hoje a maior goleada da Ponte Preta em seu estádio sobre o Guarani. Valia a decisão de um torneio triangular amistoso que também contava com o Bangu, do Rio de Janeiro. A Ponte ficou com o título, graças à goleada aplicada sobre o maior rival.
“Atis Monteiro era um jogador extremamente irreverente e nunca teve um temperamento profissional, tanto que na véspera desse Dérbi, houve um baile de debutantes em Campinas e os diretores da Ponte Preta precisaram tirá-lo da festa às três horas da manhã de sábado para domingo. Atis deu risada, foi para a concentração e ainda marcou três gols no Guarani”, revela Zaiman de Brito Franco.
Na ocasião, Atis abriu o placar com apenas 30 segundos de partida, inflamando a torcida pontepretana nas arquibancadas do Majestoso. “Depois, houve um escanteio logo aos três minutos que eu dei uma cabeçada, a bola bateu na trave e voltou para o jogo. Nunca mais me esqueci disso”, relembra Atis. Sem o azar para atrapalhar, Atis voltou às redes no último lance do primeiro tempo e ainda anotou o terceiro gol aos nove da etapa final, desta vez em cabeceio certeiro.
Aos 23 minutos, bem na metade do segundo tempo, Sabará fechou a goleada aproveitando sobra de chute de Atis bloqueado pela marcação. “Só não fiz o quarto porque ele me tomou a bola. Eu já tinha me preparado para marcar”, relembra Atis, sobre o gol “roubado” pelo parceiro de ataque.
No dia seguinte à goleada por 4 a 0 no Dérbi, um surto de gripe acometeu a cidade de Campinas. Calma, não se assuste, eram apenas os torcedores pontepretanos zombando dos bugrinos, imitando o som de espirro: “Atis…chim, Atis… chim”. Imagine se fosse hoje em dia. Não faltariam memes para compartilhar nas redes sociais. Atis bombaria no “Whatis”, com o perdão do infame trocadilho.
Apesar da forte rivalidade entre os dois clubes do futebol campineiro, Atis Monteiro não guarda sentimento de aversão ao Guarani, pelo contrário. “Meu pai fala do Guarani com muito carinho e respeito, a gente até brinca que ele é bugrino”, goza Juliana Monteiro. “Eu gosto do Guarani, menos quando joga contra a Ponte”, defende-se Atis.
Após a acachapante goleada sobre o Guarani no Dérbi 73, em 1952, passaram-se pouco mais de 50 anos até algum jogador pontepretano enfim conseguir repetir a façanha de Atis Monteiro.
Depois de Atis, somente outros dois jogadores da Ponte Preta conseguiram marcar três gols em um mesmo Dérbi contra o Guarani, contando toda a história de 110 anos do clássico campineiro.
No dia 11 de outubro de 2003, o atacante argentino Darío Gigena brilhou e caiu nas graças da torcida pontepretana, ao balançar as redes em dose tripla no Dérbi 177, que terminou com vitória por 3 a 1 da Macaca sobre o Bugre, em pleno estádio Brinco de Ouro da Princesa, pelo Campeonato Brasileiro.
Apenas um ano depois, logo no Dérbi seguinte, o de número 178, disputado em 10 de julho de 2004, chegava a vez do atacante Weldon anotar três gols na vitória alvinegra por 3 a 1, no Majestoso, também pelo Brasileirão.
Excursões com a Portuguesa e alvo de desejo do técnico da Seleção
Em agosto de 1954, cerca de dois anos após “O Dérbi de Atis”, a Ponte Preta enfiou novamente 4 a 0 no Guarani, desta vez no Brinco de Ouro, onde o lendário jogador campineiro nunca chegou a atuar com a camisa da Macaca. O estádio bugrino foi inaugurado em 31 de maio de 1953, ou seja, pouco após a transferência de Atis Monteiro para a Portuguesa de Desportos.
“Compraram o meu passe e concordei em mudar para São Paulo porque ganharia mais, jogaria em um time de mais qualidade e teria mais exposição”, justifica Atis.
Na primeira metade da década de 50, a Lusa era uma potência, um dos times mais fortes do futebol brasileiro, tanto que levantou dois troféus do Torneio Rio-São Paulo, em 1952 e 1955, além de conquistar três vezes, em 1951, 1953 e 1954, o título de honra Fita Azul, concedido aos clubes que retornavam invictos ao Brasil após realizar excursões internacionais.
Durante o período de dois anos que defendeu a Portuguesa, Atis Monteiro participou das excursões pela América do Sul, em 1953, e pela Europa, em 1954, que renderam o título Tri-Fita Azul. Ele só não estava na excursão europeia de 1951, quando ainda jogava na Ponte Preta.
Atualmente, Atis Monteiro é o único jogador vivo daquele histórico esquadrão da Portuguesa dos anos 50. Em janeiro de 2017, ele e o ex-atacante Orestes Ferri, falecido em 2020, foram homenageados em um evento no Teatro Gamaro, no bairro da Mooca, em São Paulo, na sessão de lançamento do documentário “Rubro-Verde Espetacular”, desenvolvido pelo produtor multimídia Cristiano Fukuyama e pelo jornalista Luiz Nascimento, idealizadores do projeto Acervo da Bola, responsável pela preservação da memória do futebol brasileiro.
A chegada de Atis à Portuguesa, no primeiro semestre de 1953, aconteceu após a saída do atacante Pinga, maior artilheiro da história do clube, com 235 gols, que tinha acabado de se transferir para o Vasco da Gama, na maior transação da época no futebol brasileiro.
Em 1952, Pinga havia sido campeão pan-americano de futebol no Chile, primeiro título conquistado pela Seleção Brasileira no exterior, ao lado dos craques Djalma Santos, Brandãozinho e Julinho Botelho, seus companheiros de Portuguesa, além de Ipojucan, que chegaria à Lusa em 1954 e encerraria a carreira no estádio do Canindé, inaugurado em 1956.
Um dos jogadores convocados para a Copa do Mundo de 1954, Pinga morreu em Campinas, em 8 de maio de 1996. Seu filho, Ziza, atuou como ponta-esquerda do Guarani nos anos 70.
No dia 10 de janeiro de 1954, em um dos jogos mais especiais de sua carreira, Atis Monteiro marcou três gols na espetacular vitória da Portuguesa por 4 a 3 sobre o Corinthians, em pleno Pacaembu, sob olhares do então técnico da Seleção Brasileira, o carioca Zezé Moreira, que estava nas arquibancadas do estádio.
“Naquela época, ainda não havia transmissão de jogos pela televisão, então Zezé Moreira veio a São Paulo para ver de perto como estava Baltazar, centroavante do Corinthians. Terminado o jogo, ao ser questionado pelo repórter da antiga Rádio Panamericana [atual Jovem Pan], o treinador da Seleção respondeu que viu mesmo foi Atis, que tinha marcado três gols e acabado com o jogo”, relata o jornalista Zaiman de Brito Franco.
Logo após entrar no radar da Seleção Brasileira, graças à atuação de gala contra o Corinthians, Atis viajou à Europa para uma excursão de três meses com a Portuguesa. Entre fevereiro e maio de 1954, ele conheceu Inglaterra, Alemanha, França, Bélgica e Turquia. Ao todo, foram 19 jogos contra equipes desses cinco países, com 14 vitórias e cinco empates, sob o comando do técnico argentino Abel Picabéa.
“Ficamos 70 dias na Europa. Também íamos jogar na Rússia, mas tínhamos compromisso com o Campeonato Paulista, então não deu tempo de ficar mais tempo”, lamenta Atis.
Atis poderia ter retornado ao continente europeu em junho de 1954, desta vez com o uniforme amarelo da Seleção Brasileira, mas uma torção no joelho enterrou qualquer chance de ser convocado pelo técnico Zezé Moreira para a disputa da Copa do Mundo de 1954, na Suíça. “Quase fui para a Copa. Eu seria reserva, mas iria”, assegura Atis. Baltazar, por outro lado, foi chamado, assim como havia acontecido em 1950.
No Mundial de 54, o último antes da conquista do bicampeonato em 1958 e 1962, o Brasil acabou eliminado nas quartas de final, com derrota por 4 a 2 para a Hungria, que perdeu a final para a Alemanha, mas teve o melhor jogador daquela edição, o lendário Ferenc Puskás.
Quando retornou ao Fluminense, clube que treinava paralelamente ao trabalho à frente da Seleção Brasileira, o técnico Zezé Moreira pediu a contratação de Atis Monteiro, que passou a defender o Tricolor das Laranjeiras em 1955.
“Atis era o camisa 10 de um time fantástico do Fluminense, que tinha um ataque com Didi, um dos maiores jogadores de todos os tempos, que jogou até no Real Madrid, além de Waldo, que depois também atuou na Espanha, Escurinho e Telê Santana, que todo mundo conhece”, aponta Zaiman de Brito Franco.
“Eu tinha um tio, irmão da minha mãe, que era médico da Maternidade do Rio de Janeiro e morava no bairro Flamengo, quase à beira-mar, então quando me mudei, procurei morar ali perto, só que no bairro das Laranjeiras”, conta Atis Monteiro. Mas a saudade de Campinas sempre batia. “Certa vez, meu pai queria ser liberado para ir a um baile em Campinas com a minha mãe e pediu para o médico engessar a perna dele”, diverte-se o filho Guilherme Monteiro.
Nos tempos de Fluminense, a lembrança mais viva na memória do nonagenário é uma vitória por 2 a 1 sobre o Flamengo, tricampeão carioca entre 1953 e 1955, diante de mais de 70 mil pessoas no Maracanã. Templo sagrado do futebol, o estádio havia sido inaugurado cinco anos antes para sediar a Copa do Mundo de 1950, que terminou com a traumática derrota do Brasil por 2 a 1 para o Uruguai, no fatídico “Maracanaço”, o maior martírio do goleiro campineiro Barbosa. Mas o futebol brasileiro logo mostraria o seu valor e recuperaria a sua imagem, com uma inquestionável parcela de contribuição de Atis Monteiro.
CONFIRA O ESPECIAL COMPLETO NO LINK ABAIXO