Sérgio Eduardo Montes Castanho
Academia Campinense de Letras
Quem ler o título acima talvez se enfade e desabafe: outra vez? De fato, já se gastaram resmas e mais resmas
de papel e hectolitros de tinta para narrar os feitos do compositor operista campineiro Antônio Carlos Gomes,
no afamado teatro milanês Alla Scala. Mas sosseguem os afoitos. Não vou escrever uma palavra sequer sobre as
performances operísticas do Tonico de Campinas no palco do norte da Itália. Vou apenas descrever o que vi em visita recente (maio de 2019) a esse magnífico teatro e, especialmente, ao museu que ocupa áreas importantes da casa de espetáculos.
O saguão de entrada do Alla Scala é feericamente iluminado e lindo na sua decoração clássica. Por uma porta
à frente desse saguão entrei numa frisa e pude observar, por alguns momentos, todo o interior do teatro, o palco, o fosso da orquestra, os camarotes, as frisas, a galeria, a plateia – tudo me trazendo à memória o lindo Teatro Municipal de Campinas, tristemente demolido há mais de meio século. Muito parecidos! Aliás, os teatros em estilo clássico, os municipais de São Paulo e do Rio de Janeiro, por exemplo, são muito semelhantes ao Alla Scala.
Nessa observação tive a sorte de ver e ouvir um pouco de uma ópera de Mozart que estava sendo ensaiada. Maravilha! Saindo dali, dirigi-me ao museu, onde me esperavam intensas emoções, estéticas e de sentimento. Sobre uma mesa de honra pousavam os bustos em bronze de todos os principais operistas italianos, cujas obras foram levadas no Alla Scala: Verdi, Puccini, Rossini e muitos outros. Ali, nesse local de honra do Museu, apenas um estrangeiro. Quem? Wagner, o gênio alemão de Tristão e Isolda? Mozart, Beethoven, quem? Parece incrível, mas o único bronze de estrangeiro, ou seja, não italiano, sobre essa mesa era o do brasileiro Antônio Carlos Gomes, o nosso Tonico de Campinas.
Nas paredes, pendurados, havia quadros a óleo com retratos de outros compositores italianos e estrangeiros
insignes; sobre pedestais, bronzes de compositores e cantores líricos, como Caruso; um dos quadros era o da
soprano Tebaldi, que impressionava pela beleza da cantora, tão linda quão virtuose. Mas bronze de estrangeiro na mesa de honra só o de Carlos Gomes!
Também me chamou a atenção um quadro pendurado em uma das paredes do museu, retratando a fachada do Teatro Alla Scala por volta de sua inauguração. A tela era assinada por Angelo Inganni e tinha por título Facciata del Teatro Alla Scala. Data: 1852. Uma linda obra.
Depois dessa emocionante incursão, saí para o ar livre da fria Primavera do Norte italiano. A emoção da visita foi tão intensa quanto, dias mais tarde, a de percorrer o teatro grego de Siracusa, no Sul da Itália, na bela Sicília. A grande diferença é que este era de dois milênios antes e nele jamais se apresentou nenhum brasileiro, até porque Brasil não existia…
Sérgio Eduardo Montes Castanho é acadêmico. Ocupa a cadeira 32 da ACL