Neste artigo, vou sair um pouco do tema de saúde e de medicina para fazer uma análise sobre nossa produção científica e fazer um tributo a nossos pesquisadores e universidades. Não me lembro em tempos recentes de ter observado tanto interesse pela ciência e pelo trabalho realizado pelos cientistas. Nos últimos dois anos a luta por vacinas, insumos, novos fármacos, imuno biológicos etc. para enfrentamento da pandemia de Covid-19 trouxe à luz o trabalho incessante dos pesquisadores de todo o mundo.
Certamente, o Brasil foi um importante protagonista neste período singular da história.
Além disto, notícias infelizmente desanimadoras mostram que o Brasil, principalmente através do governo federal, vem reduzindo progressivamente os recursos para ciência, tecnologia e inovação bem como na formação de pesquisadores, principalmente através da redução do número e congelamento do valor das bolsas da Capes e do CNPq e em programas de apoio a projetos de pesquisas e desenvolvimento.
Entidades como a Fapesp e suas coirmãs de outros estados lutam para manter e incrementar este apoio qualificando e diversificando o aporte de recursos, principalmente em seus estados. Sabemos que um país sem pesquisa está fadado a um futuro incerto e com crescente dependência de outros países e mercados. Temos uma importante exceção no Brasil e que precisa ser reconhecido que é o trabalho realizado pela Embrapa junto à agricultura, tornando-a altamente competitiva em nível mundial.
Em relação à análise de produção científica, é importante deixar claro que não há métrica perfeita para fazer esta análise e muitos poderão achar que minha referência para escrever este artigo possa não ser a melhor. Sem problemas, talvez tenham razão, mas o importante é falarmos da ciência e dos cientistas.
Importante ainda é deixar registrado onde estamos inseridos neste cenário seleto da ciência e tecnologia, particularmente em nossa região do mundo.
Em 2021, a “AD Scientific Index – Version 1” em estudo coordenado pelos professores Murat Alper e Cihan Döğer, publicou uma análise sobre os 10 mil cientistas tops da América Latina*. Este estudo trouxe dados sobre as universidades, pesquisadores, países e regiões do mundo. O estudo usou dados obtidos a partir do “Google Scholar” dos últimos cinco anos com dados do i10 index (trabalhos científicos dos autores citados pelo menos dez vezes na literatura), h-index (trabalhos científicos dos autores citados pelo menos na média das suas próprias citações) e os escores de citação (número de citações) no Google Scholar.
As áreas do conhecimento analisados foram: agricultura e silvicultura, artes, design e arquitetura, negócios e gerenciamento, economia e econométrica, engenharia e tecnologia, história, filosofia, teologia, direito, ciências médicas e da saúde, ciências da natureza, ciências sociais e outras; 256 ramos de 11.940 instituições de 195 países de 11 regiões (África, Ásia, América do Norte, América Latina, Oceania, Liga Árabe, EECA (Regional Civil Society & Community Platform – Global Funds), BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China and South Africa organization), USAN (United States Adopted Names) e COMESA (Common Market for Eastern and Southern Africa) do mundo.
Vamos aqui, nos limitar à América Latina (AL) onde estamos inseridos. Dos países, os cinco melhores ranqueados são: Brasil com 7.656 cientistas (76%), seguido da Argentina com 838, Chile com 635, Colômbia com 551 e Equador com 91 pesquisadores.
Das 10 Universidades da AL com maior número de cientistas ranqueados, oito são brasileiras. A USP é a universidade melhor ranqueada com 2.134 pesquisadores, seguida da Unesp com 572, Unicamp com 556, UFMG com 345, UFRJ com 323, UFRGS com 304, Unifesp com 200 e a UFSC com 165.
As duas não brasileiras entre as 10 primeiras em números de pesquisadores incluídos são a Universidad Nacional de La Plata da Argentina (4ª no ranking) com 399 pesquisadores e a Universidad de Chile (8ª no ranking) com 207 pesquisadores.
Este estudo apresentou nominalmente cada pesquisador e como cada um estava inserido na sua universidade, no seu país, na sua região e no mundo. Foi muito prazeroso ter reconhecido muitos colegas, principalmente de nosso Departamento, Faculdade e Universidade neste estudo. Vimos como tem sido importante o trabalho de cada um deles para colocar o seu trabalho e, naturalmente, a sua Universidade e país neste seleto e competitivo cenário.
Até onde eu saiba, o “AD Scientific Index” é o primeiro e único estudo que mostra o total e o coeficiente de produtividade dos cientistas baseado em indicadores de produção e citação através do Google Scholar. Sabemos que existem “prós e contras” dos sistemas de ranking incluindo os mais conhecidos como o “Web of Science”, “Scopus”, “Google Scholar”, etc.
Portanto, devemos aqui interpretar estes dados dentro dos limites do método e não avançar a interpretação sob pena de erros importantes. Mas, o que gostaria de mostrar a nosso leitor e a nossa sociedade, é o valor de nossa ciência e de nossos cientistas e como estamos inseridos na AL e no mundo, mesmo nestes tempos altamente difíceis que estamos vivendo.
O Brasil, através de seus pesquisadores e entidades de pesquisas, é um importante protagonista deste mundo maravilhoso da ciência e precisa colocar esta atividade como prioridade máxima no futuro.
Precisamos trabalhar para reduzirmos as evasões de talentos. A sociedade brasileira investe na formação acadêmica de seus jovens para vê-los indo embora por falta de oportunidades. Isto é muito triste e mortal ao futuro do País. Se com todas as dificuldades que todos conhecem temos este honroso desempenho, vocês podem imaginar como seríamos se fôssemos fortemente apoiados e gerássemos vagas e oportunidades neste “mercado” acadêmico e de investigação. Vamos continuar lutando e trabalhando pela ciência, fonte de conhecimento e soberania.
* Latin America Top 10.000 Scientists. “AD Scientific Index 2021 Version 1” available at www.adscientificindex.com.
Carmino Antonio de Souza é professor titular da Unicamp. Foi secretário de saúde do estado de São Paulo na década de 1990 (1993-1994) e da cidade de Campinas entre 2013 e 2020