Como um país como o Brasil pode implementar um modelo de desenvolvimento sustentável, que garanta o uso racional e adequado de seus recursos naturais, promova uma economia sólida e distributiva e valorize a justiça social, respeitando os direitos humanos fundamentais? As respostas podem variar muito, mas geralmente elas sinalizam a importância do uso de altas tecnologias, e portanto do desenvolvimento científico e tecnológico, além da necessária vontade política de governos, empresas e sociedade em geral para que as coisas aconteçam.
Todas essas receitas são válidas, mas a realidade mostra que são insuficientes se o Brasil não equacionar um de seus maiores dramas, a urgência de um sistema educacional democrático e de qualidade. Fomento à pesquisa e apoio às universidades, com certeza, mas sem a decisão civilizatória de colocar o ensino fundamental e médio no centro das prioridades nacionais, será impossível alcançar a efetiva sustentabilidade econômica, social e ambiental.
Outra reflexão necessária é quanto ao sentido da chamada educação para a sustentabilidade. Geralmente essa expressão implica em educação, preparação de crianças e adolescentes, para práticas sustentáveis na área ambiental, mas como já comentamos em artigo anterior a sustentabilidade é muito mais do que isso. Ela abrange todos os campos das atividades humanas. E nesse sentido mais uma vez a educação básica de qualidade se torna essencial.
Vários segmentos sociais, como o empresariado, há tempos já alertam para a necessidade de atenção de fato país para suas escolas do ensino fundamental e médio. Uma pesquisa promovida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), em função das eleições presidenciais de 2022, confirmou essa percepção.
Divulgada em setembro do ano passado, a pesquisa mostrou que para 34% dos entrevistados o maior investimento em educação deveria ser a prioridade do próximo governo federal. A melhoria da saúde pública apareceu em segundo lugar na pesquisa, com 26% das respostas. O estímulo ao crescimento econômico e a redução de impostos, demandas típicas das atividades dos empresários ouvidos, apareceram em terceiro e quarto lugares nas prioridades para o próximo governo, com 20% e 14% das respostas, respectivamente.
O estado geral da educação básica no Brasil justifica a inquietação dos empresários e de muitos outros agentes sociais. São vários os indicadores de avaliação, como o tradicional PISA (sigla em inglês para Programa Internacional de Avaliação de Alunos), promovido pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), que há anos apontam para a gravidade das lacunas no ensino e aprendizado no país, em disciplinas básicas como português, matemática e ciências.
Uma contundente advertência sobre o panorama educacional foi igualmente feita em 2022 pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, em seu oitavo balanço anual do Plano Nacional de Educação (PNE).
Reconhecida organização da sociedade civil em sua área, a Campanha advertiu que dos 38 dispositivos utilizados para avaliar o andamento das 20 metas do PNE, somente cinco estão avançando em ritmo suficiente para que sejam de fato cumpridos até o final da vigência do Plano, em 2024.
O Plano Nacional de Educação foi aprovado pela Lei 13.005, de 2014, e contempla 20 grandes metas para serem atingidas até 2024. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação alerta em seu documento que, pelas atitudes dos dois últimos governos federais, como a aplicação da Emenda Constitucional 95, de 2016, conhecida como a do Teto de Gastos, e também como reflexo da pandemia, houve claros retrocessos no cumprimento de 5 das 20 metas do PNE. Caso do expressivo aumento de crianças de 6 a 14 anos fora da escola, de 540 mil em 2020 para 1,072 milhão em 2021, na contramão do que prevê a Meta 2 do PNE.
Outro retrocesso gravíssimo refere-se ao percentual de matriculados em Educação de Jovens e Adultos (EJA) vinculados à educação profissional. A Meta 10 estipula que até 2024 deveriam estar matriculados nessa condição 25% dos frequentadores da EJA. Em 2021, porém, somente 2,2% das matrículas em EJA eram associadas a ensino profissional.
Estes números se referem ao acesso à escola. Quando se trata da qualidade da educação oferecida, a situação é igualmente dramática, mesmo em uma cidade como Campinas, reconhecido polo científico e tecnológico. Em termos da educação básica, contudo, a cidade ainda tem muito a avançar.
É o que mostra por exemplo a série histórica do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) do município. Entre 2007 e 2013, o Ideb da rede pública de ensino de Campinas, considerando as redes municipal e estadual, sempre esteve abaixo das metas para o município. Em 2015 pela primeira e única vez o município, com Ideb 6,3, superou a meta estabelecida para os primeiros anos do ensino fundamental, que era de 6,2. Em 2017, o Ideb de 6,4 igualou a meta estabelecida para o município. Em 2019, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), do Ministério da Educação, o Ideb da rede pública nos primeiros anos do ensino fundamental foi de 6,5, de novo abaixo da meta do município, de 6,7. Nos anos iniciais, o Ideb de Campinas em 2021 foi de 6, abaixo da meta para o ano de 6,9. Nos anos finais a performance das escolas públicas tem sido igualmente sempre abaixo das metas estabelecidas. Em 2021 a nota foi 5,3, em relação à meta de 6.
Outros dados do INEP de 2021 referentes a Campinas são igualmente inquietantes.
Somente 44% das escolas públicas contavam com recursos adequados em acessibilidade, 20% tinham bibliotecas, 13% contavam com laboratório de ciências e 51% com laboratório de informática, 54% tinham quadra de esportes e 45%, salas de leitura. Em média os números não foram muito diferentes no caso das escolas privadas.
É preciso considerar, claro, o impacto da pandemia no sistema escolar de desde 2020, mas todos estudos, pesquisas e indicadores são unânimes em ratificar o quadro dramático do ensino básico no Brasil, inclusive em cidades ricas e avançadas em vários segmentos como Campinas. Sem um olhar muito mais atento da sociedade em geral e dos governos em especial para esse cenário, o país continuará muito distante do ideal em sustentabilidade econômica, social e ambiental.
José Pedro Martins é jornalista, escritor e consultor de comunicação. Com premiações nacionais e internacionais, é um dos profissionais especializados em meio ambiente mais prestigiados do País. E-mail: [email protected]