Eduardo e Mônica (Brasil, 2018, 1h54 min.) tem muitas credenciais: a música da Legião (do álbum “Dois”, 1986), René Sampaio, que criou intimidade cinematográfica com a banda desde “Faroeste Caboclo” (2013); atriz de primeira grandeza, Juliana Carneiro da Cunha; outra ótima atriz, Alice Braga, que saboreou sucessos em Hollywood; fotografia de Gustavo Hadba, o preparador de elenco Sérgio Penna e o roteirista Matheus Souza.
Elencar estes nomes espelhando as respectivas carreiras, por si só, implica em valorizar o todo. René amadureceu como diretor, há maior consistência naquilo que pretendeu com o filme, segurança nas escolhas e, com anuência da produção, certeiro na composição da equipe.
Matheus tem carreira de diretor e roteirista sempre afiado nos diálogos, no humor sutil e na linguagem apropriada de quem pretende falar com jovens. São sacadas ótimas, como quando Mônica (Alice Braga) cita a nouvelle vague para o pretendente a namorado, o adolescente Eduardo (Gabriel Leone, bem preparado e confortável no papel). Ou quando o garoto expõe opiniões e escorrega, caso da meditação e da passeata.
Depois de bater um pouco, sabiamente, o roteiro dá passe açucarado ao personagem e o coloca por cima. Em festa no qual está quase levando um pé, ele se socorre da grudenta “Total Eclipse of the Heart” (lançada em 1983 por Bonnie Tyler … turn around, every now and then…etc). A canção não faz parte do repertório da madura, engajada e intelectual Mônica e, na contradição, serve de âncora ao casal unido pelas diferenças.
O modo como o roteiro (escrito com Claudia Souto, Michele Frantz e Jéssica Candal) encaminha o desencontro na festa é manjado.
Comédias românticas usam o recurso de, em dado momento, fazer algo absurdo parecer normal. E funciona. Sempre. O espectador sente-se um tanto traído pela obviedade, mas acaba se entregando ao instante catártico que a cena provoca.
Juliana Carneiro da Cunha, Lara, mãe de Mônica, e Alice Braga são casos à parte. Juliana transforma em ouro tudo o que toca e o faz com seriedade e solenidade – como a mãe trágica de “Lavoura Arcaica” (Luiz Fernando Carvalho, 1999). Sutis gestos ou falas (como quando deseja Feliz Natal à filha) são suficientes para expressar emoções profundas – qualidade das grandes atrizes (atores).
A solar Alice traz luz própria à personagem. Tem beleza e coloca peso em cada diálogo ou expressão. Difícil demonstrar dor e chorar para a câmera sem ser banal. Com isso, alcança empatia do espectador – característica de intérpretes que dominam o ofício.
Filmes de gênero obedecem regras próprias e não exigem muitos neurônios para saber como a história se encaminha e qual será o desfecho. Neste caso, a tarefa ficou, ainda, mais fácil porque existe a música original que antecipa tudo.
Com objetivo de colorir o filme, ao diretor coube coordenar profissionais que oferecessem não apenas o melhor possível (exigência natural), mas acrescentassem ingredientes ousados ou criativos.
Daí o cuidado com a fotografia, com os detalhes da direção de arte de Tiago Marques, com a precisão da trilha de Lucas Marcier, Fabiano Krieger e Pedro Guedes, da escolha de Otávio Augusto como coadjuvante de luxo e das locações. E que alívio ver o avião chegar ao Rio e não sobrevoar o Cristo. Não porque o Cristo não seja belo e digno, mas porque seria aborrecido lugar-comum. Clichê do clichê.
E que prazeroso ver Brasília não através da comédia insidiosa encenada, incansavelmente, pelos políticos, mas por meio de um símbolo do poder, o Congresso Nacional, travestido de nave, onde sombras são sonhos em forma de desenho; um Parque de Cidade que surpreende pelo inusitado – metáfora da vida; e um prédio que parece objeto não identificado no chão da capital e oferecido como espaço lúdico para se escalar.
Eduardo e Mônica pode não ser um grande filme, mas é agradável de se ver e curtir.
Ele evoca a leveza de Marina Lima proclamando a chegada da alegria colorida do Verão, a expectativa da anunciação “tu vens” de Alceu Valença e a generosidade daquela canção do Roberto de que está guardando “o que há de bom” para entregar à amada quando ela chegar. Trazer anúncios de esperança nestes tristes trágicos tempos não é pouco. Pelo contrário. É bastante.
O filme estreia nesta quinta-feira (20) na rede Kinoplex do Shopping D. Pedro, Cinemark do Shopping Iguatemi, Cinépolis do Galleria Shopping e do Shopping Campinas, Moviecom do Unimart Shopping e Araújo Multiplex do Shopping Parque das Bandeiras, todos em Campinas
João Nunes é jornalista e crítico de cinema